Por Gustavo Soussumi
Quando deixou seu apartamento em Nova York, num momento de aparente crise, o artista plástico tinha um plano audacioso – trabalhar num aterro e, de alguma forma, mudar a vida das pessoas que trabalham separando o material do qual a sociedade se livra todos os dias como se fosse lixo. Esse objetivo entra em contraste com a sua postura inicial, que à primeira vista é de um homem arrogante, mas que aos poucos vai mostrando carinho e cuidado que poucos se prontificariam a demonstrar.
Logo na abertura, temos um trecho da entrevista concedida ao Jô, que elogia Vik demasiadamente e reforça a ideia de sua arrogância. Ao longo do filme, sua história é revelada. Vik veio de uma família pobre em São Paulo e cresceu como artista até chegar às galerias de Nova York. Desta forma, ele acredita em mudança e que alguma diferença ele pode fazer na comunidade que visita, a região de Jardim Gramacho.
As imagens são chocantes, quilômetros da região do aterro com todos os tipos de material desprezado. Ainda assim, não menos chocantes do que as histórias das pessoas que lá trabalham e que também são, à sua própria maneira, “lixo” da sociedade. Inicialmente conhecemos Tião, presidente da Associação de Catadores do Jardim Gramacho, e que nos surpreende ao discutir Nietzsche e Maquiavel. A história de outros catadores, como Isis, Zumbi, Irmã e Suelen, também emocionam. Porém, incrivelmente, muitos deles não aparentam estarem insatisfeitos. Sabem que a vida lá é dura, mas não discutem planos de sair de lá. Zumbi comenta que não quer que seus filhos sejam catadores, mas que sejam profissionais que cuidem e representem a Associação.
O plano de Vik toma forma. Usando fotografias tiradas dos catadores, convoca a ajuda deles mesmos para reproduzi-las com o material reciclável que separam. O trabalho é genial, e as imagens são brilhantes. Tião, por exemplo, vira uma releitura da obra Marat Assassinado, de Jacques-Louis David. Com o cuidado e a dedicação de todos, nota-se que a mentalidade dos catadores começa a mudar, e muitos não querem mais voltar à vida no aterro.
Ciente da situação, Vik leva Tião ao leilão da obra que protagonizou. É um momento emocionante: “Tudo valeu a pena. Tudo o que eu fiz até hoje valeu a pena”, Tião diz, em meio às lágrimas. As outras obras são expostas numa galeria do Rio de Janeiro, e com todo esse retorno do dinheiro e do esforço, a vida dos catadores é sim afetada, mas não apenas materialmente. Uma lição é aprendida, e eles começam a olhar para suas vidas e trabalho com outros olhos.
Esta emocionante obra, dirigida pela inglesa Lucy Walker (Blindsight) e co-dirigida por João Jardim (Pro Dia Nascer Feliz) e Karen Harley, faz crítica a como a sociedade consome e descarta bens em bom estado, em contraste com a situação de pessoas que precisam fazer a vida em meio ao lixo. Durante vários depoimentos o espectador pode parar para pensar “o que eu estou jogando fora?”, e talvez o documentário possa servir como conscientização de muitos.
Ano: 2010
Diretor: Lucy Walker.
Codireção: João Jardim, Karen Harley.
Elenco: Vik Muniz, Sebastião Carlos dos Santos (Tião), José Carlos da Silva Bala Lopes (Zumbi), Suelem Pereira Dias, Isis Rodrigues Garros.
Gênero: Documentário.
Nacionalidade: Brasil.
Veja o trailer:
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Galeria de Fotos: