Por Kiko Barbosa
Uma das decisões da direção de fotografia que se torna desafiadora ao longo do tempo são os planos abertos. Pensar na composição, na dinâmica do olhar, entender por onde a linha visual do espectador vai passear pelo quadro… Todas essas tarefas são complexas pela quantidade de variáveis que entram na equação.
Quando assisti pela primeira vez O Regresso (2015), do diretor Alejandro González Iñárritu, eu já sabia que ia ver as sequências impecáveis de Emmanuel Lubezki. O diretor de fotografia mexicano marca seus trabalhos com excelência, garantida pela trajetória consistente da sua carreira.
Ele atuou nos poéticos O Novo Mundo (2005) e A Árvore da Vida (2011) de Terrence Malick, bem como no frenético Filhos da Esperança (2006), de Alfonso Cuarón, entre outras tantas outras peças incríveis. Mas o que me pegou de surpresa no cinema foi o quão perto estávamos dos atores. Aquilo foi assustador.
A cinematografia de Emmanuel Lubezki
Para somar a essa proximidade, planos sequências nos jogam na linha temporal do ambiente em alguns momentos, deixando de ter a dilatação ou compressão de tempo que os cortes garantem. Isso transforma o filme em uma experiência muito mais íntima com as ações. Desde o ataque dos povos nativos norte-americanos no início da narrativa até a mais absurda luta com um urso. Só faltou sentir o bafo do gigante marrom: a luta pela sobrevivência que nos mantém aflitos em uma sequência de 5 minutos e meio.
A impressão é que estamos vendo o ataque a poucos metros de distância. E é isso mesmo. Era ali que o Chivo, como Lubezki é informalmente conhecido, estava posicionado com a câmera. Apesar do urso ter entrado na pós-produção, e ter sido todo feito em computação gráfica, o impacto não deixa de ser gigantesco. É de gelar a espinha.
Em uma entrevista ao portal DPReview, Lubezki pontuou que a intenção de usar as lentes grande angulares foi justamente para dar a impressão de que você assistia o filme por uma janela. A ação acontecia ali, na frente do espectador, tornando tudo mais visceral.
As escolhas de Emmanuel Lubezki em O Regresso
Para tal efeito narrativo, uma das decisões foi usar lentes com distancia focal de 12mm a 21mm. A câmera utilizada foi uma Arri Alexa 65, com um sensor de tamanho equivalente ao filme película de 65mm a 70mm. Tais escolhas geram a diferença de textura visual que chama atenção pela relação de tamanho entre os elementos em cena e o exagero do eixo de profundidade.
Dessa forma, foi construído um sistema de imagem coerente e consistente, que leva aquela jornada até o espectador. Nós participamos daquilo. Não ativamente, mas estamos ali, vendo tudo, vivendo os dramas e as escolhas dos personagens.
Para largar a cerejinha no bolo, toda a produção foi realizada com luz natural. Segundo o próprio Lubezki, somente em uma cena eles precisaram de um empurrãozinho de algumas lâmpadas, a fim de simular a luz irregular de uma fogueira. Todo o resto foi feito com luz natural. Isso trouxe um desafio para a equipe, uma vez que precisavam rodar as cenas em horas específicas do dia: no amanhecer e anoitecer.
O Regresso é uma verdadeira aula de cinematografia. Não só pelos aspectos visuais envolvidos na narrativa, mas também pelo ritmo, a precisão e a poética no olhar do fotógrafo. As referências feitas aos filmes do aclamado cineasta russo Andrei Tarkovsky é uma belíssima homenagem àquele que dava um valor descomunal à poética visual. Simplesmente imperdível.
O trabalho de Emmanuel Lubezki e os efeitos de diferentes tipos de lentes são abordados no curso de Direção de Fotografia, ministrado pelo professor Kiko Barbosa. Mais informações no link abaixo.
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