Por Sttela Vasco
O que separa o auge do fracasso? Em qual momento começa o declínio? O que ele nos traz? E o principal: como o revertemos? Esses são alguns dos questionamentos essenciais levantados por Entre Vales, drama brasileiro dirigido por Philippe Barcinski (Cidade dos Homens) e estrelado por Ângelo Antônio (Dois Filhos de Francisco). Profundo e carregado de reflexões, o longa, selecionado na Mostra competitiva Première Brasil do Festival do Rio 2012, mostra como todos estamos sujeitos ao fracasso total – e ao recomeço também.
Vicente (Ângelo Antônio) tem uma vida bastante comum: é um economista bem empregado, casado com uma dentista dedicada e pai de Caio, filho com o qual tem uma relação muito boa. Tudo começa a mudar quando ele sofre duas grandes perdas que acabam fazendo com que sua vida desmorone. Deprimido, ele muda de nome e começa a viver em um lixão, onde aprenderá novos valores e como sair de um poço aparentemente sem fundo.
A linha seguida pelo roteiro de Entre Vales é, apesar de um tanto batida, interessante. Mesclados constantemente estão momentos atuais de Vicente e a série de acontecimentos que o levaram até seu estado presente. A questão central, aliás, gira em torno de como alguém como uma vida tão “normal” chegou àquela situação. A identificação com o personagem, aliás, ocorre pelo fato de sua vida ser tão cotidiana: a realidade de Vicente é a realidade de muitos de nós e é possível se pegar pensando “e se isso acontecesse comigo?”.
A composição é profunda e causa certo incômodo ao jogar na cara do espectador que todos estamos sujeitos a perder tudo. Porém, o interessante de fato é que a obra nos mostra que o “perder tudo” não está necessariamente no momento em que a perda se concretiza, mas sim no longo caminho até ela. De certa forma, a vida de Vicente já estava no fundo de seu poço antes mesmo de chegar lá, mas ele apenas se deu conta disso após perder as duas coisas que mais prezava na vida.
O filme às vezes corre com os fatos – por várias vezes fiquei com a impressão de que acabaria ali, sem maiores explicações, ou que determinado acontecimento seria ignorado – elemento que pode se tornar incômodo, dependendo do gosto do espectador, mas, em um panorama geral, o ritmo se assemelha bastante ao dia a dia dos caminhões de lixo e dos aterros em si. Tudo é rápido, é preciso correr para alcançar e acontece em seuqência, sem dar muito tempo de se preparar – assim como caminhão despejando o lixo, assim como a vida por si própria.
O caminho percorrido por Vicente, muito bem representado por Ângelo, é muito mais espiritual do que físico. As mudanças – de moradia, de emprego, de nome, de vida – são reflexos de suas mudanças internas. As situações melhoram ou pioram conforme o estado de espírito de seu protagonista. Vale destacar a relação de Vicente com seu filho, Caio, e os significados embutidos em cada momento vivido por ambos – e muitas vezes representado pela maquete.
Com uma história bastante realística, o filme se mantém em sua estrutura segura: intercala momentos, faz sua introspecção, revela aos poucos seu personagem principal e vai, à sua maneira, amarrando todas as pontas de maneira, senão genial, ao menos convincente. Uma obra reflexiva e importante para se pensar sobre as transições da vida.
Ano: 2012
Diretor: Philippe Barcinski
Roteiro: Philippe Barcinski; Fabiana Werneck Barcinski
Elenco Principal: Ângelo Antônio, Daniel Hendler, Melissa Vettore
Gênero: Drama
Nacionalidade: Brasil. Uruguai, Alemanda.
Confira o trailer:
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