Ruth Bader Ginsburg, juíza associada da Suprema Corte Americana, tem sido foco de atenção há alguns anos. Considerada representante da ala mais liberal do direito nos EUA, Ruth sempre defendeu casos relacionados à equidade de gênero. Quando aceitou integrar a Corte, suas opiniões dissidentes com frequência estamparam notícias e, mais recentemente, viralizaram nas redes sociais. Hoje, seus pronunciamentos atraem milhares de pessoas e seu rosto estampa camisetas, ao lado de frases como “Notorious RBG” ou “You can’t spell truth without Ruth”. Sua história se transformou em livros, um documentário que concorreu ao Oscar 2019 e, agora, chega às telas em versão dramatizada.

Suprema, dirigido por Mimi Leder, repassa o início da trajetória de Ruth (Felicity Jones), os desafios que a jovem enfrenta na faculdade, o início de sua carreira e o primeiro caso que defende diante de um tribunal. A trama também enfoca a relação de Bader com o marido, Martin Ginsburg (Armie Hammer), e a filha, Jane (Cailee Spaeny).

Ao seguir à risca a cartilha dos filmes biográficos, Suprema concede destaque às barreiras diárias que Ruth enfrenta por ser mulher. Na faculdade de Direito de Harvard, o reitor Erwin Griswold (Sam Waterston) pergunta por que ela “decidiu ocupar a vaga que iria para um homem”. Já nos tribunais, mentores lhe dizem que ela deve apresentar o caso sorrindo para conquistar os juízes, regra essa que não se aplica aos homens. Esse tipo de comportamento é presente até mesmo entre os amigos liberais de Bader, que contestam suas ideias de equidade. Tais situações demarcam como o Direito é uma área machista, fato que não mudou tanto desde os anos 1960 e que é compartilhado por diversos campos de atuação.

Para acentuar a frequente oposição de conceitos, o título trabalha bem com os contrastes. Em certo momento, vemos um grupo de homens contemplarem indignados a ideia de uma organização social onde as mulheres sejam tratadas com igualdade. Eles estão em uma sala escura, semelhante a uma caverna, numa alusão vívida ao mito da ignorância de Platão. Em contraponto, temos o lar de Ruth, bem iluminado e caloroso, onde o marido cozinha enquanto ela trabalha. Um verdadeiro exemplo de equidade próspera.

Outro paralelo interessante é estabelecido entre cenas próximas da abertura e do final do longa. No começo, Ruth é engolfada por um mar de homens apressados e os elementos femininos que lhe caracterizam aparecem em detalhes rápidos. No final, ela caminha sozinha e calma, mostrando que venceu, conquistou seu lugar e agora desfruta de um respeito merecido.

Todas essas situações servem para construir a personagem de Ruth como um modelo de justiça e verdade. O roteiro, no intuito de enfatizar esse ponto, pesa a mão no drama, sobretudo no relacionamento familiar. O apoio que Bader recebe de Martin é essencial para que possa realizar seus sonhos. Ao mesmo tempo, o ativismo da filha serve como combustível para que ela não desista de sua jornada. Porém, os diálogos entre os Ginsburg soam pouco convincentes para quem já ouviu a notória RBG falar. No ápice do terceiro ato o texto se redime e volta a inspirar o espectador, ainda que grande parte disso seja graças ao carisma que emana da protagonista.

Nesse sentido, é preciso que elogiemos as escolhas competentes de Feilicity Jones, que reproduz com maestria os trejeitos da verdadeira Ruth. O trabalho da equipe de figurino também se destaca e auxilia a elaborar camadas de significado. As roupas de Bader, majoritariamente azuis, denotam uma personalidade racional e analítica. Já as golas pronunciadas, presentes em blusas e casacos, são um prenúncio do colarinho característico que a juíza usa sobre suas vestes na Suprema Corte.  A câmera, que por vezes caminha atrás de Ruth, mostra outros detalhes clássicos de sua figura, como as luvas que protegem as mãos ou o lenço que amarra os cabelos.

Por usar elementos padrões para elaborar sua narrativa, Suprema não tem uma forma que surpreende. Seu destaque fica por conta de Ruth Bader Gisnburg. Se o longa tem uma mensagem inspiradora é porque ela é inspiradora. RBG é a voz da verdade que tanto precisamos hoje. Ela é a responsável por conquistar o espectador e segurá-lo até o fim. Sua luta pela equidade de gênero é tão atual hoje quanto foi nos anos 1960 e por isso merece ser propagada, seja nos tribunais, seja nos livros, seja nos filmes.

 

*Em tempo, vale assistir também ao documentário RBG. O filme perpassa toda a vida de Ruth, mas dá maior destaque para seu trabalho a serviço da Suprema Corte americana. É apenas necessário.

Suprema

 

Ano: 2018
Direção: Mimi Leder
Roteiro: Daniel Stiepleman
Elenco principal: Felicity Jones, Armie Hammer, Justin Theroux, Sam Waterston, Kathy Bates, Cailee Spaeny
Gênero: ​Drama, Biografia
Nacionalidade: EUA

Avaliação Geral: 3