Por Ana Carolina Diederichsen
Num clima descontraído e leve, as principais atrizes do filme se reuniram com diretores e produtora musical para um bate papo com a imprensa. Esse clima reflete a liberdade com que a equipe estava habituada nos sets de filmagem. Todas as atrizes demonstraram sentir-se muito a vontade na presença de um diretor cujo currículo intimidaria até mesmo os atores mais experientes. Exemplo disso foi o comentário de Daniel filho, diretor de diversas obras de extrema importância no país “Hoje, por causa de vocês (jornalistas), eu encontrei umas senhoritas, todas arrumadas, diferentes das meninas com que eu filmei. Mal reconheci minhas meninas.”
Daniel Filho conta o percurso que trilhou com “Confissões de Adolescente” até que o livro de Maria Mariana virasse um filme com lançamento nas férias de verão. Há cerca de 20 anos, Daniel assistiu ao segundo dia da peça homônima. “Fiquei impactado e emocionado com o que acabara de assistir. Saí do teatro empolgado e com lágrimas nos olhos. Estava afastado da Rede Globo e queria trabalhar com produção independente, pois acreditava que deveria existir a terceirização e descentralização da produção.” Optou então, por tomar aquela história como o ponto de partida para iniciar esse projeto.
Como essa prática ainda era pouco comum, enfrentou diversas dificuldades para levar o seriado ao ar. A primeira temporada inteira foi rodada com dinheiro do próprio diretor, que levou o episódio piloto em todas as emissoras de televisão, que sempre rejeitavam a ideia, até que a TV Cultura aceitou exibir o material. O sucesso e aceitação do público foi tamanha, que a série foi exportada e teve financiamento de uma emissora francesa para a produção da segunda temporada. Já na época surgiu a oportunidade de adaptar a obra para o cinema, mas a indústria cinematográfica no Brasil estava muito debilitada e como havia investido todo seu dinheiro na produção da série, o diretor optou por vender os direitos autorais.
Quando os direitos de produção do longa caducaram, sem que o projeto fosse realizado, a Sony, detentora dos mesmos, ofereceu-os mais uma vez à Daniel Filho que diante de um expressivo aquecimento do mercado cinematográfico no país, aceitou o desafio. Desde então, vem se dedicando por mais de 4 anos na definição do formato e linguagem do filme. O roteiro passou por algumas versões, até que Matheus Souza (que dirigiu uma das montagens para o palco) formulou a versão final. A principal dificuldade enfrentada foi adaptar os conflitos que, em essência, são os mesmos de vinte anos atrás, à nova realidade da geração atual. Para isso, contaram uma extensa pesquisa realizada por empresa especializada a fim de encontrar o tom correto para os dilemas apresentados. Daniel reflete sua preocupação com isso ao dizer: “Houve uma mudança de comportamento muito grande nestes 20 anos. Mas não houve uma mudança de sentimentos nas adolescentes. A sociedade pode ter ficado mais tolerante ou mais compreensiva com o comportamento sexual de uma garota de 15 anos, ela pode ter mais liberdade em casa ou apoio, mas não mudou na menina o sentimento dela a respeito disso.”
Cris D’Amato, co-diretora do filme, que já havia trabalhado com Daniel Filho em outras oportunidades, reforça: “Um dos principais méritos do seriado, é que ele falava abertamente. Houve a preocupação de manter esse papo aberto, sem censuras ou meias palavras. Se você vai falar de adolescentes, não pode se privar de falar de tudo. A gente não pode não falar as verdades do adolescente. Essas questões são cotidianas, muito presentes. Para construir uma relação, você não pode se censurar. E no filme, não censuramos nada. Ouvimos os adolescentes, trabalhamos com jovens, que conversam, convivem com essas questões.” Ela conta, ainda, como foi o processo de seleção de elenco. “A escolha do elenco passou por diversos testes. E o elenco original (Maria Mariana, Deborah Secco, Daniele Valente e Georgiana Góes) é uma participação fundamental no filme. Não dava pra fazer esse filme sem a participação delas. Elas foram o ponto de partida dessa história.” A importância do quarteto original da série é tamanha, que como forma de homenagem, as atrizes foram creditadas como “participações afetivas”. Além delas, diversas outras já vivenciaram as personagens no teatro (inclusive algumas que compõem o elenco do filme), pois a peça já teve diversas montagens diferentes ao longo dos muitos anos em que ficou em cartaz.
A direção, no que tange aos atores, teve uma proposta diferente: fizeram uma leitura inicial do roteiro, ainda na fase de pré-produção, mas os atores não puderam ficar com o texto. No dia da gravação, recebiam um briefing da cena e não o texto em si. Trabalhavam apenas as relações envolvidas e as reações das personagens diante do exposto. A partir disso, improvisaram falas e reforçaram o entrosamento, fazendo com que os diálogos ganhassem mais naturalidade. Como resultado, a construção das personagens teve uma contribuição muito grande das atrizes. Sobre essa experiência, que deixou o elenco bastante intrigado, Daniel define: “O adolescente, na verdade, fala o que vem na cabeça e era exatamente isso o que nós queríamos, que aquele texto fosse bem fresco, para que elas pudessem contribuir com o que estivesse na cabeça delas.”
Um dos principais desafios, de acordo com o diretor, foi em relação ao papel da Malu Rodrigues, que aborda a perda da virgindade. Ele queria fazer isso de maneira real, atual e delicada. Como diretor de O Primo Basílio, A Vida Como ela é, entre outros trabalhos para o publico adulto, já dirigiu incontáveis cenas de sexo ou de elevado teor erótico. Mas a cena em que Alice perde a virgindade, especificamente, o preocupou muito, no sentido do seu próprio desconhecimento da realidade dos jovens atualmente, e da necessidade de dar conforto e tranquilidade para os 2 jovens atores. Com muita liberdade, Daniel diz que é claro que teve uma primeira vez, mas foi em outra época, na metade do século passado, então precisava se atualizar, e perguntar como hoje se desenrola uma primeira vez. Malu confirma que Daniel foi muito delicado na cena e que isso foi importante para que ela não sentisse inibida.
Sobre Cris D’Amato, que, além de sua participação na produtora Lereby, atualmente dirige a série “Pé na Cova” na Rede Globo, Daniel afirma: “Estou passando o meu bastão para ela. Um dos motivos de eu ter convidado a Cris para co-dirigir está ligado ao meu envolvimento emocional com o projeto. Afinal, eu dirigi 37 episódios e produzi mais 15. Trabalhei em 52 episódios do ‘Confissões’ para a TV, então me sentia esgotado, com muito receio de me repetir. Eu e a Cris trabalhamos juntos há tanto tempo, que foi uma escolha natural. O meu entendimento com ela é total, estou me sentindo até como os Irmãos Cohen, um fala, o outro entra, temos uma ligação muito boa.”
Antes de encerrar a coletiva, Daniel traçou um breve panorama sobre o cinema nacional e a forte presença de comédias comerciais em detrimento de filmes mais elaborados. O diretor, que levou também ás telonas filmes como Se eu fosse você, entre outros do gênero, tem uma opinião marcante sobre a função da comédia. Para ele, fica nítido que a comédia é quem atrai o publico aos cinemas, sobretudo nas produções nacionais. Ainda existe certo preconceito, de origem histórica, do brasileiro em relação ao nosso cinema, devido à baixa qualidade de produções em um longo período de ostracismo. A comédia tem sido a responsável por trazer novamente o público às salas de cinema. E ela tem a vantagem de ser competitiva em relação ao cinema enlatado americano, pois ao falar da nossa realidade de maneira bem humorada, cria uma identificação com o público que os filmes estrangeiros jamais conseguirão.
A comedia faz com que o publico afastado do cinema volte para as salas de exibição, reconhecendo na tela o seu humor, a sua brincadeira. No Brasil, desde os primórdios do cinema falado já surgiu o Genésio Arruda, Oscarito, Mazzaropi, Renato Aragão… Teve um período em que nosso cinema sumiu, e quando voltou, alguns comediantes passaram a ocupar esse lugar do comediante popular. Portanto esse é um gênero que sempre fez sucesso e sempre fará. Mais do que isso, a comédia sustenta o cinema, não só no Brasil. Não é demérito algum, muito pelo contrario. O comediante popular atravessa fronteiras e isso não vai tirar o cinema brasileiro do eixo. Recebo com muito carinho e aplauso esses novos comediantes de destaque que estão ocupando um lugar no cinema nacional que há muito estava adormecido”, completa Daniel.
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