Wes Anderson é conhecido por criar uma realidade paralela em seus filmes, facilmente reconhecíveis por maneirismos visuais como os enquadramentos centralizados e as cores vibrantes. Suas tramas abordam a dolorosa impossibilidade de retorno à infância, o que causa os mais variados dramas entre adultos.
Esse é, literalmente, o mote de Os Excêntricos Tenenbaums e Viagem a Darjeeling. Além disso, é apresentado de modo abstrato no trauma geopolítico e na perda da inocência nacional em O Grande Hotel Budapeste.
Já a tentativa de escapar prematuramente de uma infância dolorosa e entrar no reino da responsabilidade e dos relacionamentos pseudo-adultos resume os plots de Três é Demais e Moonrise Kingdom. Em A Vida Aquática, O Fantástico Sr. Raposo e Ilha dos Cachorros a narrativa se passa na fronteira entre a fuga da infância e o resgate do adulto, com protagonistas que tentam negociar um meio termo entre inocência e experiência, expandindo o conceito de família.
Em outras palavras, nos filmes de Wes Anderson os personagens estão sempre buscando algo que não possuem, sobretudo a aceitação de um grupo. Para ajudar você a imergir completamente no mundo criado pelo diretor, organizamos um guia para os seus filmes:
Três é Demais (1998)
O segundo filme de Wes Anderson é também considerado um de suas melhores produções. Em Três é Demais, o diretor mergulha no universo das tramas de amadurecimento, muito inspirado em clássicos como A Primeira Noite de Um Homem e Serpico. Contudo, ao invés de focar a história no período pós-universidade, ele mostra o oposto: o último do colégio de Max Fisher, um adolescente com muita confiança, visão de futuro e maturidade.
Amplamente inspirado nos anos do colégio de Wes Anderson, o longa foi gravado na escola onde ele estudou. Na trama, o cineasta permite que o protagonista tenha falhas geradas a partir da sua juventude, como um narcisismo exagerado e a vergonha por ser o garoto pobre estudando no colégio de ricos. Três é demais se destaca entre os filmes de Wes Anderson tanto por ter uma proposta poderosa quanto por olhar a adolescência com empatia e sabedoria que tanto nos faltam nessa fase da vida.
Os Excêntricos Tenenbaums (2001)
A produção é focada na família de Royal Tenenbaum (Gene Hackman), um patriarca que abandonou a mulher e os três filhos há muitos anos, em uma casa que mais parece um museu. O filme representa um verdadeiro atestado ao estilo e linguagem de Wes Anderson e concentra todos os seus maneirismos, principalmente o grande número de personagens. A produção possui possui uma clara inspiração em Soberba, filme de Orson Welles.
A habilidade de Anderson de roteirizar a vida dos Tenenbaum de maneira tão intrincada os torna quase organismos vivos, que pulsam com tristeza, arrependimento e um pouquinho de resiliência. Talvez o sobrenome Tenenbaum seja um sinônimo de fracasso, mas o filme é uma afirmação da instituição familiar e como ela pode ajudar a lidar com os inevitáveis desapontamentos da vida.
O Fantástico Sr. Raposo (2009)
O filme marca a primeira adaptação literária do diretor, a partir do livro do Roald Dahl, e também seu primeiro trabalho em stop-motion. A narrativa é focada no Sr. Raposo, que após anos de vida correta rouba três fazendeiros vingativos, Boggis, Bunce e Bean. A partir disso, o protagonista precisa defender sua família e comunidade da retaliação do trio.
Apesar da relação homem-animal parecer pouco provável de ser abordada num filme do diretor, é possível perceber que, na verdade, a impulsividade e os atos irresponsáveis do Sr. Raposo muito nos lembram de Dignan em Pura Adrenalina, Max em Três é Demais, e Zissou em A Vida Marinha. É possível ainda ligar o personagem ao próprio Anderson, uma vez que ambos são iconoclastas teimosos.
Moonrise Kingdom (2012)
A trama é ambientada na costa leste da ficcional ilha de New Penzance, acessível apenas por barcas. Neste universo, acompanhamos os pequenos Sam e Suzy, ele um escoteiro, ela uma literata sofisticada. Após se conhecerem numa apresentação teatral, eles decidem fugir juntos para construir um reino próprio numa parte deserta da ilha. Sua relação parece um tanto com a dos personagens de O Demônio das Onze Horas, de Godard.
O título nos remete a fantasias young adult, o tipo de livro que possui capas coloridas e mapas detalhados como anexos. O filme procura retratar as emoções exacerbadas do primeiro amor. Anderson contrasta a pureza do sentimento entre Sam e Suzy com o caos das relações adultas entre os pais de Suzy (Bill Murray e Frances McDormand) ou o chefe dos escoteiros (Edward Norton).
O Grande Hotel Budapeste (2014)
Novamente aqui mergulhamos em um cenário ficcional, dessa vez o Grande Hotel Budapeste, situado em Zubrowka, suposto país da Europa Oriental. Encarrapitado no topo de uma montanha, o prédio é uma ode ao serviço e arquitetura impecáveis. Apesar de ter uma vibe dos anos 1960 e possuir elementos que nos remetam à mansão Tenenbaum, o diretor ambienta sua história nos felizes anos pré-II Guerra Mundial.
Zero, o concierge, é a reprodução natural do diretor para o cara dos bastidores, aquele que cuida de toda a operação do hotel e faz todo o possível para agradar os hóspedes, mesmo que isso inclua colocar octagenários na cama. Analiticamente, o filme é um bom exemplo de direção assertiva alinhada à narrativa estruturada. Os diversos personagens, com suas histórias e timelines, se cruzam de forma harmônica e coesa. Prova disso foi a indicação do longa na categoria de Melhor Filme no Oscar de 2015.
Ilha dos Cachorros (2018)
A segunda incursão de Wes Anderson com a técnica stop-motion é talvez seu entretenimento mais acessível. O que não deixa de ser meio estranho, uma vez que o título é repleto de temas sombrios como autoritarismo, internação e extermínio. Num Japão distópico, um líder demagogo luta contra o vírus da “gripe canina” e sentencia todos os cachorros ao exílio em uma ilha de lixo. Lá, os animais se agrupam em bandos e sobrevivem com comida estragada.
A premissa da história é bem semelhante ao clássico antiguerra Fogo na Planície, de Kon Ichikawa. Neste, um grupo de soldados japoneses é deixado para morrer de fome em uma ilha nas Filipinas durante a II Guerra Mundial. Trabalhando com seu cast usual de atores, Anderson conta ainda com as vozes de Greta Gerwig, Coutney B. Vance e Yoko Ono na dublagem em inglês.
A filmografia de Wes Anderson inclui ainda os longas Pura Adrenalina, A Vida Marinha de Steve Zissou e Viagem a Darjeeling. Em breve, o diretor lançará seu novo filme, entitulado The French Dispatch. O trailer já está disponível:
Para saber mais sobre os filmes de Wes Anderson, confira a nossa série de vídeos no Instagram.
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