“Se tiver que escolher entre estar certo ou ser bom, escolha ser bom.” A frase de Wayne W. Dyer, que faz parte do roteiro de Extraordinário (Wonder) ilustra bem a necessidade de todo ser humano por empatia e compaixão. Também serve como pano de fundo para a história de um garoto nada menos do que, como o título já diz, extraordinário.

Inspirado no livro de mesmo nome, escrito por R.J. Palacio​, o filme acompanha a trajetória de um menino com deformidade facial, Auggie Pullman (Jacob Tremblay, vencedor de vários prêmios por sua performance em O Quarto de Jack), que adora ciências e sonha em se tornar um astronauta. Educado pela mãe em casa durante boa parte de sua infância, ele precisa vencer o medo e o preconceito em sua primeira vez estudando em uma escola com outras crianças.

Contado pelo ponto de vista não apenas de Auggie, mas de alguns familiares e amigos, o filme mostra os conflitos de todos os que se importam com o garoto, para ajudá-lo a ter coragem e ser aceito, vencendo o bullying e rompendo a própria rede de superproteção em torno de sua condição. Todos acabam descobrindo que é impossível alguém que nasceu para ser especial (no melhor sentido da palavra) ser simplesmente normal.

É complicado lidar com dramas envolvendo crianças porque, se pesar um pouco a mão no sentimentalismo, já corre-se o risco de ficar piegas. A linha entre emocionar e manipular emocionalmente também é muito tênue. Afinal, quem não fica com os olhos pelo menos um pouco úmidos ao ver um menino fofinho e de bom coração sofrendo? [leve spoiler: não vamos nem entrar aqui na questão do cachorrinho de estimação da família, verdadeiro mártir silencioso da história]

Outro problema do longa são as inúmeras narrativas, nem todas elas suficientemente interessantes ou bem desenvolvidas. As diferentes vozes em off podem ser um bom recurso no papel, mas na adaptação para o cinema tornam a história um tanto quanto fragmentada e de certa forma interrompem o fluxo narrativo, tirando o foco do protagonista.

​Mesmo com suas imperfeições e pequenas falhas, o filme é honesto e suas intenções estão no lugar certo, no sentido de envolver o espectador e ser capaz de transmitir uma mensagem de tolerância – tão necessária na realidade em que vivemos.​ Embora não muito sutil, a “moral da história” é clara: a aceitação começa de dentro para fora e todas as pessoas no mundo, sejam elas consideradas “normais” ou não, estão em constante batalha consigo mesmas.

Os bem intencionados pais de Auggie (interpretados por Julia Roberts e Owen Wilson) tentam protegê-lo do mundo lá fora, mas aprendem que ninguém pode evitar que as pessoas amadas passem por experiências tristes ou injustas, já que isso faz parte da vida. Tanto que, sem perceber, de certa forma eles acabam negligenciando a filha mais velha, a adolescente Via (Izabela Vidovic).

O melhor amigo de Auggie na escola, Jack Will (Noah Jupe), também não é perfeito e sem querer acaba magoando muito o menino – assim como várias outras crianças, que o fazem sentir mais feio do que ele já se sente. Não se trata de vitimizar as pessoas que são diferentes, mas de fazê-las entender seu valor e sua beleza, independentemente dos padrões. Se o mundo real não é perfeito e ainda falta gente de bom coração, que compreenda a dor dos outros e se esforce para incluir os outsiders no convívio social, o filme ao menos mostra uma realidade possível.

​Todas as atuações são excelentes, em especial a do pequeno protagonista (apesar da verdadeira máscara de próteses no rosto) e de certa forma a solidez do elenco ajuda a disfarçar um pouco o teor de melodrama de algumas cenas. Na família de Auggie, ​o destaque vai para uma pontinha da atriz brasileira Sonia Braga, em uma participação breve, mas tocante. O diretor da escola, Mr. ​Tushman (Mandy Patinkin), também é um personagem interessante e um bom exemplo de politicamente correto sem ser didático.

​Com roteiro adaptado e dirigido por ​Stephen Chbosky (As Vantagens de Ser Invisível)​, o longa é perfeito para ​um programa sem grandes pretensões com a família. ​Ainda que ​não chegue a ser extraordinário, as discussões ​levantadas são válidas e importantes. ​A jornada de Auggie é suficiente para conquistar o público, arrancar algumas lágrimas​ e deixar aquela sensação satisfatória de “filme que faz bem para a alma”.

Extraordinário

Ano: 2017
Direção: Stephen Chbosky
Roteiro: ​​Stephen Chbosky​, ​Steve Conrad, Jack Thorne
Elenco principal: ​​Jacob Tremblay, ​Julia Roberts, ​Owen Wilson, Izabela Vidovic​, ​Sonia Braga, ​Mandy Patinkin, Noah Jupe​, ​Millie Davis
Gênero: ​Drama, ​Família
Nacionalidade: ​Estados Unidos

Avaliação Geral: 4