Por Diêgo Araújo
Como já proferia o grande mestre Oscar Wilde, “a vida imita a arte”, mas a própria arte também imita a vida. Em um momento histórico do cinema nacional, onde existe uma tendência cada vez mais crescente de expor e denunciar problemas de ordem social, política e econômica, Casa Grande, de Fellipe Barbosa, consegue mesclar conflitos familiares a uma trama repleta de humor, mas que não compromete a seriedade da obra e apenas intensifica os seus propósitos.
O longa gira em torno de Jean (Thales Cavalcanti), um jovem filho de pais ricos pertencentes à alta burguesia carioca. Prestes a terminar os estudos do colegial e ainda decidindo qual carreira profissional deseja seguir, a vida de Jean muda drasticamente após uma grave crise financeira se abater sobre a sua família.
O roteiro foi baseado na vida do próprio diretor. O seu pai, que passou por uma grave crise entre os anos de 2002 e 2003, tentou esconder a falência do restante da família. Na época, Fellipe fazia mestrado em Nova York. A ausência o levou ao remorso e este o estimulou a produzir seu primeiro longa-metragem como forma de suprir o afastamento e a falta de apoio ao pai nessa época.
A crise de Casa Grande, na verdade, serve apenas de plano de fundo para uma série de conflitos que irão atingir a família e agir como um verdadeiro efeito dominó que só tende a se intensificar e aumentar de velocidade conforme a trama avança. Embora tenham sido produzidos com contextos distintos, é possível fazer uma analogia entre o trabalho de Fellipe Barbosa e o longa americano Confiar (Trust, 2010). Ambos partem de uma problemática para, a partir daí, dar início a uma cadeia de eventos que afeta diretamente as relações internas entre membros da família, mostrando a fragilidade do ser humano em situações que exigem a mudança de rotina e a administração de conflitos.
Mesmo possuindo uma temática central definida, o longa faz críticas a outros assuntos, como o sistema de cotas e os programas sociais do governo, que recebem destaque e, inclusive, exercem influência sobre o desenrolar dos fatos. Nesse sentido, o diretor, que também contribuiu com o roteiro em parceria com a Karen Sztajnberg, não abre mão de grande carga de humor elegante e inteligente. Piadas afiadas, aliás, não faltam durante toda a trama.
Apesar de o Marcello Novaes e a Suzana Pires estarem presentes no longa, eles apenas dão suporte à leva de novos atores que compõem o elenco. Esse é outro aspecto que merece destaque. Contrariando a premissa de que um bom filme não deve abrir mão de atores já consagrados, Fellipe Barbosa aposta em novos talentos que atuam de forma convincente e não decepcionam. Como disse o próprio diretor antes da projeção do longa no Festival Janela Internacional de Cinema do Recife, talentos foram revelados nesse longa e certamente farão sucesso daqui para a frente.
De forma divertida, Casa Grande, no fim das contas, serve para nos mostrar que quando os relacionamentos não são construídos sobre uma base sólida, problemas financeiros ou de cunho material são a menor das adversidades. Com um final que pode deixar em alguns a sensação de que faltou algo, o filme na verdade não subestima o espectador e consegue com maestria cumprir o seu objetivo principal.
*Crítica publicada originalmente como parte da cobertura da 7° edição do Festival Janela Internacional de Cinema de Recife.
Ano: 2014
Diretor: Fellipe Barbosa
Roteiro: Fellipe Barbosa, Karen Sztajnberg
Elenco Principal: Thales Cavalcanti, Marcello Novaes, Suzana Pires, Alice Melo, Clarissa Pinheiro
Gênero: drama
Nacionalidade: Brasil
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