Por Luciana Ramos
O filme causou muito burburinho antes de ser lançado por trazer Woody Allen em um papel que há muito tempo não desempenhava: o de ator. Desafio maior para o também ator, escritor e diretor John Turturro foi ultrapassar todas as expectativas geradas por conta dessa aparição. A solução foi diferenciar-se com um enredo simples e cômico sobre um homem comum e o amigo que decide transformá-lo em gigolô.
Logo após o fechamento da sua livraria, Murray (Woody Allen) vai a uma consulta a dermatologista, que confessa estar louca para fazer um ménage a trois com a amiga e um gigolô desconhecido (porque este tipo de conversa é muito comum em consultas médicas). Ele indica o amigo Fioravante (John Turturro), que na verdade é um jardineiro. Este, por sua vez, recusa de início mas decide dar uma guinada na sua vida pacata e assumir a nova profissão. A partir daí, passa a se dividir entre a Dr. Parker (Sharon Stone), sua amiga Selima (Sofia Vergara) e a viúva judia Avigal (Vanessa Paradis).
Fora a estúpida premissa da conversa inicial da Dr. Parker com o paciente Murray, a trama enfrenta outro problema de credibilidade: a falta de carisma do protagonista e autor John Turturro. Embora a ideia de que somente homem comum e sem afetações possa encantar verdadeiramente as mulheres seja muito boa, a trama não emplaca em grande parte pela atuação insossa do diretor, que não afirma a sua presença e é facilmente ofuscado em cena pelos seus coadjuvantes, em especial Allen.
O roteiro tampouco ajuda. O enredo desenvolve-se sem maiores emoções, especialmente porque torna-se muito fragmentado: há cenas esparsas do relacionamento de Fioravante com a Dr. Parker, com Selima, com Avigal, desta com Dovi (Liev Schreiber), seu vizinho que patrulha o bairro e tem uma queda por ela, de Murray com a família. Com isso, nenhuma destas subtramas recebe atenção suficiente. Ademais, as resoluções ao final são apressadas e sem sentido, só servindo para aumentar a frustração do espectador, que fica à deriva acompanhando o que lhe é mostrado, sem ser conquistado.
O diretor conta com atores consagrados para oferecerem boas interpretações: Sharon Stone relembra os seus tempos de sex symbol em um papel mais suave, Sofia Vergara parece interpretar a si mesma mais uma vez como a latina sensual e Liev Schreiber é convincente como o obcecado Dovi. Um dos destaques, porém, fica por conta da atriz e cantora francesa Vanessa Paradis (mais conhecida por ser ex-mulher de Johnny Deep), que imprime vulnerabilidade e gentileza a sua Avigal e nos faz torcer por ela.
Porém, como já era esperado, o grande trunfo do longa é a atuação de Woody Allen, que deixou de lado a neurose para aparecer em uma versão mais descontraída e, digamos, mercenária. Os melhores diálogos são dele, que funciona perfeitamente como alívio cômico. Porém, tal escolha trouxe consequências não muito favoráveis ao diretor.
Ver Allen em sua habitual Nova York, contando anedotas sobre a vida com um jazz melódico ao fundo lembra muito dos seus próprios filmes, dos personagens neuróticos e confusos que discorrem sobre relacionamentos modernos e problemas existenciais. A sua presença em cena, somado a uma construção visual parecida torna inevitável uma comparação entre as obras, e é nesse ponto que Amante a Domicílio cai em desgosto, por ser infinitamente inferior. Pior, faz o espectador sentir falta de “um toque de Allen”. Há alguns momentos divertidos e tocantes, mas nada é substancial o bastante para fazer esse sentimento desaparecer.
Existe, no entanto, um diferencial positivo no trabalho de Turturro: a diversidade social e cultural que aborda. No seu filme, todos tem vez e se dão bem. As características da cultura judaica são bem delineadas (embora, às vezes, um pouco caricatas), assim como as diferenças de comportamentos entre Fioravante, da classe média, e as suas clientes ricas. O diretor também acertou no tom das cenas de sexo, sem aproveitar do tema para cair no apelativo. São utilizados planos mais fechados e iluminação mais escura para tais momentos.
Da mesma forma que em trabalhos anteriores, como o musical Romances e Cigarros, Turturro tinha uma boa história e excelentes atores nas mãos mas não conseguiu transformar os seus recursos em um bom filme. Amante a Domicílio tem alguns momentos engraçados mas estes são suplantados pela maneira rasa que o tema é abordado. Para os fãs de Woody Allen, vale a pena ir ao cinema só para vê-lo como o engraçado e esperto Murray. Fora isso, faltam-me motivos para recomendar o longa.
Amantes a domicílio (Fading Gigolo)
Ano: 2014
Diretor: John Turturro
Roteiro: John Turturro
Elenco Principal: John Turturro, Woody Allen, Sharon Stone, Sofia Vergara, Vanessa Paradis, Liev Schreiber
Gênero: comédia
Nacionalidade: EUA
Confira o trailer:
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