Não Olhe Para Trás

Por Rafael Werk

1971. Steve Tilston, um músico americano folk com 21 anos, dá uma entrevista para a revista ZigZag. Na conversa com o jornalista, ele declara que o dinheiro pode afetar o jeito de se compor músicas. Após ler o que Tilston havia falado, John Lennon escreve uma carta para o rapaz. Na carta, Lennon dizia que ser rico não mudava a relação com a música do modo que Tilston pensava. Com o telefone de John junto à mensagem, Steve poderia ter ligado para o beatle e, quem sabe, até ter feito uma parceria com o músico. O problema é que ele só soube da existência da carta 34 anos depois, em 2005.

É nessa história que se inspira Não olhe para trás (Danny Collins). Mas as semelhanças entre realidade e ficção param por aí. Danny Collins (Al Pacino) se vendeu para a indústria e ficou podre de rico. Ao contrário de Tilston, Danny entra numa crise existencial após ler a carta de John. Tocado pelas palavras de seu ídolo, o milionário tenta mudar os rumos de sua vida e carreira: abdica das drogas, volta a compor sua próprias músicas, termina o caso com sua mulher muito mais jovem e parte atrás de uma aproximação com filho que nunca conheceu.

Não olhe para trás trata esses assuntos delicados com uma naturalidade possível somente nas telas. As relações entre Danny e os que estão à sua volta são demonstradas sem profundidade, fazendo o filme transcorrer de maneira tranquila e sem grandes preocupações. Os temas mais sensíveis são logo substituídos por momentos descontraídos e leves, como as canções de sucesso de Danny.

Esse ambiente é preenchido com as músicas de Lennon da fase pós-Beatles. A trilha sonora trás Working class hero (combinando com Tom, o filho de Danny, que se esforça para manter a família), Beautiful Boy (Tom aos olhos de Danny) e Imagine (título que precedeu o original do filme).

O diretor Dan Fogelman nos deixa, após o fim do filme, com a sensação de ter dado uma volta serena num parque, onde o sol não incide forte o bastante para incomodar a vista. Seria injusto, no entanto, dizer que Não olhe para trás não nos provoca em sentido algum. Mesmo esse músico pouco penetrante revela uma triste realidade. O fato do dinheiro abrir ou fechar portas e de ter o poder de comprar até mesmo perdão.

Não Olhe Para Trás (Danny Collins)