Em 2013, o Wall Street Journal publicou uma matéria sobre um grupo de amigos da cidade de Spokane, nos EUA, que há 23 anos, jogava um jogo de pega. O objetivo inicial era o de manter contato, mas com o tempo a prática se tornou um ritual curioso. Durante um mês por ano, os nove membros do grupo viajavam de uma ponta a outra do país com o único intuito de passar o bastão para outro colega e gritar “’tá com você”. Para isso, valia de tudo: desde se fantasiar de velhinha num estacionamento até se esconder no porta-malas do vizinho. À medida que o tempo passava, as esposas foram entrando no jogo e funcionavam como iscas para incrementar as armadilhas.
Agora, essa história chega aos cinemas no filme Te Peguei, dirigido por Jeff Tomsic. Após algumas adaptações, nele vemos Hoagie Malloy (Ed Helms), Bob Callahan (Jon Hamm), Randy Chilli (Jake Johnson), Kevin Fumaça (Hannibal Buress) e Jerry Pierce (Jeremy Renner) se reencontrarem para dar continuidade ao aguardado jogo. A motivação geral dos competidores é conseguir agarrar Jerry, que se mantém invicto por nunca ter sido pego. O elenco conta ainda com Annabelle Wallis, que interpreta Rebecca Crosby, jornalista do periódico de Wall Street, Isla Fisher como Anna Maloy, esposa de Hoagie, Leslie Bibb como Susan Rollins, esposa de Jerry e Rashida Jones, que dá vida a Susan Rollins, um interesse amoroso de mais de um membro do grupo.
Com um humor bem pastelão, Te Peguei se mostra desde o início a escolha certa para quem gosta de tramas leves e descompromissadas. O roteiro simples e os diálogos diretos garantem uma compreensão plena dos acontecimentos, bem como um conhecimento prévio dos momentos finais. Por vezes, a graça das cenas se dá pela repetição de palavras, técnica bastante utilizada em sitcoms. Em outros momentos, as risadas são originadas das sequências de ação, sobretudo as que envolvem Jerry. Estas são desaceleradas e o público escuta seus pensamentos, no melhor estilo sherlockiano. Entre os maiores méritos do texto está a dúvida lançada próximo ao final do terceiro ato, que deixa o público genuinamente curioso.
Tendo um elenco tão grande e estrelado em mãos, o diretor constrói os personagens destacando uma qualidade específica em cada um. A jornalista representa o espectador, por fazer perguntas e receber explicações que nos auxiliam a entender o funcionamento do jogo. Hoagie, que ganha ares de protagonista, é o inseguro, Callahan é o confiante, Chilli é o drogado e Fumaça o neurótico. À medida em que somos apresentados a cada um dos amigos, o filme vai construindo a aura de Jerry. Apesar de ser assunto constante, ele só aparece depois de 30 minutos e se mostra o membro mais analítico. Esse estilo de engrandecimento do personagem antes que este dê as caras é uma artimanha de roteiro que serve para aumentar as expectativas do público e data do período clássico do cinema.
Mesmo o filme retratando a brincadeira entre um grupo de amigos, quem realmente rouba a cena são as mulheres. Isla Fisher está ótima como a esposa passivo-agressiva que se empolga demais na competição, enquanto Leslie Bibb interpreta uma mulher sem escrúpulos, que joga baixo para enganar os competidores de seu marido. Comparado a elas, Wallis e Jones estão apáticas em seus papeis coadjuvantes.
Apesar do tom de brincadeira, Te Peguei possui uma mensagem positiva sobre manter viva as amizades e, com elas, a criança interior em cada um de nós. Várias vezes os personagens citam a máxima de Bernard Shaw (no filme comicamente atribuída a um dos presidentes dos EUA): “Você não para de brincar porque fica velho, você fica velho porque para de brincar”. Mesmo que seja estruturalmente raso, o longa agrada por reforçar a importância dos amigos e do lado divertido que aflora na companhia deles. Para divertir a gangue e manter o contato vale qualquer coisa, inclusive jogar pega por mais de 20 anos.
Confira aqui a matéria sobre o jogo real no The Wall Street Journal.