Por Joyce Pais

Quem está acostumado a ver a beleza estonteante de Ana Paula Arósio e imediatamente associá-la a figuras do imaginário televisivo como Hilda Furacão talvez experimentará um sentimento de estranheza ao adentrar o mundo de Julia, professora universitária de literatura inglesa que, após ser abandonada por sua parceira de longa data, tenta reconstruir sua vida e conviver com seus próprios demônios.

Baseado na obra literária “Como esquecer – Anotações quase inglesas” de Miriam Campelo, o filme chama a atenção inicialmente pelo seu elenco – Ana Paula Arósio, Murilo Rosa e Natália Lage. Na maioria das vezes relegados a papéis recorrentes na televisão, o trio surge em personagens que possibitaram não só o deslocamento do contexto de galã ou estrela global, mas que provavelmente um crescimento profissional e artístico.

Narrado o tempo todo em off pela própria Julia, a história é contada sob a perspectiva da professora através de mesclas do seu presente com trechos dos vídeos de uma viagem a Londres que fez com a então namorada Antônia, figura misteriosa que no longa não tem “rosto”, nunca aparece. As cores que caracterizavam seu relacionamento dão lugar a sua fria e cinzenta existência reforçada com brilhantismo pela direção de fotografia de Heloísa Passos.

Ainda que no processo de adaptação de linguagens, no caso, da literária para a cinematográfica, pode-se notar algumas deficiências que resultaram, por exemplo, num ritmo lento quase teatral da narrativa, o longa-metragem se coloca numa posição de apreciação, onde o tempo segue o fluxo da recuperação de alguém após sofrer uma perda como a retratada na obra.

Se valendo de citações de Virgínia Woolf e Emily Brontë (O Morro dos ventos uivantes), o filme, ao colocar como protagonista uma homossexual, discute um dos temas mais agendados e considerado ainda um tabu, não só na sociedade brasileira como também em sua abordagem cinematográfica. Dessa forma, o que foi anunciado com alarde, no caso a temática da obra, se tornou segundo plano no curso dos acontecimentos.

Em determinado momento da trama, Julia, seu melhor amigo gay, Hugo (Murilo Rosa), e Lisa (Natália Lage), amiga de Hugo, resolvem ir morar juntos em uma casa afastada da cidade, onde poderiam com tranquilidade retomar e dar um rumo diferente para suas vidas. Girando sempre em torno da perda e da dor, o trio enfrenta distintas situações, como sobreviver ao término de um longo relacionamento, ficar viúvo e ser abandonada grávida pelo namorado.

Algumas supresas agitam o andamento do filme e trazem um brilho para a narrativa, são elas: Carmem Lygia (Bianca Comparato), a aluna aplicada de Julia, que tenta por diversas vezes se inserir na vida pessoal da professora e aprofundar o nível de envolvimento entre elas, que se limita ao profissional; e a prima de Lisa, Helena (Arieta Correa), uma artista plástica que revela novas possibilidades para o sofrimento de Julia.

Como esquecer se trata de saber lidar com as lacunas que todos temos a preencher, de conhecer os limites entre o eu, o outro e  o “nós”. Ele sai do lugar-comum ao não reduzir a superação do drama com a simples substituição de pessoas ou parceiros, mas sim, ao fato de se conhecer antes de embarcar em um novo relacionamento. E ainda lança uma questão no mínimo instigante: “qual é o contrário do amor”?

 

Cinemascope---Como-Esquecer-PosterComo Esquecer

Ano: 2010.

Diretor: Malu De Martino.

Roteiro: Sabina Anzuategui, Silvia Lourenço, Douglas Dwight, Luiza Leite, Daniel Guimarães. Versão final: José Carvalho. 

Elenco Principal: Ana Paula Arosio, Murilo Rosa, Natália Lage.

Gênero: Drama.

Nacionalidade: Brasil.

 

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