Por Magno Martins
É provável que muitos acreditem ainda que viver de arte seja algo impossível, já que existe certo paradigma de que não há para todos um lugar ao sol no mundo dos famosos, celebridades, artistas, seja lá qual for a definição coerente que se possa rotular o mundo que reconhece “talentos”.
Não é segredo para ninguém que muitos artistas sofrem e muito para consolidar suas carreiras, passando por altos e baixos, mesmo antes do reconhecimento da mídia e das pessoas sobre os seus trabalhos. A marginalização da arte como profissão é algo que acompanha o dia a dia de muitos que lutam para viverem não só apenas de sonhos, mas de seus dons. Quem ainda não se deparou com alguém perguntando ou até mesmo afirmando “Ele(a) mexe com Teatro?”, “Ele(a) mexe com arte.”, diversos outros “argumentos” que colocam a profissão da arte como algo secundário, remetendo a ideia de que é impossível sobreviver na sociedade como profissional da arte.
Ao produzir o filme Riscado, o diretor Gustavo Pizzi conseguiu perfeitamente aliar ficção a realidade, contando a história de Bianca (Karine Teles), que luta diariamente para viver de seu dom: atuar. Durante o seu dia a dia, Bianca busca sobreviver de seu trabalho, atuando em um coletivo de teatro que participa e complementando o seu orçamento por meio de trabalhos paralelos: animando festas de aniversários e empresariais, entregando panfletos de festas, intervenções artísticas em comércios, entre outras, se transformando em diversos personagens ícones do cinema como Marilyn Monroe e Bettie Page.
Com uma simpatia sem fim (até mesmo com pessoas que duvidam de sua arte ou em momentos difíceis de sua vida), Bianca cria uma atmosfera agradável com as pessoas que trabalham ao seu redor, sendo perceptível no decorrer do longa-metragem. Mesmo trabalhando em uma peça que ressaltou o seu talento no mundo da dramaturgia, a grande oportunidade de sua vida veio com o convite de um cineasta francês para interpretar uma personagem em um filme, que seria baseado em alguns fatos de sua vida e um tributo à Carmen Miranda. Com esta proposta, as perspectivas e prioridades da atriz mudam, uma vez que era aquele momento que ela tanto esperava em sua vida e finalmente viveria este grande sonho: de ser, finalmente, reconhecida por seu talento.
O drama, que tem caráter documental também, foi construído com uma estética bastante autoral. Ângulos e perspectivas diferentes mostram outras facetas que o cinema tradicional não tem como premissa em suas produções. Fato percebido nos takes da personagem principal que grava diversos vídeos do seu contidiano, sejam eles em seus trabalhos, ensaios, passeios, rotinas, pensamentos, tudo elaborado com filtros e iluminações que remetam seus sentimentos. Com isto, o espectador consegue imergir ainda mais no mundo da personagem e perceber intimamente os percalços passados por ela. Além disso, a narrativa do longa é preenchida com alguns monólogos soltos na trama e, mesmo calcado no drama, existem algumas referências leves de humor.
Riscado é um ótimo filme para quem realmente gosta de entender como funcionam as engrenagens dos bastidores do mundo da dramaturgia e é até uma grande referência para se entender melhor os paradigmas, os processos e as peculiaridades do universo artístico como um todo. É um filme criativo, reflexivo e, acima de tudo, uma história comovente.
Confira o trailer: