Por Paulo Junior

O novo filme da saga 007 estreou no 50 º aniversário da primeira aventura do espião britânico, 007 – Contra o satânico Dr. No (1962), dirigido por Terence Young e estrelado por Sean Connery (que repetiu a personagem por mais sete vezes, uma vez em um filme não-oficial da série, 007 – Nunca mais outra vez, de 1983). É claro que a data não poderia passar em branco, por isso o novo filme de James Bond tinha de ser único, com um enredo e desenvolvimento jamais visto na história da saga.

Pensando nisso, Neal Purvis & Robert Wade e John Logan pensaram em um enredo mais realista e estável, que desenvolvesse mais a relação entre M (novamente interpretada por Judi Dench) e 007 e mostrasse o passado de Bond. A direção do longa-metragem foi dada a Sam Mendes (vencedor do Oscar por Beleza Americana, de 1999). Escolhido por Daniel Craig, que novamente vive o espião nas telas, Mendes aceitou o desafio de dirigir um filme que foge do seu estilo, basta olharmos para seus filmes anteriores. Fã assumido da personagem, Mendes disse que ganhou liberdade para desenvolver o filme e poder prestar a devida homenagem a personagem. O diretor desenvolveu cenas de ação bem realistas e conseguiu manter o filme em um ritmo rápido, que prende o espectador. As mais de duas horas passam rapidamente e deixa um “gostinho” de quero mais.

James Bond é certamente um herói com características do tempo presente. Sean Connery, na década de 1960, representava um homem frio, grosseiro e que não tinha medo de combater líderes soviéticos. Roger Morre, nas décadas de 1970 e 1980, representava um Bond glamoroso, sarcástico e encantador, que lutava com ricos empresários e agentes soviéticos, desfrutava de muito luxo e era cercado por belas mulheres. Pierce Brosnan, nas décadas de 1990 e 2000, representava um espião forte, ágil, sarcástico e frio, onde com o fim da URSS, lutava com megalomaníacos. Brosnan soube muito bem misturar o estilo de Connery e Morre. George Lazenby e Timothy Dalton, que representaram o herói nas décadas de 1960 e 1970, respectivamente, desenvolveram um Bond semelhante, caracterizado como um homem sem muito senso de humor, fortes e que, segundo alguns fãs, se aproximavam da caracterização de Iam Fleming, criador da personagem, em seus livros. O Bond de Daniel Craig atende as exigências da atualidade, onde o espião britânico deixa de ser infalível, com uma estrutura emocional bem construída e passa a ser mais realista, comete erros, falha constantemente, sangra e, mais do que isso, mantem um relacionamento materno com sua chefe.

007 – Operação Skyfall apresenta um Bond maduro (ao contrário dos dois filmes anteriores, onde a personalidade do agente secreto estava sendo moldada), que está cansado da condição em que vive e sente a idade avançando. Após uma operação mal sucedida na Turquia e da suposta morte de 007, a base do MI6, em Londres, é destruída. Bond volta ao trabalho, porém passa por inúmeros testes dentro do MI6 temporário, para provar sua resistência e capacidade física e emocional. A idade avançada para o cargo que ocupa, é evidenciado no filme através de diálogos com Mallory (interpretado por Ralph Fiennes), Chefe do Comitê de Inteligência e Segurança do Reino Unido, e Eve (interpretado por Bérénice Marlohe), que o chama de “cachorro velho”.

Antigos personagens voltam, como o caso de Miss Moneypenny (que só aparece no final) e Q, agente responsável pela produção de armas tecnológicas sofisticadas, que foi interpretado pela saga passada por Desmond Llewelyn e John Cleese. No novo longa é interpretado por Ben Whishaw e, apesar de manter algumas diferenças com a personagem antiga, onde agora é um nerd especialista em computadores, mas que mantêm o mesmo nível de humor que o antigo. Logo no primeiro encontro, ao ser questionado por Bond por desenvolver apenas dois utensílios “simples”, Q responde: “O que esperava, uma caneta explosiva?” e, ao sair de cena, pede para que 007 devolva os equipamentos em perfeito estado. Algumas coisas podem mudar, mas suas estruturas ainda continuam as mesmas.

Bond parte para ação. Após um breve período em Xangai e Macau, 007 encontra Raul Silva, interpretado por Javier Bardem. O ator espanhol conseguiu explorar muito bem sua personagem, desenvolvendo elementos jamais vistos em um vilão da saga. Silva, um ex-agente secreto do MI6, ao mesmo tempo em que é sádico e louco, é extremamente meticuloso e conhece muito bem os sistemas eletrônicos e digitais. Em seu primeiro encontro com Bond, Silva toca o peito do herói e insinua que deseja manter uma relação sexual, ao ser questionado que tudo tem uma primeira vez, Bond responde que não era a primeira vez dele, deixando o espectador confuso, seria um blefe? De qualquer moda, é nesse ponto que gostaria de chegar, a série 007, tida como conservadora, quebra com alguns paradigmas. Seria possível, nas décadas de 60, 70, 80, um diálogo semelhante a esse? Não, pois a sociedade, em sua grande maioria, tinha uma visão conservadora e tradicional. Os produtores não correriam o risco da personagem não ser aceita pelo público daquela época. Com os novos tempos, onde a sociedade se mostra cada vez menos intolerante (apesar dessa afirmação ser bastante refutável), foi possível introduzir essa cena no filme, afinal Bond é um filho da sua época.

Com o decorrer do longa, Silva é capturado, consegue fugir e tenta assassinar M. Bond, visando a proteção de sua chefe, leva M para a casa de sua família na Escócia, conhecida como “Skyfall”. 007 volta às suas origens, revive antigos fantasmas (como o zelador da mansão, Kincad, interpretado por Albert Finney) e ganha vantagem em relação ao inimigo. Apesar da modernização, a tradição dos antigos filmes ainda é mantida. James Bond ainda sustenta seu glamour, relaciona-se com uma bela mulher, têm repostas ácidas e sarcásticas e ainda mantêm ativo seu Aston Martin e seu famoso bordão: “Bond, James Bond”. Em contrapartida, não bebe mais seu drink favorito (“vodka-martini – batido, não mexido”), cansa facilmente e vive em uma crise com o trabalho, onde bebe muito e toma comprimidos. Além disso, os inimigos mudaram, não são mais nações ou países, como dito em uma cena por M, e sim pessoas que vivem nas sombras. Os soviéticos não são mais os inimigos do ganancioso e inescrupuloso Império Britânico, e sim os terroristas, que agora podem ser tantos cidadãos russos, como britânicos ou estadunidenses.

A Heineken (bebida consumida por Bond e Tunner no filme) é uma das parceiras comerciais dos filmes da franquia 007. Essa parceria começou em 1998 e, desde “007 – O Amanhã Nunca Morre”, a empresa lança uma campanha divulgando os novos filmes e homenageando James Bond. Esse ano, com o lançamento de Skyfall, a empresa lançou sua nova campanha. É interessante observar duas questões nesse vídeo comercial, a primeira é o ambiente, o cidadão britânico que é confundido com James Bond, foge de terroristas em um trem que sai da Sibéria. O segundo é a cena em que, escapando dos terroristas, o cidadão entra em uma cabine do trem, onde estão oficiais soviéticos, e acidentalmente desmancha um castelo de cartas. Vendo o erro, constrói uma réplica da Catedral de São Basílio. Diante do fato, o oficial soviético se emociona. Logo após, os terroristas entram na sala e derrubam o monumento de cartas. Diante dessas duas questões, é curioso notar que um personagem (James Bond), criado no contexto da Guerra Fria, deixa de ter como inimigo a URSS e o substitui pelo terrorismo. Nota-se também as homenagens aos 50 anos da franquia. Além da presença de oficiais soviéticos, o trocadilho entre o garçom e o doutor é hilário (-Doctor? – No!). Essa cena é em homenagem ao primeiro filme da série, 007 Contra o Satânico Dr. No. Outra homenagem é a cena final, em que James Bond pula do trem e abre o paraquedas com a bandeira da Inglaterra, como no filme 007 – O espião que me amava (1977).

O desfecho do longa-metragem ocorre em Skyfall. Bond tem seu passado revelado a plateia, onde os fatos vividos são constantemente lembrados e onde são mostrado os túmulos dos pais de Bond, mortos em um acidente automobilístico. É importante frisar que os créditos iniciais do filme contam todo o enredo. Com a linda música de Adele ao fundo, podemos ver o rio “sugando” o espião para um buraco, que representa seu passado e suas fragilidades, como o tiro em seu ombro e o túnel da mansão, cemitério com túmulos, sombras que representam os inimigos, a mansão Skyfall e alguns elementos do último combate, como o jogo dos espelhos.

Finalizando, 007 – Operação Skyfall é o melhor filme da série, onde é dosada na medida certa ação com uma história inédita e muito bem construída, com ótimas interpretações, destaca para Craig, Dench e Bardem, uma bela fotografia e uma excelente edição. A nova aventura do agente britânico mostra a figura de um Bond mais humano, com suas aflições e seu passado. Apesar de quebrar alguns elementos da saga passada (a época da “idade de ouro da espionagem”, como dito em uma cena pela ministra), ainda mantem as velhas estruturas da personagem. O longa-metragem aparece exatamente um momento chave para a Inglaterra, onde a Rainha Elizabeth II (fã incondicional da personagem), representando a monarquia, e o governo tradicional estão em crise. James Bond serviria como uma representação desse Império, que é frágil, falho e moderniza-se, mas que ainda mantem as velhas estruturas. Seu líder pode ser substituído, sua sede pode ser atacada, mas sua base estrutural não é atingida. James Bond, usado como uma forma de deslegitimar a URSS aos países capitalistas, atualmente é uma forma de divulgar o Império Britânico, que está em crise.

 

Cinemascope---007-–-Operação-Skyfall-Poster007 – Operação Skyfall  (Skyfall)

Ano: 2012

Diretor: Sam Mendes.

Roteiro: Neal Purvis, Robert Wade e John Logan.

Elenco Principal: Daniel Craig, Judi Dench, Javier Bardem, Ralph Fiennes, Naomie Harris, Ben Whishaw, Bérénice Marlohe e Albert Finney.

Gênero: Ação.

Nacionalidade: Reino Unido/EUA.

 

 

Veja o trailer:

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