O Festival Varilux de Cinema Francês chega à edição 2018, mantendo tradições, como a Mostra de Realidade Virtual (desta vez com Masterclass com o cineasta Fouzi Louahem) e trazendo novidades (pela primeira vez curtas-metragens farão parte da programação e encontros profissionais junto ao LAB de escrita de roteiros também). Destinado à promover o cinema francês no Brasil, esse ano contou com a parceria do SESC e vai exibir em sua programação os filmes da mostra em 90 cidades, sendo que 30 delas são cidades menores, onde o cinema francês quando consegue chegar, chega com muita dificuldade, com centenas de sessões gratuitas, a ideia é conquistar cada vez mais uma democratização do festival.
Além de manter a proposta de difundir o patrimônio cultural francês e celebrar suas particularidades através da curadoria dos filmes, a seleção deste ano contou também com escolhas de teor político e levou em consideração dois aniversários comemorados em 2018: o centenário do fim da primeira guerra mundial e o quinquagésimo aniversário de maio de 68 (movimento revolucionário estudantil e operário da França).
Para comemorar esse último, como é de costume do Festival escolher um clássico para ser exibido em meio aos lançamentos, foi escolhido o filme Z de Costa-Gavras, de 1969. A trama principal gira em torno de um ato que aconteceu na Grécia, no início da década de 1960: o caso Lambrakis (Yves Montand), em que um político liberal foi assassinado de forma a parecer um acidente. A investigação sobre a morte foi cercada e encoberta pela corrupção da polícia e exército. Lançado quando os ânimos da Revolução ainda estavam em ebulição, o filme inicia com a seguinte advertência:
Qualquer semelhança com eventos e pessoas da vida real não é coincidência – é intencional.
Na coletiva de imprensa de abertura do festival estiveram presentes diretores e atores na delegação francesa: O ator Jérémie Renier, ator de O Amante Duplo e co-diretor de Carnívoras junto com Yannick Renier, a atriz Zita Hanrot, também de Carnívoras, o diretor Fabien Gorgeart e a atriz Clotilde Hesme do filme O Poder de Diane, o diretor Nabil Ayouch e a atriz e roteirista Maryam Touzani do filme Primavera em Casablanca e o ator Finnegan Oldfield de Marvin, bem como os diretores do festival, Emmanuelle e Christian Boudier, o diretor da Aliança Francesa, Olivier Debray, o diretor comercial da Essilor/Varilux, Mauricio Confar, e a atriz Letícia Spiller, escolhida para ser a primeira embaixadora da marca Varilux no Brasil.
Algumas discussões foram trazidas ao debate, como o fato da censura em torno do filme anterior do diretor Nabil Ayouch Muito Amadas, e de como sua nova produção Primavera em Casablanca foi recebida no país. Nabil defendeu que a censura é um aparato ridículo e sem sentido, visto que esse filme em específico foi copiado em versão pirata e vendido à exaustão. Defende que o público que o interessa é a juventude perdida, desorientada, a minoria sexual e religiosa e as mulheres, dizendo que são essas pessoas que vão em massa ver seus filmes no cinema. Disse acreditar muito na força penetrante das imagens, principalmente num país como o Marrocos, onde 40% da população é analfabeta:
É preciso acreditar que as imagens têm poder de penetrar o coração, os braços e os espíritos.
No encontro falou-se ainda muito sobre a visibilidade e o empoderamento feminino no cinema e de como movimentos como o #MeToo estão exercendo influência nessa nova era do fazer cinematográfico. As atrizes Clotilde Helme, Zita Hanrot e Maryan Touzani (O poder de Diane, Carnívoras e Primavera em Casablanca, respectivamente) foram personagens centrais na discussão e falaram sobre suas (felizes e bem-sucedidas) experiências nos filmes que vêm trabalhando.
Maryan falou um pouco sobre sua experiência enquanto mulher no Marrocos e de como sua personagem no filme consegue ser um espelho do seu real cotidiano no país, de como consegue transferir verdade para o papel que escreveu junto com o diretor Nabil, e de como através de Salima (sua personagem no filme) pôde trazer à luz e enfrentar coisas que ela mesma reivindica em sua vida real. Declarou acreditar na força de escolher e defender um lado em um papel, na extrema importância da escolha por qual história contar, ainda mais no momento em que vivemos e finalizou:
Ser mulher é lutar cotidianamente para poder ter o direito de existir no cotidiano, assim como os homens existem.
Cabe ressaltar que apesar de selecionar e exibir filmes com personagens femininas fortes (papéis inclusive sustentados pela competência das atrizes convidadas) a curadoria do festival ainda não seguiu o que parece ser uma tendência positiva entre festivais mundiais em aumentar o número de diretoras mulheres em exibição no evento, são 19 homens contra apenas 2 mulheres. Faltam filmes que tenham sido dirigidos por elas ou é só uma falta de oportunidade sustentada pelo próprio Festival Varilux?
Confira a programação completa do Festival.