Por Jenilson Rodrigues

A incômoda cena inicial, com uma imagem embaçada de uma cegonheira chegando ao pátio de uma montadora de veículos, já diz muito sobre o clima em praticamente todo o curta Em Trânsito. Acompanhamos uma história simples e ao mesmo tempo repleta de significados, transcorrendo de forma tensa, porém muito harmoniosa.

Não somos apresentados formalmente ao nosso protagonista, mas descobrimos se tratar de um sujeito pobre, sofrido, que habita um pequeno barraco de uma favela nos arredores de um grande centro urbano de Pernambuco. Sua rotina em certo momento é invadida pela campanha política de um candidato a prefeito e a partir daí ele passa a se interessar pela possibilidade de transformação que o político pode trazer para a sua cidade, mas principalmente para sua vida.

Percebemos desde o princípio de Em Trânsito um trabalho especial com o esquema de cores inteligentemente usado para trazer sentido às cenas, mesmo àquelas que não aparentam ser tão relevantes dentro da trama. O personagem principal que permanece a maior parte do curta envolto em cores escuras, em determinado momento é contagiado por outros tons mais quentes que denotam sempre o progresso e a mudança na vida das pessoas daquela cidade e no cenário urbano. No plano geral feito do pátio da montadora já percebemos a predominância de cores básicas, mas com o vermelho começando a ganhar espaço entre elas. As obras que modificam aquela paisagem cinza e carregada da cidade sempre são realizadas por máquinas amarelas e funcionários trajando também tons mais vivos como o laranja, o vermelho e o amarelo, contrastando com o aspecto cinzento e sem expressão daquela região.

O som envolve em todos os momentos. Em cenas silenciosas, por exemplo, os efeitos advindos de ações – como os passos do protagonista no piso da concessionária ou o ar condicionado do veículo – aproximam o espectador do ambiente à medida que conseguem causar a sensação de estar na pele do personagem. Quando máquinas irrompem o silêncio e entram em cena de sobressalto, o impacto dá ritmo à sequência ligando de forma ágil os momentos de maior calmaria com os acontecimentos que estão por vir. As gravações de discursos políticos, como o do recém-falecido candidato a Presidência da República Eduardo Campos e o da atual Presidente Dilma Rousseff, reforçam o clima tenso que acompanham as cenas em que essas falas aparecem. Eduardo Campos apoia o candidato a prefeito que, mesmo sem aparecer em carne e osso no curta, tem um papel fundamental na trajetória do protagonista. As poucas músicas presentes no curta surgem nos momentos certos, mais para informar do que para iludir, sem destoar de todo o restante da história desta bela e premiada produção do diretor Marcelo Pedroso.

Confira o teaser: