Por Juliana Mangorra
“A vida miserável é melhor que, creia, uma existência protegida por uma sociedade organizada com tudo previsto, tudo perfeito.”
O trecho retirado de uma das falas do filme reflete sobre uma suposta “vida perfeita”, ambicionada por muitos. Com seu título irônico, A Doce Vida (La Dolce Vita) retrata histórias amargas, como a do protagonista que busca um novo sentido para sua existência. O diretor Federico Fellini faz uma crítica à sociedade romana da época, regida pelo consumo e pela idolatria de celebridades.
Apesar de ter sido exibido em 1960, o clássico tem um tema atual, que aborda a espetacularização midiática das notícias. Numa das cenas, duas crianças fingem ver a Virgem Maria, enquanto uma rede de TV manipula uma multidão e transforma o lugar num set de gravação.
O jornalista Marcello Rubini (Marcello Mastroianni) escreve para um tablóide sensacionalista, mas deseja publicar um livro e virar um escritor sério. Embora passe a maior parte do tempo em festas com diversas pessoas, ele é solitário e não tem vínculos afetivos. Com Maddalena (Anouk Aimée), ele tem um caso sem nenhum tipo de compromisso. Já com sua namorada Emma (Yvonne Furneaux) há uma ligação de dependência. Os dois só vivem brigando, mas não conseguem se separar. E isso não se resume aos relacionamentos amorosos.
Quando leva seu pai (Annibale Ninchi) a uma boate, Marcello fala para seu colega Signore Paparazzo (Walter Santesso) que quase não o via quando era pequeno e por isso não o conhece direito. Foi graças a esse personagem que o termo se popularizou mundialmente. O trabalho de Paparazzo era perseguir pessoas famosas na tentativa de fotografá-las. Como na chegada do avião, trazendo a atriz Sylvia Rank (Anita Ekberg) para Roma. Ele e vários fotógrafos aparecem na pista de decolagem com as câmeras a sua espera.
Marcello fica responsável pela cobertura da visita da estrela hollywoodiana, que decide fazer um passeio pela cidade à noite. Ao encontrar a Fontana di Trevi, Sylvia resolve se banhar e convida o repórter para vir junto. Ele fica fascinado com sua beleza e tenta beijá-la, mas é interrompido. A sequência se tornou o ápice da produção e uma das mais prestigiadas do cinema.
Um dos tópicos que se repete ao longo de A Doce Vida é a falta de comunicação, tanto das pessoas quanto dos acontecimentos. Logo no início, dois helicópteros sobrevoam a cidade de Roma. O primeiro carrega uma estátua de Jesus pendurada para leva-la até o Vaticano e no outro está Marcello. Ao passar por cima de um prédio, ele conversa com um grupo de mulheres de biquíni, mas elas não compreendem por causa do ruído do motor. Já no final icônico, Paola (Valeria Ciangottini) passa uma mensagem, mas o barulho das ondas impede que ele (e o espectador também) entenda o que a menina diz.
Outro exemplo é a morte de Steiner (Alain Cuny). Numa reunião em sua casa, ele incentiva Marcello a acreditar na seu sonho. Quando lhe contam sobre o seu suicídio, não entende o motivo e vê que também não sabia nada sobre seu amigo. Ao descobrir que a “doce vida” do intelectual não passava de aparência, perde de vez suas esperanças e entrega-se ao mundo frívolo do qual tanto queria fugir.
Você não sabia que…
– Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 1960, e do Oscar de Melhor Figurino em Preto e Branco, em 1962, A Doce Vida é considerada uma das melhores produções do século XX e está na lista dos 1000 melhores filmes de todos os tempos do The New York Times, realizada em 2004.
– O nome Paparazzo teve origem na palavra paparaceo, que denomina um mosquito em um dos dialetos italianos.
– O produtor Dino De Laurentis abandonou o projeto porque Fellini se recusou a colocar o ator Paul Newman no papel principal.
– Em A Doce Vida foi a primeira que Federico Fellini trabalhou com Marcello Mastroianni, seu alter ego cinematográfico.
– Em 2015 foi divulgado que haverá um remake de A Doce Vida e será conduzido pelo grupo AMBI. O longa-metragem ainda não tem diretor nem elenco definido.
Veja o trailer: