Durante o FEST – New Directors New Films Festival, Killing Jesus era um dos filmes que eu estava mais curioso para ver. O filme de Laura Mora Ortega, cineasta latino-americana, tem um título forte e uma proposta interessantíssima, e consegue por fim, fazer um retrato potente da real situação de muitas pessoas em nosso continente.

O longa conta a história de Paula, uma adolescente que após ver seu pai que era um professor universitário assassinado em sua frente, decide ir atrás do criminoso e começar uma investigação por conta própria. Isto é algo que logo começamos questionar no filme: até que ponto a protagonista consegue ter tanto sangue frio para começar sozinha uma investigação da morte do pai e adentrar no mundo dos cartéis e violência da cidade colombiana de Medelín? Porém, como uma performance que transcende as telas, a atriz Natasha Jaramillo consegue prender o ar de quem ficava revoltado com os atos da adolescente estudante de fotografia de 22 anos que vão nos surpreendendo a cada cena.
 
Com o decorrer da narrativa, a obra vai prendendo pouco a pouco e começamos a ficar cientes de quem é o verdadeiro Jesus, de como as ações e conflitos de Paula vão se interseccionando em uma realidade que ela, mesmo sendo uma minoria, consegue ver através dos seus privilégios. O mais interessante, porém, é o caminho escolhido pela realizadora. Mesmo sendo um thriller à la Cidade de Deus e outras obras que fazem um retrato de uma periferia pobre e com suas problemáticas, o mais fantástico é ver tudo sendo guiado pelo olhar de uma menina/mulher que,ao mesmo tempo que se redescobre em meio a paixão e a vingança, vai traçando todo um panorama social e econômico da população daquele local.
 
O filme é como uma aula de sociologia e poder, lembrando muito os ensinamentos que recebemos em Ônibus 174, de Felipe Lacerda e José Padilha (2002). Paula é todos nós, que precisamos repensar situações e conflitos do dia-a-dia, se colocar no lugar e na vida de outras pessoas com as quais muitas vezes apenas julgamos e colocamos na fogueira achando que morte ou prisão é o que vai resolver tudo. Laura traz uma grande metáfora e uma obra que mesmo tenso sido escrita há anos é um retrato super atualizado das condições e relações interpessoais que temos com nossa própria sociedade.
 
A forma com que o filme aborda a empatia e o ato de abrir os olhos e enxergar a real situação de muitos distantes de nós, brancos, classe média, com privilégios e condições para uma vida no mínimo boa, foi a paixão de Paula, e todos os problemas que foram consequências disto, mas também todas as resoluções e como a culpa disso ou daquilo é influência de outras classes e não necessariamente quem fez o ato em si que tanto castigamos, como roubar um celular ou uma carteira, tem gente que rouba muito mais que isso e nós apenas aceitamos.
 
Jesús são todos aqueles que estão diariamente são crucificados e mortos, como Cristian Soares, Dandara, Marielle, Marcos Viniciús e tantos outros que diariamente são vítimas da hipocrisia e colocados de lado, além da margem de uma sociedade cega e que tem nojo de suas próprias ações, mas ainda assim mantém nelas suas bases estruturais.

 

*este post faz parte da cobertura da 14ª edição do FEST – New Directors New Films Festival

Killing Jesús

Killing Jesús (Matar a Jesús)

Ano: 2017
Direção: Laura Mora Ortega
Roteiro: Alonso Torres, Laura Mora Ortega
Elenco principal:  Natasha JaramilloGiovanny RodríguezCamilo Escobar
Gênero: ​Drama
Nacionalidade: Colômbia

Avaliação Geral: 4,5