Por Gilberto Varis

Tarantino não presta apenas uma homenagem ao bang bang à italiana, ele honra o western spaghetti com um dos filmes mais poderosos já realizados do gênero. A abertura do filme ao som da música “Django” de Luis Bascalov, nos remete ao clima árido do filme homônimo de Sergio Corbucci, do qual a música também foi tema e aos poucos somos introduzidos à historia, ao Dr. King Schultz e a sua busca: Django e o que ele sabe.

Somos também reapresentados ao humor ácido do diretor logo nos primeiros diálogos, nos quais Christopher Waltz personifica um Dr. Schultz irreverente, carismático e misterioso. Ele exerce sobre Django uma imagem de tutor, se sente responsável pelo homem que ele libertou, esse é um dos grandes trunfos da dupla Waltz/Fox, a relação semi-fraternal entre os personagens. Em Bastardos Inglórios, Hans Landa é aquele vilão cujo charme está exatamente no fato de ele olhar para as pessoas como se soubesse de todos os seus segredos mais íntimos. Já o do Dr. Schultz é diferente, ele olha como se nunca soubesse o que vai acontecer, mas que o quer que aconteça, ele vai estar do lado de Django.

Um adendo sobre a trilha sonora: podemos conhecer um pouco mais sobre o passado de Schultz prestando atenção à música Lo Chiamavano King, que toca em vários momentos. Apenas detalhes. Vale também destacar ainda uma das cenas mais aterrorizantes, onde dezenas de homens com tochas nas mãos, sacos brancos na cabeça, cavalgam colina a baixo para encurralar Django e Schultz, e Tarantino acaba dando uma aula ao subverter completamente o clima desta cena.

Karry Washington brilha como nunca. Broomhilda é a princesa presa no alto da montanha e Django, o cavaleiro de armadura reluzente que vai fazer de tudo pra resgatá-la. A primeira cena em que vemos o casal, um flashback do protagonista fugindo com sua amada, pode ser considerada uma das mais bem montadas em toda a carreira do diretor. Tudo funciona entre Karry e Jamie, grande parte da beleza e do diferencial de Django Livre está aí, essa historia não é só sobre uma vingança, mas também sobre um resgate. É a história de um homem apaixonado que busca a liberdade da mulher amada, e é impossível, literalmente, não torcer por Django e Schultz, a cada cavalgada, a cada acorde da música incidental de Ennio Morricone, a cada cena a torcida só aumenta mais e mais. Em Jackie Brown Tarantino esboçou um romance entre Jackie, persongem de Pam Grien e Max, de Robert Froster, agora ele nos oferece, pela primeira vez em sua carreira, uma grande história de amor.

Spike Lee criou polêmica ao criticar o filme, sem nem mesmo ver, falando que a escravidão nos Estados Unidos não foi um faroeste de Sergio Leone. Tarantino utilizou-se da violência gráfica pra mostrar o quão retrógrados e cruéis eram os pensamentos naquele período .

O mais repulsivo de todos os personagens é o monsieur Calvin Candie, o senhor de escravos de Leonardo DiCaprio, Calvin é aquele menino mimado que por diversão realiza brutais lutas entre escravos, os mandingos. E é com esse pretexto que Django e Schultz chegam à fazenda, onde a tentativa do resgate de Broomhilda começa. Assim que chegamos à fazenda de Calvin Candie, presenciamos uma animalesca luta entre dois escravos, sendo um deles do personagem de Franco Nero, o Django original do filme de Sergio Corbucci. Nessa cena vemos uma das várias falas do filme que instantaneamente entraram para o panteão de falas memoráveis na história do cinema. É aí que Django soletra seu nome e com a marcante frase: “O D é mudo”.

Depois de algum tempo, finalmente conhecemos Stephen (Samuel L. Jackson), o escravo doméstico de Calvin, descrito pelo próprio Tarantino como o “negro mais safado da história do cinema”. Stephen inclusive, é o gatilho para todo o grande clímax do filme, consegue ser mais detestável que o próprio Calvin e, ao mesmo tempo, é capaz de causar um efeito cômico com algumas de suas falas.

No grande clímax do filme, ouvimos a música “Unchained”, remix das músicas The Payback e Untouchable de James Brown e 2Pac, nessa cena Django mostra ao que realmente veio. Jamie Foxx protagoniza uma das sequências mais espetaculares da história, não só por sua grandiosidade, mas pela função narrativa. Todos os elementos da cena se unem de maneira ímpar. Quentin Tarantino não apenas põe o dedo na ferida ao falar de uma página negra na história americana, ele a escancara para todos vermos os horrores da escravidão. No final do longa, ele nos fala o que Django realmente é, como ele concebeu o personagem, com ajuda da  música tema do clássico “Eles o chamavam de Trinity”. Django é o cara de quem a cidade inteira fala, a gente pode até achar que ele é um cara cansado, sempre na dele, mas você muda de ideia quando o conhece… “He’s the top of the West, always cool, he’s the best.”
Obs: Para os mais atentos, tem uma sutil homenagem ao Morgan Freeman.

 

Cinermascope---Django-Livre-PosterDjango Livre (Django Unchained)

Ano: 2012

Diretor: Quentin Tarantino.

Roteiro: Quentin Tarantino.

Elenco Principal: Jamie Foxx, Cristoph Waltz, Leonardo DiCaprio, Samuel L. Jackson.

Gênero: Faroeste.

Nacionalidade: EUA.

 

 

 

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