Por Luciana Ramos

Nova York é uma das locações favoritas das produções hollywoodianas. Talvez por sua efervescência cultural, ou por ser conhecida como a cidade das oportunidades, como já cantava Frank Sinatra. Diferentemente de outras grandes metrópoles, ela é tão caótica e interessante que muitas vezes adquire vida própria na tela, tornando-se mais um personagem. É impossível fazer uma lista, por mais extensa que seja, sem deixar de lado algum filme nova-iorquino importante. Por isso, optei pelos mais notórios e os que ofereceram diferentes abordagens da cidade.

King Kong (1933)

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Uma equipe de cinema viaja para a Ilha da Caveira por influência do ambicioso diretor Carl Denham (Robert Armstrong) e depara-se com uma civilização primitiva que oferece mulheres ao Deus-gorila, Kong. Após Ann Darrow (Fay Wray), a estrela, ser sequestrada como tributo, uma equipe de marinheiros vai a seu resgate enquanto Carl consegue raptar o gorila para exibi-lo em Nova York no espetáculo “Kong, a oitava maravilha do mundo”. Quando o animal foge, os cidadãos ficam em pânico com o monstro, que vai a procura da sua amada Ann e a leva ao topo do Empire State Building, onde é bombardeado por aviões até a morte. O filme, apesar de não ser totalmente ambientado em Nova York, tem uma das mais célebres cenas do cinema realizadas lá.

O grande feito deste filme é o uso avançado para a época de efeitos especiais, já que até então este recurso nunca tinha sido empregado para o desenvolvimento de um protagonista. Na verdade, o gigante King Kong não passava de uma marionete de 45 cm de altura, fato que foi mantido em segredo do público da época.

Hoje, tais recursos estão tão ultrapassados que é difícil temer o gorila. No entanto, o filme ainda guarda o encanto que só os clássicos possuem e é impossível não simpatizar com o gorila apaixonado.

O pecado mora ao lado (1955)

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Billy Wilder era um mestre em fazer filmes que tratavam de assuntos polêmicos, como alcoolismo, traição e assassinato, terem aprovação do Código de Censura da época para serem rodados. Muito do trunfo dos seus filmes, como é o caso de O Pecado Mora ao lado, está no uso de diálogos sutis e espirituosos que apenas sugerem os temas, nunca os revela abertamente.

O editor de meia-idade Richard Sherman (Tom Ewell), após mandar a família para férias de verão, desespera-se ao ter sua fidelidade posta à prova pela simples presença de sua nova vizinha, ninguém menos que Marilyn Monroe. Outros estranhos fenômenos como o calor insuportável de Manhattan no mês de julho e a coceira da infidelidade conjugal dos setes anos de casamento ajudam a levá-lo a loucura nesta hilária e quase inocente comédia. Na sua melhor cena, a bombshell Marilyn tem sua saia levantada pelo duto de ar do metro, que ajudou a eternizá-la como símbolo sexual.

Nova York, Eu Te Amo (2009)

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Adotando o estilo já consagrado de Paris, Eu Te Amo, O filme faz parte de um projeto de enaltecimento de algumas das mais importantes e conhecidas cidades do mundo. São 11 curtas-metragens, com duração media de 10 minutos, sobre os mais variados habitantes de Nova York, suas histórias e dramas cotidianos. Como esperado diante da diversidade de diretores e histórias, o filme é bem irregular, com alguns segmentos muito bem realizados e outros que carecem de refinamento narrativo e estético. Ainda assim, vale a pena assistir para apreciar a diversidade arquitetônica e cultural da cidade.

Faça a coisa certa (1989)

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Filme de crítica social escrito, dirigido e atuado por Spike Lee. Em um bairro do Brooklyn cuja predominância é afro-americana, o dono do restaurante italiano da região é acusado de racismo por só ter fotos de ítalos-americanos nas suas paredes. O que começa com insultos verbais parte para agressão física que termina no incêndio do local e no assassinato de uma pessoa.

A grande sacada do filme é abordar o racismo de maneira gradual, mostrando como algo pequeno, como uma foto na parede, pode ser a representação velada do preconceito e como a intolerância e a inabilidade em lidar com as diferenças podem resultar em repercussões catastróficas.

Manhattan (1979)

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Há quem fale que a verdadeira paixão de Woody Allen é a cidade de Nova York. Certamente, sua filmografia depõe a seu favor. Ninguém enalteceu tantos as ruas, praças e lanchonetes da cidade quanto ele e isso nunca foi tão forte quanto em Manhattan. Rodado em preto e branco, o filme é uma ode à cidade, numa sucessão de planos panorâmicos acompanhados pelo romantismo de “Rapsódia em Azul”, de George Gershwin. Ironicamente, ao contrário da crítica e do público, que amaram o filme, Woody Allen ficou tão insatisfeito que propôs ao estúdio rodar outro projeto de graça caso eles desistissem de lançá-lo.

Issac Davis é mais um dos neuróticos personagens do diretor, interpretado pelo mesmo. Infeliz com o rumo da sua vida, em especial com o seu emprego e sua ex-mulher (Meryl Streep), que o deixou por outra mulher e lança um livro contando detalhes da vida marital dos dois, ele se contenta com uma namorada doce e influenciável de 17 anos. Isso até conhecer a namorada do seu amigo (Diane Keaton), por quem se apaixona. Comovente e engraçado em retratar a complexidade dos relacionamentos, além de visualmente arrebatador.

Filme além dos clichês…

Taxi Driver (1976)

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Taxi Driver é ambientado em Manhattan tal como o filme homônimo descrito acima, mas podemos afirmar que ambos não falam sobre a mesma cidade. Esqueça o romantismo visual de Woody Allen; ele e Martin Scorsese podem ter andado nos mesmos espaços, mas certamente não viveram na mesma cidade.

Robert de Niro é um veterano do Vietnã que trabalha como taxista. Ele sofre um processo de deterioração mental causado pelo trauma da guerra junto à marginalização social. Este é acelerado pela miséria, sujeira e violência que o cerca. Sua atenção divide-se entre uma ativista política, Betsy (Cybill Shepperd) e uma prostituta adolescente, Iris (Jodie Foster), a quem acredita ser sua função proteger. São tentativas desajeitadas da criação de laços afetivos, que nunca dão certo. No final, após realizar uma matança em um hotel, onde mata o cafetão de Iris, é enaltecido como herói pela mesma sociedade que antes o rejeitou.

Além do forte conteúdo de crítica social, Taxi driver é também um esmero visual. Trata-se de um filme obscuro, áspero, realista no seu tratamento com a imagem. O diretor, através do uso de slow motion em planos subjetivos, ajuda-nos a entrar na mente de Travis e entender a sua agonia. Em outros momentos, como na cena de abertura, a câmera desprende-se do personagem e parece adquirir vida própria para enfatizar a decadência social do ambiente do protagonista, tornando a cidade um elemento essencial da narrativa. Além disso, Robert de Niro é um show à parte.

Foi um dos marcos da Nova Hollywood, movimento cinematográfico do cinema norte-americano. Na época, Scorsese rejeitou os moldes de produção dos estúdios para adotar novas abordagens cinematográficas influenciadas pelo novo cinema europeu e assim criou um dos melhores filmes modernos.