Por Jenilson Rodrigues
Um baixo, uma bateria e algumas garotas com vontade de ganhar o mundo, sem ter a menor ideia de como fazê-lo. Se para o punk com pouco se faz muito, é possível dizer que o diretor sueco Lukas Moodysson entendeu o significado da autonomia do faça-você-mesmo. Nem o título pretensioso do filme chega a destoar de toda a atmosfera criada para retratar uma história verdadeiramente punk. Sem abrir mão da coragem e o orgulho, típicos dessa cultura revolucionária, o longa consegue estabelecer um ritmo que acaba representando fielmente um pouco desse universo peculiar através de três personagens distintas e icônicas: Klara, Bobo e Hedvig.
O ar de aparente subversão e transgressão e a pegada ligeira em alguns instantes dão lugar a tomadas invernais de uma região fria e de belas paisagens. As cores vivas que acompanham Klara durante quase todo o longa – em contraste com os tons carregados de Bobo – parecem denotar novidade, pois combinam com sua personalidade espontânea e renovadora. Os tons mais quentes, como o vermelho e o amarelo, preenchem espaços onde a possibilidade de novas experiências se apresenta, como no caso do estúdio onde as garotas começaram a tocar e no camarim antes da apresentação da banda no festival. Se o vermelho é uma das primeiras cores com a qual uma pessoa tem contato ao chegar ao mundo, nestas duas situações essa tonalidade marcou o nascimento da banda, do amadorismo do primeiro encontro musical ao desafio da primeira apresentação em público.
A ousadia foi fundamental para retratar as personagens, levando as crianças para o universo do punk e não o contrário. Situações incômodas e aparentemente indigestas, como embriaguez infantil, ganham destaque em meio a cenas inusitadas capazes de prender a atenção do espectador, sem que para isso sejam necessários truques ou técnicas manjadas de envolvimento com a trama. Não há sinais de uma tentativa de “humanização” do punk. Apesar do retrato cru de uma fase complicada na vida de três garotas, elas são o que são. A infância não se separa em nenhum momento de suas atitudes precipitadas e inconsequentes.
Nós Somos As Melhores consegue expor de forma bem humorada a influência de ideologias na conduta e na trajetória de jovens nos anos 1980, e a força que movimentos como o punk tinham principalmente nesse período, o que levava até mesmo crianças a transgredirem os comportamentos vigentes da época em que viviam.
Klara não se detém diante de nada. Contesta tudo, não ouve conselhos, pensa por si própria e canaliza sua raiva e seu ódio para algo que a ajude a se livrar do que não concorda. Seu poder de persuasão é tamanho que as pessoas de seu convívio acabam sem perceber se tornando mais seguidoras do que propriamente amigas. É alguém que modifica tudo ao seu redor sem ao menos se dar conta da dimensão dessa transformação.
Se três acordes são necessários para a música punk, o terceiro elemento, a estranha e pacata Hedvig, acaba funcionando como um elo entre Klara e Bobo. Era o ingrediente, o tempero que faltava para dar vida às suas pretensões e ao mesmo tempo conectar uma amizade através da vivência de experiências significativas. Três garotas de personalidades completamente diferentes e de tanta determinação são capazes de contagiar até o público mais exigente, mantendo-o preso na cadeira do início ao fim (e até mesmo após o fim) acompanhando uma obra acelerada e impactante, como o bom e velho punk.
Nós Somos as Melhores (Vi är bäst!)
Diretor: Lukas Moodysson
Roteiro:Coco Moodysson, Lucas Moodysson
Elenco Principal: Liv LeMoyne, Mira Barkhammart, Mira Grosin
Gênero:Drama, Comédia
Nacionalidade: Suécia
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