Céu escuro

Por Joyce Pais

Uma coprodução Peru-Venezuela, Céu Escuro conta a história de Toño, um fabricante de roupas que tem sua loja/ateliê em um bairro periférico de Lima. Sua vida começa a mudar quando, um dia, chega à sua loja Natália, uma jovem atriz de 23 anos, que encomenda a confecção do vestuário para sua obra de formatura. Toño descobre com ela um mundo que o surpreende e revitaliza; mas as coisas começam a se abalar quando ele conhece o ex-namorado de Natália.

A cena que introduz o filme sugere características do protagonista que no decorrer do filme irão se confirmar – o modo como acaricia a prostituta da qual é cliente assíduo, como a olha com carinho – sua delicadeza e sensibilidade denota um homem vulnerável às mulheres com fortes tendências a se perder nesse ínterim se sentimentos. O que pode de certa forma ser ‘explicado’ no momento em que ele ouve da prostituta que ela traiu o marido com o da prima para, na cena seguinte, questionar a sua ex-mulher, insinuando que ela esteja envolvida com o seu cunhado.

O filme tem como cenário a cidade de Lima. O centro comercial abarrotado de gente é onde se fica a loja de Toño; seu apartamento confere um clima claustrofóbico em oposição aos locais por onde Natália transita – a escola de teatro, passeios com o pai em restaurantes chiques e casa de amigos.

Toño de certa forma preenche uma lacuna deixada pelo pai de Natália, que a renega. Natália encontra nele o aconchego e a proteção que necessita. Lentamente o relacionamento dos dois vai se construindo. O envolvimento de Toño é mostrado gradualmente através de cenas simbólicas como a da fonte. No primeiro passeio do casal ele não quer se molhar com a água da fonte, no final do terceiro ato do filme, já envolvido por completo, ele naturalmente se joga nas ondas do mar e Natália fica de longe vendo. O que começa despretensioso, acaba o transportando para um lugar obscuro, sufocante.

Em um dado momento o amigo de Toño diz que seu fim vai ser mesmo de Otelo (Shakespeare). Ciúme demais pode ser patológico e, para isso, tem uma explicação clínica que é o medo da perda do objeto amado, para ser patológico precisa trazer sofrimento e perturbações. O ciúme patológico e delirante se enquadra na Síndrome de Otelo, que faz referência à obra de Shakespeare. Otelo, o mouro de Veneza , o romance conta a história de um homem que ama demais a esposa e que convencido de sua infidelidade, acaba a matando para logo após descobrir a inocência dela.

O valor de Céu Escuro está em seu realismo palpável. A noção nua e crua de que tal história de amor poderia acontecer com qualquer um.

Obs: Este texto foi postado originalmente como parte da cobertura do 8° Festival de Cinema Latino Americano.

Ceú escuro (Cielo Oscuro)