Por Felippe Gofferman
O indicado da Dinamarca ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, Guerra (2015), de Tobias Lindholm (Sequestro; 2012), aborda os dilemas da guerra e as marcas que deixam ao acompanhar o comandante Claus Pedersen (Pilou Asbæk) em ação no Afeganistão, a repercussão das decisões erradas que o levam para corte marcial e a vida de sua família enquanto serve ao exército.
O tradicional realismo do cinema dinamarquês confere às cenas de combate uma crueza e um senso de perigo que transforma cada próximo passo dos soldados em uma bifurcação que pode lhes levar ao êxito ou a morte. Lindholm não poupa nos jargões, códigos de comunicação e protocolos militares para dar mais peso as cenas nos desertos afegãos.
O ambiente de batalha, no entanto, se difere dos grandes filmes de guerra, pois foca em uma pequena região próxima do acampamento de Claus e sua tropa, sem se aprofundar nos porquês do conflito ou num panorama mais amplo das estratégias da invasão. O uso desse microcosmo dentro da guerra que envolve boa parte do país é interessante para criar uma narrativa mais concisa, mas acaba sendo um tiro no pé por não conseguir dimensionar aquele conflito e depender da pouca empatia criada com aqueles soldados. Os traumas acontecem de forma rápida e rasa, sem um aprofundamento nas feridas psicológicas causadas pelo combate. Por outro lado, o maior trunfo do longa está fora da área de conflito.
Tuva Novotny, que interpreta Maria, a esposa de Claus, acrescenta mais carga emocional ao drama em conversas com seus filhos do que qualquer momento de combate. A atriz aproveita o pouco aprofundamento de cada ato do longa da melhor forma possível. Justamente pela falta de minúcia ao construir a personalidade e a evolução dos soldados, a empatia com a mãe que cria sozinha seus filhos se sobressai.
A estrutura narrativa de Guerra remete a de A Separação (2011), mas peca no desenvolvimento de seus personagens e se preocupa apenas em apresentar um dilema moral, sem se importar com quem o enfrenta. Enquanto o longa de Asghar Farhadi se debruça sobre a análise social e nos conduz no ciclo de causa e consequência que atribulam a vida de uma família e culminam nas audiências judiciais, no drama dinamarquês o questionamento moral chega antes de um caminho de empatia ser completamente pavimentado. Embora Lindholm consiga apresentar o questionamento em relação as guerras e seus tons de cinza de forma eficaz, a tentativa de abraçar três diferentes cenários deixou cada um deles mais fraco do que poderia ser, mesmo com o esforço notável de Novotny.
A fotografia dessaturada de Magnus Nordenhof é segura, embora não acrescente nada de novo. Claus altera constantemente entre a luz e a escuridão quando se depara com momentos mais dramáticos. O lar do casal tem pontos de sombra em todos os cômodos e uma iluminação fraca que proporciona maior intimidade nos diálogos entre os dois enquanto realça o conflito moral que os afeta.
Quando finalmente somos conduzidos para o terceiro ato e, consequentemente, ao terceiro cenário, o longa se transforma em um drama de tribunal que perderia para boa parte dos episódios de Lei e Ordem. Uma mise-en-scène falsa e desnecessária que é construída apenas para apresentar o corporativismo entre os soldados e tentar dar uma resolução legalista previsível e apressada. Um desfecho frouxo para um filme que, em seus primeiros minutos, parecia estabelecer o interesse em mostrar de forma realista e detalhista os meandros da guerra.
Guerra traz certo comodismo e um Lindholm que não sai de sua zona de conforto. O longa é daqueles que tem potencial para conquistar júris de festivais, mas que logo será esquecido pela falta de capacidade do diretor-autor de se envolver com sua criação e de conferir uma cara única para a obra.
Apesar de alguns bons momentos, quando sobem os créditos finais apenas um pensamento vem à mente: Será que Que horas ela volta? (2015) não merecia um lugar entre os indicados?
Guerra (Krigen)
Direção: Tobias Lindholm
Roteiro: Tobias Lindholm
Elenco Principal: Pilou Asbæk, Tuva Novotny, Dar Salim.
Gênero: Guerra, Drama.
Nacionalidade: Dinamarca
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