Por Kátia Kreutz

“Saber é bom, mas saber tudo é melhor ainda”. A frase, proferida por Tom Hanks, em O Círculo, é um dos principais motes do filme. Em um mundo no qual o conhecimento nunca parece ser demais e o acesso à informação está literalmente na palma de nossas mãos, o longa adaptado do livro de Dave Eggers teria todos os ingredientes para uma trama no mínimo interessante.
Emma Watson interpreta Mae, uma jovem ambiciosa que consegue um disputado emprego em uma empresa de tecnologia, O Círculo. A oportunidade parece boa demais para ser verdade: o salário e os benefícios são incríveis, o lugar é cheio de opções de entretenimento e lazer, com eventos e atividades para criar um senso de pertencimento nos colaboradores. O sonho de qualquer pessoa que já viu imagens dos escritórios do Google, por exemplo.
O presidente da corporação (Tom Hanks) é um sujeito que lembra os descolados fundadores de algumas das gigantes do Vale do Silício, como Apple e Facebook. Com seu jeito afável e descontraído, ele não precisa de muito esforço para conquistar sua audiência, já que a força de trabalho da empresa é basicamente formada por jovens sedentos por novas tecnologias e totalmente dispostos a compartilhar seu dia a dia online.
Com a ideologia de que a privacidade permite esconder coisas erradas e faz com que as pessoas não assumam responsabilidade por seus atos (“segredos são mentiras” se torna um verdadeiro mantra da empresa), O Círculo acaba envolvendo Mae em um novo experimento: transparência total. Ela aceita abrir mão de sua liberdade pessoal e transmitir ao vivo cada minuto de seu dia, uma decisão que afeta negativamente a vida de sua família e amigos.
Visualmente interessantes, tanto a atmosfera futurística da sede do Círculo quanto as inserções de textos e outros detalhes na tela dão ao filme um look moderno, cool. No entanto, a falta de sutileza na história faz com que todos os funcionários da empresa ajam como robôs. Emma Watson consegue transmitir o deslumbramento de trabalhar em um lugar onde sonhos se realizam, mas a falta de questionamento quanto à privação de suas liberdades individuais acaba tirando um pouco a humanidade de sua personagem.
O mesmo acontece com as pessoas com quem Mae interage: seus pais, seu amigo de infância, a colega de trabalho… Todas as relações parecem bidimensionais e nenhuma motivação é explorada. As próprias razões da protagonista para consentir em ceder sua privacidade são desconhecidas. A organização trata seus colaboradores quase como membros de um culto, mas ninguém acha nada estranho ou questiona o que está acontecendo.
Em tempos de socialização digital, em que todo mundo compartilha praticamente tudo na internet, o conceito do filme não traz nada de novo, mas poderia ter sido melhor explorado para levantar problemas reais, como o fato de que as pessoas estão deixando suas próprias vidas de lado para se tornarem “seguidoras”, vivendo as experiências dos outros, ou o fato de que as coisas que postamos no mundo virtual podem ter consequências concretas. Nesse contexto, o longa não tem como escapar de comparações com a série Black Mirror, que aborda os perigos da tecnologia de maneira muito mais envolvente e até assustadora.
A grande falha de O Círculo é que nada de relevante acontece, de fato. Não há mudança, crescimento ou consequências. Embora o tom do clímax seja vitorioso, Mae não se redime de seus erros ou sequer aprende com eles. O filme é uma própria metáfora do oversharing nosso de cada dia nas redes sociais: uma bela fachada para existências vazias, superficiais e sem graça. 
 
o circulo posterO Círculo (The Circle)
Ano: 2017
Direção: James Ponsoldt
Roteiro: James Ponsoldt, Dave Eggers
Elenco principal: Emma Watson, Tom Hanks, Ellar Coltrane, John Boyega, Patton Oswalt, Karen Gillan
Gênero: Drama, Mistério, Ficção Científica
Nacionalidade: EUA
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