Por Sttela Vasco
Uma atmosfera densa, dramas familiares e o conflito entre islâmicos e judeus são pano de fundo para Esclavo de Dios, thriller policial assinado pelo venezuelano Joel Novoa Schneider que não deixa nada a desejar perto das grandes produções hollywoodianas do mesmo gênero. As questões universais e os fatos no qual o filme se baseia* – o conflito em si, o ataque àAssociação Mutual Israelita Argentina, em 1994, em Buenos Aires – são mesclados às histórias de dois homens que, além de lutar por seus ideais, precisam enfrentar as consequências que seus posicionamentos têm em suas vidas pessoais e em suas famílias. Se é preciso um convite para o público conhecer melhor o cinema venezuelano, Esclavo de Dios é logo o bilhete dourado.
Ponto alto do longa, é impossível não se impressionar pela atuação de Mohammed Al Khaldi. Ele vive Ahmed Al Hassama, um homem que vem sido treinado há anos para atuar em uma missão suicida, que foi forçado a criar toda uma vida falsa e que vive conflitos internos que acabam por conduzir toda a trama que, apesar de focada em dois personagens principais, acaba sendo levada pelo personagem de Khaldi. Expressivo, o ator consegue transmitir as dúvidas de Hassama e sua luta interna entre aquilo que lhe é esperado e entre o que ele realmente acredita.
É através de Hassama, aliás, que Novoa nos mostra outra perspectiva sobre os grupos fundamentalistas e seus integrantes, indo além do estereótipo terrorista comumente adotado para delinear tais personagens. O rapaz, um médico por formação, sofreu um trauma em sua infância e acabou aliciado pelo grupo. Sem grande chance de escapar de seu destino imposto, Hassama se deixa levar pelo o que seus “chefes” ordenam, até que os motivos, antes tão certos, perdem a força e ele começa a se questionar e questionar àqueles que se dizem líderes.
Na contramão de Hassama, temos David Goldeber (Vando Villamil). Ele é um home obcecado por suas caçada aos fundamentalistas, chegando a atos de extrema frieza e, em alguns momentos, insensatez. Seus dramas são outros: seu casamento está abalado, sua carreira em risco e sua credibilidade questionada. Ele vê na luta contra o grupo de Hassama a chance de retomar o controle de sua própria realidade.
O longa se intercala entre contar a história de ambos e a frenética caçada de Goldberg por seu Ahmed e funciona bem ao seguir essa linha. O público se mantém tenso e atento, mas, ao mesmo tempo, entretido por haver algo além de tiros, explosões e ataques a todo o tempo. Os dramas familiares da dupla humanizam o conflito e nos aproxima dos “dois lados”, dando rosto aos mesmos. Porém, o mais interessante talvez seja a ausência de vilões ou heróis. Hassama não é o “cara mau”, David não é o defensor justo e honesto que visa apenas um bem maior.
Ambos têm defeitos, dramas e compartilham dos mais diferentes sentimentos: egoísmo, frustração, medo, raiva. Suas histórias, de certa forma entrelaçadas desde o começo, vão se unindo até culminarem em um clímax – talvez menos desenvolvido do que poderia ter sido. Gera certa angústia pensar, após o grande conflito, que o ciclo de perdas, vinganças e horrores – principalmente vivenciados por Hassama em sua infância – não terminará. Assim como na vida real, não há um final feliz ou um fim definitivo. Estas histórias em particular chegaram aos seu desfecho, mas milhares de outras estão apenas ingressando.
*Esclavo de Dios se baseou nos acontecimentos anteriores ao ataque à sede Da Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA) ocorrido em 18 de julho de 1994, em Buenos Aires.
Ano: 2013
Direção: Joel Novoa
Roteiro: Joel Novoa
Elenco Principal: Mohammed Alkhaldi, Vando Villamil, César Troncoso.
Gênero: Drama, Suspense, Policial.
Nacionalidade: Argentina, Venezuela
Veja o trailer: