Por Paulo Pereira
Uma das atividades econômicas mais rentáveis nos Estados Unidos foi o comércio de pele animal. O explorador Hugh Glass inseria-se nesse campo mercantil e no início da década de 1820 fez parte de um grupo de cem homens que tinha como escopo navegar pelo Rio Missouri e comercializar tais artigos manufaturados. Enquanto preparavam-se para zarpar, esses mercadores foram acometidos por tropas indígenas Arikaras. Obnubilados, os treze sobreviventes lograram entrar no barco e seguiram com destino ao Forte Henry. Para despistarem os indígenas, decidiram seguir por terra, deixando a nau avançar pelas águas pluviais. Próximo ao Rio Grande, Glass foi surpreendido por uma ursa que o atacou inexoravelmente.
Mesmo lânguido, o caçador conseguiu assassinar o animal. Gravemente ferido, foi levado pelos companheiros até um determinado trecho do caminho. Notando as adversidades de escalar as altissonantes montanhas com um indivíduo em estado comatoso, Andrew Henry ordenou que Jim Bridger, John Fitzgerald e Hawk – filho de Hugh e de uma indígena – cuidassem do desbravador até a sua morte e o enterrassem dignamente. Inerme e comunicando-se a sotto voce, Glass “concordou” que Fitzgerald o sufocasse, mas este foi impedido por Hawk. Iracundo, John assassina-o, enterra o enfermo ainda vivo e, a posteriori, parte para o Fort em companhia de Bridger. Exaspero e trôpego, o intrépido explorador sublevou-se de sua cova e foi de encontro ao assassino de seu filho, ávido por vingança. O percalço desse trajeto, em conjunto com os momentos introspectivos do protagonista, é a premissa do longa-metragem O Regresso, dirigido por Alejandro González Iñárritu e adaptado da obra The Revenant: A Novel of Revenge, escrita por Michael Punke.
Tal produção cinematográfica externaliza uma imagem dos desdobramentos provocados pelo processo colonizador nessa região do continente americano. A dicotomia “civilização” versus “barbárie” é explanada em algumas falas de Henry e Fitzgerald. Aliás, essa última figura representa a idiossincrasia dos colonos a partir de sua visão metafísica e atemporal dos acontecimentos. Saindo do campo homilético de Fitzgerald e da perspectiva dos exploradores, tal sistema cruento e umbrífero é denunciado nos diálogos de alguns personagens. Logo no início, durante uma discussão, Glass repreende Hawk afirmando que “eles [os descendentes de europeus] não ouvem a sua voz, apenas veem a cor de sua pele”. Em um outro momento, o líder da tribo Arikara acusa um comerciante francês de ter levado tudo o que tinha.
Apesar de fugir dos truísmos e das atitudes panegiristas visíveis em outras obras do gênero, o roteiro apresenta alguns hiatos consideráveis, pois centra-se excessivamente no infortúnio de Glass. Sem dúvidas, a qualidade técnica do filme é louvável, sobretudo a fotografia e o seu mise-en-scène – composto por longos planos-sequência. Entretanto, o grande destaque é a magnífica interpretação de Leonardo DiCaprio, que deu vida a Glass. O longa-metragem de González Iñárritu é um excelente panorama das relações tênues existentes entre os estadunidenses – e, também, os europeus – e os indígenas no processo de expansão territorial dos Estados Unidos no século XIX.
O Regresso (The Revenant)
Ano: 2015.
Direção: Alejandro González Iñárritu.
Roteiro: Alejandro González Iñárritu, Mark L. Smith.
Elenco Principal: Leonardo DiCaprio, Tom Hardy, Will Poulter, Domhnall Gleeson.
Gênero: Aventura, Drama.
Nacionalidade: EUA.
Veja o trailer:
Galeria de Fotos:
A fotografia de O Regresso é abordada em detalhes no curso Direção de Fotografia ministrado pelo professor Kiko Barbosa. Mais informações no link abaixo.
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