Por Guilherme Franco
Quando uma obra cinematográfica consegue resumir tudo o que o autor desse texto sente em uma palavra. Todas as dores de cada santo e poético dia vivendo em uma sociedade em crise se mostram em uma personagem que a vontade é de apenas quer entrar na tela como em A Rosa Púrpura do Cairo (1985) e dizer que tudo vai ficar bem. Momentos como quando Paulina diz: “Existem muitos jeitos de chorar, mas o meu é o mais desdenhado.”, vê-se que as lágrimas que não conseguem sair apenas estão presas dentro de nós, que sentimos sempre a dor do mundo.
Um drama familiar que conta a história de uma pequenina heroína com poucos anos de vida. Asia é uma garota, que após a separação dos pais fica num verdadeiro ping-pong, até o ponto de se encontrar sozinha numa família que mais se parece como uma selva de perdidos. O ano em que tudo se passa é 1984, e por ironia ou não do roteirista, muitas cenas do filme contém tons políticos e sociais (lembram do livro de nosso querido Orwell?). Passagens são minuciosamente apresentadas ao espectador trazendo características, como a fotografia e o roteiro que lembram muito o cinema de Xavier Dolan, já mencionado em crítica do Cahiers du Cinéma sobre a diretora “parecer uma irmã do canadense”. Mas além de Dolan, Asia Argento tem um trabalho maior com as cores e, como dito, com as característica histórico-sociais.
“Se contei tudo isto não é para me fazer e vítima, mas para que sejam gentis.” (Asia)
O trabalho com a fotografia escura e colorida conseguiram trazer a nostalgia dos anos 80/90. Em conjunto, a trilha sonora, que é letrada e instrumental, o mergulho se completa com a direção de arte que dialoga com as luzes como o amarelo, laranja, azul e vermelho da fotografia, mas sem ficar um carnaval. A diretora utilizou vários planos singulares e bons enquadramentos, como um plongeé com a protagonista na diagonal que conseguiram mostrar a solidão e incompreensão da personagem. Tais escolhas técnicas, somadas a reflexão filosófica instigada pelo filme, enriqueceu a cinematografia da obra. É um daqueles filmes que permanece na cabeça mesmo após seu término. Uma das cenas, Argento usou o mesmo recurso que Dolan em Mommy, o artifício que talvez possa ser chamado de “falso futuro” ou “causar mais dor dramática”, quando a cena avança para depois retornar sugerindo ter sido apenas uma ilusão da personagem.
O grande ponto do filme se situa no conflito familiar como primariedade da incompreensão de Asia. A triste sofrência de quem, como o autor desse texto, é dramático e queria ajudar todo mundo que sofre, se mostra um drama pontiagudo construído pela narrativa envolvente. Observa-se crianças com dramas de adultos e adultos com dramas de crianças, além disso, a agressividade contra os menores, a metamorfose da forma com que a construção social do infantil para o maduro “deveria” ou normalmente é feita.
Assim, o mis-en-scene é montado com algo que remete a Amelie Poulain, com tons mais políticos e dramáticos em cima de um pequeno ser que não teve a experiência de ser amada completa e verdadeiramente. Uma garotinha que consegue o carinho e paz nessa imundice toda. Como a própria protagonista diz, “Maltratado, mas gentil, caro ou cara, não tenham medo, o momento vai chegar.” E resta apenas estarmos preparados para as crises e tapas que veremos pela frente.
Ano: 2016
Direção: Asia Argento
Roteiro: Barbara Alberti, Asia Argento
Elenco Principal: Giulia Salerno, Charlotte Gainsbourg, Gabriel Garko.
Gênero: drama
Nacionalidade: Itália
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