A tarefa de retratar a identidade de um povo é sempre desafiadora. Como mostrar as nuances que formam as conexões daquele grupo? Como deixar claro os gestos culturais que unem as pessoas? O diretor Xiaoshuai Wang encontra as próprias respostas para essas perguntas e as apresenta em tela no documentário Retrato Chinês.

No filme, acompanhamos momentos efêmeros da vida dos chineses. Os extratos têm de 2 a 3 minutos de duração e consistem em pessoas paradas, olhando para a câmera, nos mais diversos ambientes. Não existem falas nem legendas, mas sim uma predominância da imagem. Em uma completa consonância com o título, o longa é uma junção de retratos em movimento que, juntos, formam o mosaico que é a sociedade chinesa atual.

O título nos apresenta os contrastes do país e, ao longo de seus 79 minutos, acompanhamos trabalhadores em ação, rituais familiares, cerimônias religiosas e gestos culturais. A China industrial se opõe à China agrícola, assim como grandes cidades espelham pequenos vilarejos. O homem é colocado em perspectiva com a imensidão da natureza para, em seguida, ser exaltado por grandes paisagens construídas por ele.

A câmera, estática e distante, capta todos esses momentos sem nunca interferir na vida daquelas pessoas. Assim como ela, o público assume o papel de observador e se detém nos detalhes que formam tantos universos particulares. Os extratos, em sua maioria sem diálogos, são presididos por sons ambiente que, amplificados ou atenuados, dão o tom de cada realidade.

Em retrospecto, a sensação é a de estarmos vendo as gravações em seu estado bruto, com pouca ou nenhuma edição. A ausência de texto falado eleva o sentido da visão, que passa a ser atraído por cada pequeno movimento ou encara o desconcertante olhar dos personagens. Ao encarar diretamente a câmera, gesto tão normal na fotografia, eles quebram a quarta parede do cinema e, mesmo em silêncio, atestam “Estou aqui. Essa é a minha vida.”.

Tal estrutura disruptiva dá ao filme um ritmo cansativo e afasta alguns indivíduos (na sala em que eu estava, várias pessoas foram embora durante a sessão). Contudo, a experiência é válida. De maneira pretenciosa, Xiaoshuai nos apresentou uma visão oriental de mundo e soube criar seu próprio retrato de uma China moderna, em transformação e essencialmente humana.

 

*Essa crítica faz parte da cobertura do 24o­ Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade.

Retrato Chinês

 

Ano: 2018
Direção: Xiaoshuai Wang
Gênero: ​Documentário
Nacionalidade: China

Avaliação Geral: 3