Por Guilherme Franco

Mistério na Costa Chanel conta a história de pessoas que moram envoltas por um lago num pequeno vilarejo. Desenvolvendo personagem a personagem, a história vai se desenrolando em meio a moradores desse local que estão desaparecendo repentinamente. Temos de um lado uma família de turistas que vive em uma mansão, finos e ao mesmo tempo coloquiais. Do outro, uma família de pescadores/catadores de mexilhão que carregam literalmente nos braços e ombros os turistas que querem fazer a travessia do lago. Ainda há também dois investigadores que são nada mais que lunáticos correndo atrás de um possível criminoso.

Além de carregar os turistas, Ma Loute (Brandon Lavieville), jovem de 18 anos, seu pai e a família, carregam os conflitos agressivos da história. Já Nadège (Laura Dupré) e seus tios e primos, a parte mais sentimental e delicada. Tudo começa a se misturar e sentimentos interferirem uns nos outros quando Ma Loute e Nadège iniciam uma relação mais romântica. Um dos grandes méritos do filme é a personagem incisiva e questionadora de Laura Dupré, algumas vezes vestida como menino e um cabelo raspado, outras de vestido e peruca longa, trazendo um dualidade de gênero que pode afetar quem insiste numa rotulação simplista. A narrativa brinca com essa binariedade e pergunta ao espectador qual a necessidade de se definir, já que a própria família da Nadège não questiona isso fortemente.

Os sons contribuem para a construção de uma excentricidade, quando de repente estamos apenas ouvindo o barulho do sapato ou então o ‘crec’ de uma cadeira em meio a todo um ambiente de natureza ou quartos. Eles mostram a fragilidade dos personagens diante o grande inimigo. Peculiar como Wes Anderson e seus personagens, Mistério na Costa Chanel traz todo um grupo de humanos singulares e suas manias, sejam elas como o modo de andar de André ou o constante riso triste de Aude. Infeliz e trágico como os conflitos familiares de Almodóvar, o filme com o qual Dumont concorreu à Palma de Ouro pela terceira vez é silencioso, irônico e discretamente sarcástico. Mesmo sem músicas nos seguindo durante a história inteira, os momentos em que ela está presente tem grande carga dramática, acentuando delicada e levemente o que é necessário como o encontro de Nadège e Ma Loute.

Mistério na Costa Chanel revisita uma época onde as pessoas não tinham grandes tecnologias para se entreter, assim como Maria Antonieta de Sofia Coppola intervém artisticamente na direção de arte e figurino colocando um all star azul em meio aos coloridos saltos, Bruno Dumont intercede na direção de atores para deixar cada personagem com suas singularidades e sofrimentos exteriorizados, como os trejeitos de um dos inspetores e a personalidade ansiosa do outro. Mesmo com o figurino remetendo a 1910 e tempos passados, a obra traz assuntos super atuais como a discussão de gênero e a liberdade de ser o que é de Nadège, que também é reprimida. Peculiar, exótico, único e doloroso, Dumont esbarra em uma narrativa quase única, com o romance de Ma Loute e Nadège em meio a uma investigação criminosa de turistas desaparecendo. Mostrando a elite branca em diversas classes e facetas, a ironia e sensibilidade é seu grande forte.

Mistério na Costa ChanelMistério na Costa Chanel (Ma Loute)

Ano: 2017

Direção: Bruno Dumont

Roteiro: Bruno Dumont

Elenco Principal: Fabrice Luchini, Juliette Binoche, Brandon Lavieville, Laura Dupré

Gênero: comédia, drama

Nacionalidade: Alemanha, França

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