Por Domitila Gonzalez


Não tem como pensar em cinema europeu sem pensar em cinema francês. E não tem como pensar em cinema francês sem pensar em Juliette Binoche, atriz mais do que consagrada, presente em filmes como O Paciente Inglês (Anthony Minghella; 1996), Chocolate (Lasse Hallström; 2000), Cópia Fiel (Abbas Kiarostami; 2010) e a impecável Trilogia das Cores (Krzysztof Kieslowksi; 1993 e 1994).

Binoche tem como marca a naturalidade na interpretação de seus papéis, bem como a intensidade no olhar e grande presença em cena. Tudo isso aparece e ganha destaque em Elles, produção franco-polonesa na qual, sob a pele da jornalista Anne, a atriz nos apresenta mais uma atuação brilhante.

Anne (Binoche) é casada e tem dois filhos, formando uma típica família de classe média-alta francesa.  Trabalha na revista Elle, cozinha como ninguém, fuma como se não houvesse amanhã e enfrenta um casamento que caiu na rotina. Durante a produção de um artigo sobre prostituição, conhece duas estudantes universitárias: Charlotte (Anaïs Demoustier) e Alicja (Joanna Kulig), ambas garotas de programa.

Cortes, avanços e retrocessos fazem com que o longa-metragem desenhe, aos poucos, as marcas do encontro dessas histórias. Vemos Anne pesquisando e se tornando a pesquisa por meio das perguntas colocadas a seus objetos de estudo, que acabam virando seus próprios questionamentos: afinal, o que é ser prostituta?

Numa relação espelhada, conforme Charlotte e Alicja se revelam, também se revela uma Anne vaidosa e ao mesmo tempo insegura. As conversas da jornalista com as estudantes fluem com a naturalidade de quem entende o que faz, seja um artigo ou seja sexo.

Fazer um filme com cenas de sexo é complicado. Almodóvar que o diga. Mas diferentemente do espanhol que gosta de cenas fortes – Almodóvar sempre será Almodóvar – , a polonesa Malgorzata Szumowska (33 sceny z zycia; 2008) conseguiu achar um meio-termo que nos coloca na temperatura certa de cada quadro. É clara a diferença de enquadramento e principalmente de intenção, de elenco e direção, da cena com traços masoquistas no banheiro da casa de Charlotte para a tentativa desesperada de Anne de fazer sexo oral em seu marido Patrick (Louis-Do de Lencquesaing).

Das conversas com as meninas, destaco o abraço sem jeito dado em Charlotte, na chuva, e toda sequência de bebedeira no apartamento de Alicja. Aliás, o elenco jovem foi muito bem escolhido. Tanto as meninas quanto os filhos de Binoche no filme, Florent e Stéphane, interpretados por François Civil e Pablo Beugnet, são talentosos e corajosos. E foram bem-sucedidos em todas as cenas.

A sequência mais bela do filme, no entanto, é, sem dúvida, a do jantar.  É o toque da arte num filme realista francês. Vale muito a pena ser vista e revista.

A fotografia se faz presente como contrastes entre cores quentes e frias ao mesmo tempo em quadro, em primeiro e segundo plano. As transições entre uma cena e outra, por vezes rápidas, por vezes simples, outras desfocando e focando detalhes como a aliança no chuveiro e o sangue escorrendo do dedo cortado, são mais marcas de quão detalhista é esse longa-metragem.

E os detalhes vão além da fotografia. Apesar de bagunçar a ordem do filme estar na moda, não é algo que sempre me agrada. Contudo, não fiquei incomodada, dessa vez.  Sutilezas que geram dúvidas são deliciosas de serem assistidas, como a apologia (?) ao sexo feminino, quando Anne cheira a mão que cortava ostras, na cozinha, ou a dúvida se ela e Alicja ficaram ou não juntas, gerada por um simples desfoque de câmera.

Juliette Binoche faz claramente o papel central da história e isso só é possível graças à generosidade do elenco e à maestria com a qual a diretora conduz o roteiro bem amarrado, escrito em parceria com Tine Bryckel.

Os silêncios são bem utilizados, provando que não é preciso empurrar músicas pra todas as cenas para que elas façam sentido. As sequências silenciosas, só com som ambiente, ressaltam melodias bem escolhidas. Contudo, a principal escolha para música tema não foi feliz. A Sinfonia número 7 em Lá Maior – Opus 92 – II Allegretto já havia sido destaque em O Discurso do Rei (Tom Hooper, 2010), como plano de fundo justamente para a cena mais importante do filme: a do discurso.

Enfim, Elles me convenceu não por ser um filme espetacular – o que de fato não é -, mas por conseguir lidar com a sexualidade de forma natural e sem exageros, colocando-a em foco atrelada a outras muitas questões que a compõem.

 

Cinemascope---Elles-PosterElles

Ano: 2011

Diretor: Malgorzata Szumowska

Roteiro: Malgorzata Szumowska, Tine Bryckel. 

Elenco Principal: Juliette Binoche, Anaïs Demoustier, Joanna Kulig.

Gênero: Drama

Nacionalidade: França/Polônia/Alemanha

 

 

 

 

Veja o Trailer:

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