Sem muitas complicações, o filme apresenta a história de Ferdinand (Jean-Paul Belmondo), um professor cansado de seu casamento e de sua vida fútil, e da jovem Marianne (Anna Karina), com quem se apaixona e foge para o sul da França, cometendo delitos, se envolvendo em conspirações políticas e redescobrindo sua vida. Aliás, na sua realidade mais crua, este é um filme sobre a dança da vida, da forma mais poética possível.
Outra tarefa difícil é falar sobre o roteiro da obra, que não chega a ser exatamente um roteiro. Aqui, e como na maioria de suas obras, Godard se preocupa com os personagens e com seus diálogos. Seu objetivo principal é mostrar suas angústias, suas paixões, seus medos – sem perder o toque de romance, drama e aventura. Tampouco há uma preocupação com a lógica, com o real, já que o importante mesmo é conteúdo onírico – o que faz com que o espectador fuja de qualquer pensamento ou interpretação e apenas sinta.
A parte visual do filme é outro destaque. Parte da caracterização da Nouvelle Vague é o jogo de cores impecável. Em O Demônio das Onze Horas isso é demonstrado através do branco, do vermelho e do azul – cores das bandeiras da França e dos Estados Unidos e de onde as referências cinematográficas vieram. As sequências musicais, tão encantadoras por si mesmas, não tornam o filme cansativo, mas acrescentam ao seu charme.
A sensualidade é mostrada discretamente por meio das aventuras românticas do casal e pela representação da mulher. Marianne, interpretada por Anna Karina e musa de Godard e da Nouvelle Vague, é uma moça de personalidade forte, porém delicada, intrigante e sensual. Tamanha é a criatividade da direção que é difícil se lembrar de alguma outra obra com a qual esta se pareça.
O que é certo é que O Demônio das Onze Horas não é “mais do mesmo”. Mesmo com todas as características presentes no conceito da Nouvelle Vague, como a crítica e o sarcásmo, o filme não deixa de lado a loucura doce e graciosa de uma aventura com o amor. No final das contas, não há a necessidade de questionamentos; o que vale é a viagem, a dança, a celebração da vida. No final das contas, apenas a poesia cinematográfica importa.
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