Por Jenilson Rodrigues
Especialista em retratar personagens problemáticos, o diretor irlandês Lenny Abrahamson desta vez reuniu uma turma de sujeitos desajustados, no seu quarto longa-metragem que vai além da excentricidade e da estética delicada presentes em todas as suas obras.
A trilha sonora por mais uma vez ficou a cargo de Stephen Renicks. Nos longas anteriores Renicks conseguiu ditar o ritmo das tramas com melodias que mantinham o equilíbrio entre a tensão e as surpresas que permeavam os acontecimentos. Em Frank, a trilha segue o compasso de uma estrutura aparentemente simples, mas que surpreende ao conduzir uma história onde caminhos inusitados surgem aos poucos, aumentando a imprevisibilidade do desfecho, tudo regado em sua maior parte a músicas criadas exclusivamente para o filme. O título possivelmente está ligado ao cantor Frank, artista irlandês que participou da trilha sonora do longa metragem anterior de Abrahamson, What Richard Did (2012). As músicas que entraram para a trilha – que também foi assinada por Renicks – aparecem sob a alcunha de Frankband.
Em alguns instantes o foco dos protagonistas é levemente desviado, o que acaba por problematizar o enredo do filme, trazendo mais densidade para as personagens. Isso pode acabar conduzindo o espectador de forma diferente em relação ao que a narrativa apresentava desde o início. O mistério por trás de um sujeito que usa uma cabeça de madeira é ofuscado por um engodo de situações que acabam se mostrando engraçadas por flertarem com a bizarrice e a psicodelia, de uma forma leve e aparentemente natural. O personagem Jon faz até uma referência a David Lynch, mas é possível se recordar das esquisitices do diretor americano antes mesmo do garoto comparar a situação do vocalista cabeçudo com a do pobre e estranho sujeito de O Homem Elefante (1980).
Seguindo uma linha selvagem e desconstruindo sua própria estrutura em alguns momentos, a trama vai ganhando força ao aliar insanidade e acidez. Além de mesclar uma história inusitada com conflitos entre personagens excêntricos, o filme ainda apresenta uma crítica sutil à maneira das pessoas se relacionarem com a música, com seus ídolos e com a tecnologia, diante da efemeridade das redes sociais. Está tudo ali reunido: a pretensão indie de ser superior ao ostentar sua ilusão de exclusividade, a fantasiosa sensação de prestígio diante do número de hits online conquistados através de visualizações e frias interações, além da pouca aplicabilidade da enxurrada de informações desnecessárias com as quais alguém pode ter contato a qualquer momento conectado no seu computador ou smartphone. O próprio comportamento de alguns personagens em muito se assemelha à frivolidade da adoração de muitas pessoas por seus ídolos na era digital. É como se existisse um fanatismo platônico, onde as pessoas acabam se interessando e se apaixonando por suas próprias idealizações, algo ou alguém – nesse caso um músico ou uma banda – que só existe daquela forma em suas próprias mentes.
Ao levar para além da própria trama as bizarrices de um mundo moderno e bem esquisito por trás do show business da música indie, Lenny Abrahamson conseguiu dar vida a uma obra complexa, inovando em seu repertório. Nas quase extintas locadoras, Frank seria um título que daria trabalho para categorizar e poderia ocupar várias prateleiras diferentes. Um lançamento de 2014 que chega aos cinemas brasileiros com um pouco de atraso, mas a tempo de ganhar o seu devido valor.
Diretor: Lenny Abrahamson
Roteiro: John Ronson, Peter Straughan
Elenco Principal: Domhnall Glesson, Maggie Gyllenhaal, Michael Fassbender.
Gênero:Comédia, Drama, Mistério
Nacionalidade: Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte
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