Por Aline Fernanda

 

Histórias que só existem quando lembradas conta a historia dos moradores de Jotuomba, uma cidade há muito esquecida. A rotina do local é quebrada quando a jovem Rita (Lisa E. Fávero) chega a cidade e desencadeia uma série de embates.

Os personagens entram em conflito com a chegada do novo, com a quebra da rotina. Um dos temas mais marcantes do filme é a morte e a preparação para ela, morte esta presente em todo lugar: no cemitério com o cadeado, na lembrança do marido morto de Madalena (Sonia Guedes), na igreja onde tem uma lista das pessoas mortas, até mesmo na juventude tem um pouco de morte.

O longa é marcado pela dualidade. Velhice e juventude, o novo e o velho (máquina fotográfica higtech e a feita de lata), cidade e campo, o que causa estranheza e questionamentos quanto ao que se está vivendo e o que já foi vivido. Madalena questiona Antônio (Luiz Serra) sobre o que ele acha dos jovens e se ele a considera velha.

Cada morador tem sua função na cidade; Madalena faz o pão, Antônio faz o café e vende o pão, além de sediar os almoços da comunidade nos fundos do seu armazém, mostrando uma relação simbiótica e declarando que todos são essenciais para a vida que levam. Rita não tenta mudar nada e nem ninguém, de inicio parece indiferente com o que está acontecendo, ao longo do filme se adapta a realidade dos moradores, na qual se integra e é integrada.

“Aqui a gente se esquece de morrer”, é o que Antônio dono do armazém diz a Rita quando a jovem questiona o motivo de não registrarem novas mortes na parede da igreja. O cemitério trancado é a simbologia do esquecimento da morte, como se deixa-lo assim a afastasse dos moradores, impedindo assim, que levasse mais alguém.

Julia Murat fez uma pesquisa de dois meses na região do Vale do Paraíba, o que resultou no documentário Dia dos Pais (2008). Fazendo entrevistas e acompanhando o dia a dia das pessoas que lá vivem e já fizeram parte da história do local no século XX, quando o Vale do Paraíba conhecido como “Princesa do Brasil” era a região mais rica do país por estar ligada ao Ciclo do Café. Depois dos anos 1930, grandes fazendas faliram e as cidades se tornaram quase fantasmas. Hoje, o que restou desses lugares é apenas as lembranças e a decadência. Horas de entrevistas que foram gravadas e transcritas, depois de uma seleção se transformaram em diálogo dos moradores de Jotuomba.

O longa é marcado pelo seu ritmo lento, como se o tempo na cidade estivesse estancado; a diretora preferiu se valer de imagens ao invés de simplesmente narrar os acontecimentos. Muito significado se deprende das entrelinhas, e se faz necessário adotar um olhar contemplativo do espectador, é necessário de entregar ao que sevê na tela. Importante destacar a incrível fotografia, que permite a aproximação do espectador com o longa.

A rotina do local é retratada através da repetição de eventos e situações, como por exemplo, a rotina de Madalena em levantar, fazer seus pães, andar pelos trilhos do trem desativado. O que é possível graças à montagem de Marina Meliande (A Fuga da Mulher Gorila) que também faz bom uso das fotos de Rita integrando a personagem a história.

Apesar de ser seu primeiro longa, Julia Murat tem experiência como assistente de direção, fotografia, montagem. E em 2006 teve seu trabalho reconhecido quando ganhou o prêmio de Melhor Montagem no Festival de Goiânia (“Olhar Estrangeiro”). Histórias que só existem quando lembradas antes de estrear no Brasil, foi lançado no exterior e além de participar de diversos festivais, ganhou diversos prêmios, dentre eles, Melhor Filme e Melhor Atriz no Festival de Dubai.

O longa é eficiente ao falar de assuntos normalmente pesados de uma forma sutil. Traz quem assiste para dentro da trama o fazendo sentir junto com os personagens a cada take. Daqueles filmes que quando acabam você permanece com o que viu na cabeça por um bom tempo.

 

Cinemascope - Historias que só existem quando lembradas-PosterHistórias que só existem quando lembradas

Ano: 2011

Diretor: Júlia Murat

Roteiro: Julia Murat, Maria Clara Escobar e Felipe Shol.

Elenco Principal: Lisa Fávero, Sonia Guedes, Ricardo Merkin.

Gênero: Drama

Nacionalidade: Brasil

 

 

 

Assista nossa entrevista com a diretora Julia Murat:

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Veja o trailer:

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Galeria de Fotos: