Por Guilherme Franco
Muito se falou acerca de Moonlight – Sob a luz do luar, o filme foi ganhando repercussão e se tornou o segundo favorito ao Oscar, venceu o Globo de Ouro de Melhor Drama e conquistou a estatueta de Melhor Filme, por fim. Em uma sociedade de variadas paixões, umas descontroladas, outras acomodadas, a obra vem como uma dolorosa anestesia em cima de discursos “do bem”, geralmente estão cheios de hipocrisia, que apenas falseiam o preconceito ainda existente por trás dessa máscara.
O filme é dividido em três partes: i Little/ii Chiron/iii Black.
Assim como Boyhood, Moonlight traz a narrativa do amadurecimento, aqui dividido em três atos, cada um representa uma fase da vida de Chiron. Uma criança sem pai, com uma mãe drogada e todo um contexto perigoso, tendo tem que escolher entre desafiar o destino pré-marcado de tráfico e criminalidade, ou encontrar o oxigênio para sair desse mar sufocante. ‘Little’ é a realidade de quando o personagem era apenas uma criança, começando a viver e descobrir o mundo de possibilidades que o envolve. ‘Chiron’ é o personagem em sua adolescência, com novas descobertas e obstáculos. Já ‘Black’ é quase que um epílogo onde o personagem já adulto e quase certo de suas escolhas retorna a muitos momentos de sua vida para rememorar e dar uma nova perspectivas a vários sentimentos.
Com a história de Tarell Alvin McCraney, Barry Jenkins transforma um fato presente na história de muitas pessoas em uma crônica da vida. “…você precisa ter um coração sombrio como o mar”, diz o personagem Juan em dado momento da película. De paixões renegadas e um cotidiano de solidão, a obra se transforma em um reflexo de luz. Sensível, calmo e discreto, tem-se uma linha poética que o percorre durante toda a projeção com o sotaque cantado dos personagens; poesia visual aliada a qualidade técnica da obra que é de impressionar. A fotografia é uma mistura de texturas e luzes que se tocam de forma harmônica e tempestuosa na pele dos atores, o branco e o bege constantes sempre incomodados dialogando com os fortes azuis e rosas. A trilha sonora também é diversa, trazendo desde Caetano Veloso cantando em espanhol e outros clássicos até rocks e raps, resultando numa composição original.
“Na luz da lua, garotos negros parecem azuis”
Moonlight é seco e frio como o estereótipo de um homem heterossexual, aquele machão que não chora, e também poético, sensível e delicado como todos os seres humanos são ou um dia foram. Diferente de Manchester à beira-mar, que dolorosamente faz o espectador continuar no estado de luto e sofrimento que percorre o filme, Moonlight mistura esse sentimento frio à ingenuidade e a carência emocional de Chiron. A ferida vai cicatrizando para, assim, Chiron aceitá-la e conviver com ela. Essa união do forte e “fraco”, do belo e “feio”, que juntos são o grande fator determinante do poder de ruptura que o filme tem, é tanto emocional como social.
Do bullying na escola e o primeiro amor até assuntos pontualmente vistos no cinema mainstream, Barry Jenkins constrói uma obra única que na visão de muitos espectadores e cinéfilos já ganhou o status de obra-prima, por sua ótima realização em aspectos técnicos como a trilha sonora e fotografia, a importância histórico-social que tem numa época atual, onde radicalismos e extremismos estão cada vez menos velados e o preconceito é algo mais e mais aparente.
O filme é composto majoritariamente por atores negros, atuações singulares e marcantes como a de Naomie Harris, que gravou toda a sua participação no filme em três dias, além de Janelle Monae, o premiado Mahershala Ali e os próprios três atores que interpretaram Chiron em suas diversas idades. Com forte referência ao cinema de Wong Kar-Wai, Moonlight é visionário e sentimental. Além do empoderamento por meio de atores, roteiristas e diretor negro, é produzido por uma mulher, e assim como a frase dita durante o filme: “você é parte do mundo cara”, o longa vem para mostrar o espaço que as ditas minorias podem e devem ocupar. Revelando uma nova faceta frequentemente reprimida. É um marco na cinematografia queer e na própria história do cinema, como um todo.
Ano: 2017
Direção: Barry Jenkins
Roteiro: Barry Jenkins, Tarell Alvin McCraney
Elenco Principal: Mahershala Ali, Shariff Earp, Duan Sanderson
Gênero: drama
Nacionalidade: EUA
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