Por Luciana Ramos

Em 1986, Leos Carax lança sua segunda película e estabelece-se como um dos expoentes do cinema francês contemporâneo. Trata-se de Sangue Ruim, obra difícil de ser enquadrada em um gênero dada a quantidade de estilos visuais misturados que aborda o amor no mundo moderno.

Marc (Michel Piccoli) procura Alex (Denis Lavant), filho do seu falecido parceiro, para ajudá-lo a roubar a fórmula de um medicamento que promete combater uma epidemia que se alastra. Trata-se da STBO, doença somente transmitida pela relação sexual sem vínculo afetivo entre os amantes. Basta um deles não estar apaixonado para ambos serem afetados. Os sintomas variam de problemas de visão e articulações a contrações musculares involuntárias. Porém, ao abandonar a namorada Lise (Julie Delpy) para dar continuidade ao plano, Alex vê-se atraído por Anna (Juliette Binoche), mulher de Marc.

Parte da “Trilogia do Amor” de Carax, junto com Boy meets Girl (1984) e Os amantes de Pont-Neuf (1991), o filme critica a “liquidez” dos relacionamentos amorosos contemporâneos (utilizando a terminologia de Bauman) e a pune com o aparecimento de um vírus letal e incurável. O próprio protagonista reflete esta oscilação. Durante a sua jornada, clama-se apaixonado e tenta criar laços amorosos com Anna, que permanece fiel a outro homem, mas abandona Lise por medo da intensidade do relacionamento dos dois.

O filme é recheado de referências cinematográficas. Do expressionismo alemão e sua cria cinematográfica, o noir, os planos angulosos e o jogo de sombras da fotografia. Neste caso, a escuridão é contraposta e enfatizada pelo uso das cores primárias que aparecem em alguns elementos de cena, destacando-se o vermelho que sempre parece rodear a personagem de Juliette Binoche. Em duas cenas, as cores somem, a tela fica granulada, preenchida pela face dos atores em um superclose e então temos a impressão de voltarmos por um momento a era do cinema mudo. Porém, acima de todas as outras homenagens, está a feita pelo diretor à Nouvelle Vague, em especial na construção do protagonista e no desenvolvimento do seu relacionamento afetivo com Anna.

Carax utiliza os mais variados estilos visuais, mas se apropria deles de tal forma que acaba por criar algo totalmente seu. A teatralidade das cenas, da mise-en-scène aos diálogos, aliada a uma fotografia imaginativa que abusa dos planos bem fechados, em especial o plano de detalhes, fornece a obra um tom poético.

No entanto, há alguns pontos negativos. O excesso de cortes bruscos e inserção de flashes pretos entre os planos atrapalham a experiência. Ademais, o filme estende-se além do necessário e inclui personagens que não influenciam em nada na trama, como o voyeur que segue Anna, interpretado pelo próprio diretor.

Mesmo após 27 anos, Sangue Ruim continua relevante tanto na temática quanto nas escolhas criativas. Não dá para ver a cena em que Denis Lavant dança e corre no meio da rua ao som de “Modern Love”, de David Bowie, sem lembrar instantaneamente de Greta Gerwig fazendo o mesmo em Frances Ha, lançado recentemente. É igualmente incontestável a beleza simbólica de algumas passagens, como o final. Em resumo, vale a pena conhecer a obra desse que é um dos mais importantes diretores franceses da atualidade.

Cinemascope-sangue-ruim - posterSangue ruim (Mauvais sang)

Ano: 1986

Diretor: Leos Carax

Roteiro: Leos Carax

Elenco Principal: Michel Piccoli, Juliette Binoche, Denis Lavant, Julie Delpy

Gênero: Drama, Suspense, Ficção Científica, Romance

Nacionalidade: França

 

 

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