Por Wallacy Silva
Ao contar a saga dos irmãos Villas-Bôas na expedição Roncador-Xingu, o filme de Cao Hamburger caracteriza-se como um épico que procura assumir um papel político, reconstruindo esse episódio da história brasileira e alertando a população sobre questões atuais, pois parece iminente o risco do nosso país de cometer o mesmo erro cometido há anos, colocando o desenvolvimento financeiro à frente das questões indígenas e ambientais. Na ânsia de atingir o grande público, o filme acaba exagerando no didatismo e se perdendo no enorme recorte histórico retratado, o que acaba por ofuscar seus méritos.
Um dos grandes pontos positivos do Xingu é a interpretação. O cinema brasileiro vem se destacando no trabalho com não atores, e ficou nas mãos de Francisco Accioly a produção do elenco indígena do longa. O resultado é surpreendente, as atuações dos personagens indígenas não trazem um pingo de superficialidade, pelo contrário, agregam muito ao filme, e não destoam das atuações dos já experientes (e competentes) Caio Blat (Bróder), João Miguel (Estômago) e Felipe Camargo (Jogo Subterrâneo).
A fotografia também é um ponto forte. Pouco ousada, é bem verdade, mas que transmite pra tela a dureza da caminhada dos personagens através das cores e da alta luminosidade, que dá a impressão de calor ininterrupto. Encontra êxito também nas composições que relacionam, no mesmo quadro, personagens e paisagens (belíssimas, por sinal). Uma cena que chama atenção é a do flerte entre Leonardo (Blat) e uma índia. Passa-se de noite e é completamente guiada apenas pela luz de uma lanterna. A movimentação dos personagens (e da lanterna!) transforma a cena em uma das mais interessantes e belas do longa.
Mas nem tudo são flores na produção e a principal deficiência é narrativa. A começar pela introdução dos personagens, que é inexistente. Somos introduzidos à expedição, mas quanto aos personagens sabemos somente seus nomes. Isso enfraquece muito a narrativa e vamos conhecer a personalidade dos protagonistas depois de um bom tempo de filme. No final seguimos sem saber de onde eles vieram, quem eles eram, e ficamos apenas com o que eles fizeram pelos índios.
O filme é, ainda, guiado por uma narração de um dos personagens, abrindo mão de soluções mais criativas para conduzir a história. Com um recorte de mais de 40 anos de fatos, os episódios ficam espaçados e de certa forma desconexos, desorgânicos na composição. Abusa dos letreiros com “1 ano depois”, “2 anos depois”, situando o espectador no tempo. Como um filme com caráter épico, não seria nenhum absurdo se estender por mais tempo para ganhar em qualidade, mas acaba esbarrando novamente na clara intenção de ser um filme comercial.
No final o narrador desaparece e o filme começa a fluir melhor, mas aí já é tarde demais. Depois de concluir a narrativa o longa assume um caráter documental, e nos deparamos com imagens reais da construção da Transamazônica e com uma série de informações sobre a reserva indígena do Xingu. O filme vem para mostrar como a participação dos Villas-Bôas foi importante e para compreender como se chegou à situação que se encontra hoje. A reflexão fica a cargo do espectador: vale a pena colocar em cheque a maior reserva indígena do mundo depois de toda a luta dos irmãos?
Ano: 2011
Diretor: Cao Hamburger
Roteiro: Cao Hamburger, Elena Soarez, Anna Muylaert.
Elenco Principal: João Miguel, Felipe Camargo, Caio Blat, Maiarim Kaiabi, Awakari Tumã Kaiabi, Adana Kambeba, Tapaié Waurá, Totomai Yawalapiti, Maria Flor, Augusto Madeira, Fabio Lago.
Gênero: Drama.
Nacionalidade: Brasil.
Veja o trailer:
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