Pela Janela é um delicado retrato de uma vida sem muitas perspectivas. Rosália, a protagonista, é a mais antiga operária em uma fábrica na periferia de São Paulo. Sua rotina se resume a acordar, trabalhar, voltar para casa (que divide com o irmão José) e bordar um pouco antes de dormir. Ela é a primeira a chegar no trabalho e a última a sair.
Um belo dia, o diretor da empresa decide que não é mais interessante tê-la como funcionária e Rosália é demitida. Sem visualizar nada mais que possa fazer de sua vida, já que o mercado não é muito acolhedor para pessoas acima dos 60 anos, ela começa a mergulhar em um estado depressivo. Alarmado, seu irmão resolve levá-la consigo a uma viagem de trabalho para Buenos Aires.
O relacionamento entre os dois (interpretados de maneira extraordinária por Magali Biff e Cacá Amaral) é de um companheirismo de poucas palavras, mas de muita beleza em sua simplicidade. Ambos já não são mais jovens e têm apenas um ao outro. A princípio, José sequer é capaz de consolar Rosália, mas a personalidade atenciosa e otimista dele faz com que a irmã perceba que não está sozinha.
A protagonista ganha uma profundidade maravilhosa na interpretação de Magali Biff. Rosália fala pouco, é relutante em aceitar mudanças, carrega muitos medos e angústias. Ela tenta não demonstrar, para não preocupar o irmão, mas se vê perdida e sem saída. É pela música e pelas experiências compartilhadas que os dois acabam conseguindo se comunicar, de alguma forma.
Essa conexão é importante para o desenvolvimento da personagem, mas a maior parte das transformações acontece internamente. No caminho para Buenos Aires, de carro, ela passa a vivenciar coisas novas e à primeira vista até um pouco amedrontadoras. A grandiosidade das Cataratas do Iguaçu faz com que coloque em perspectiva seus problemas. O contato com outra cultura abre seus horizontes. Para uma mulher humilde, acostumada a viver em função do trabalho, perceber que o mundo é muito maior do que aquilo que vê de sua janela é uma descoberta incrível.
Por isso mesmo, diversas vezes durante o filme, Rosália aparece abrindo janelas (na sua casa e nos pequenos hotéis onde ela e o irmão se hospedam). Nessa abertura para o que está além reside uma metáfora poderosa, de alguém que deixa de ser uma mera observadora e passa a ser uma participante. Ela consegue transformar sua tristeza em oportunidade e passa a vislumbrar um futuro possível.
Esse olhar também é para dentro. Em vários momentos, a protagonista é vista através da água ou em reflexos, como se sua própria personalidade lhe fosse um mistério. A viagem para a Argentina é uma jornada de autoconhecimento. “Estou velha”, ela chega a afirmar, antes de compreender que a velhice está na maneira como encara as coisas.
Pela Janela talvez não seja um filme que agrade a todos os tipos de público. É contemplativo, econômico nos diálogos, sem grandes reviravoltas. Quem se aventurar a explorá-lo, no entanto, pode se surpreender com cenas de um realismo e sinceridade comoventes. Em sua obra de estreia no formato longa metragem, a diretora Caroline Leone mostra enorme sensibilidade para as pequenas coisas que fazem, mesmo das existências mais simples, algo cinematográfico.