Por Heleni Flessas
Delicado e discreto, Preenchendo o Vazio é um exemplo da incrível arte do cinema, a qual é capaz de nos transportar para outros mundos e culturas em apenas algumas horas. O trabalho da diretora estreante Rama Burshtein foi eleito o vencedor da 36ª edição da Mostra Internacional de São Paulo e conquistou o público com seu enredo simples e envolvente. Apesar da temática diferente, e talvez estranha para alguns, como a cultura judaica, o filme não passa longe da porta de casa de muitos e é consistente em sua proposta.Na obra, Burshtein leva o espectador praticamente para sua sala de estar em Israel (a diretora é de origem hassídica), onde este se depara com um mundo completamente diferente do seu. A direção primorosa acompanha Shira Mendelman – interpretada por Hadas Yaron, ganhadora do prêmio de Melhor Atriz no Festival de Veneza – uma jovem de família judaica ortodoxa que mora em Tel Aviv e está prestes a se casar com um pretendente escolhido por seus pais. Quando tudo parece estar em ordem quanto ao seu futuro, sua irmã Esther, em uma gravidez já avançada, falece, deixando seu herdeiro nos cuidados da família e do pai. É aí que o certo dá espaço para vários vazios.

Como manda a tradição, o pai da criança, interpretado por Yaftach Klein, deve se casar novamente. Em meio a essa situação difícil, a família tenta arranjar uma candidata para ser sua nova parceira. Entre diálogos entre as mulheres da família e conselhos de rabinos sobre a melhor pessoa para tomar o papel de mãe, os principais vazios ficam claros – a criança precisa de uma figura materna, o pai precisa de uma parceira, e Shira está na idade de formar uma família. É aí que o filme trata de um tema como o casamento de forma tão distinta, porém familiar em muitas culturas – casar com alguém para o bem de todos ao redor, ou para o bem de si mesmo?

A proposta do filme não é questionar ou criticar as tradições do casamento judeu a ponto de causar polêmica, e sim de apresentar um ritual diferente de uma cultura tão rica. O espectador pode entender ou não, aceitar ou não, mas a intenção aqui é preencher o vazio de forma imparcial entre mundos e religiões, criar pontes. Burshtein mostra que as mulheres não são forçadas, mas há uma pressão social para que se casem – visão que não é incomum no mundo ocidental.

A obra é, primeiramente, feminina – no sentido das questões íntimas da mulher. Burshtein aborda temas como maternidade, morte, medos, matrimônio e expectativas sociais de forma delicada, mas nem um pouco cor de rosa. O roteiro, com poucos diálogos, retrata bem a delicadeza e ambiência proposta pela diretora. As atuações são ricas e intensas na medida certa, sem exageros.

Aqui, não é importante entender ou questionar a obra, mas sim sua proposta. O mundo de Shira pode ser diferente do mundo do espectador, mas nele o amor, a confusão, os desejos, as alegrias, os medos – em geral, os sentimentos – são da mesma maneira, como em todas as culturas, com em todo ser humano. O diferente é igual mesmo nas diferenças, e é aí que a familiaridade do filme está contida.

lemale_et_hahalal_ver2Preenchendo o Vazio (Lemale et ha’halal)

Ano: 2012

Direção: Rama Burshtein.

Roteiro: Rama Burshtein.

Elenco principal: Hadas Yaron, Yiftach Klein, Irit Sheleg.

Gênero: Drama.

Nacionalidade: Israel

 

 

 

Veja o trailer:

Galeria de fotos: