Existe um questionamento que permeia a mente de todos aqueles que já passaram dos 20 anos: “Estou velho(a)?” A resposta para essa pergunta é simples: Se você assistiu A Pequena Sereia (The Little Mermaid, 1989) recentemente e concordou com o pai de Ariel, significa que sim. Quem diria! Um filme que era atual na minha infância hoje é considerado “antigo”. E quem diria! Já existem rumores sobre uma refilmagem em live action deste clássico. Seria para atualizar ou para fazer igual?

Já que o filme é “antigo”, nem vou me importar em fazer um pequeno resumo da história, não é novidade para ninguém. Porém, devo avisar que haverá spoilers da obra original que inspirou este filme.

Bastidores

Como abordei mais detalhadamente os bastidores do estúdio Disney neste período em meu texto sobre Despertando A Bela Adormecida (Waking Sleeping Beauty, 2009), o departamento de animação estava sob nova direção, Jeffrey Katzenberg, que não tinha experiência com animação, o setor que solidificara o estúdio corria o risco de fechar as portas. Era janeiro de 1985 e o estúdio buscava ideias para novos filmes e para isso, todos deveriam apresentar cinco propostas numa reunião (pitching), o animador Ron Clements sugeriu adaptar uma história que havia lido há pouco tempo, A Pequena Sereia, escrito por Hans Christian Andersen em 1837, com algumas alterações. Ele escreveu um argumento com os principais pontos da história, apresentou, mas não foi aceito, pois o estúdio em parceria com a Touchstone Pictures estava produziu Splash: Uma Sereia Em Minha Vida (Splash, 1984), Katzenberg temia que a comédia com Tom Hanks e Daryl Hannah ofuscasse a animação. Outra sugestão que Clements fez naquela reunião foi a adaptação de A Ilha Do Tesouro de Robert Louis Stevenson, mas com naves e alienígenas, essa ideia também foi descartada por questões técnicas. Porém, no dia seguinte Katzenberg voltara atrás em sua escolha, A Pequena Sereia entraria em produção, o próximo passo era montar a equipe principal.

Ron Clements e John Musker se propuseram a cuidar da história, mas ainda faltava algo, já que iriam retomar a tradição dos clássicos contos de fadas após 26 anos, era preciso alguém com expertise musical, para criar músicas que ficariam marcadas na mente do expectador, assim, trouxeram Alan Menken e Howard Ashman, ambos haviam trabalhado juntos na peça musical A Pequena Loja Dos Horrores (1982). Ashman, por sua vez, trouxe Jodi Benson, com quem já havia trabalhado antes, para ser a voz de Ariel.

De cima para baixo: (Foto 1) Ron Clements à esquerda, Jodi Benson no meio, e John Musker à direita; (Foto 2) Howard Ashman à esquerda, Alan Menken à direita.

Referência para a animação

Não era apenas a tradição das histórias de contos de fadas que o estúdio estava ressuscitando, para trazer mais dinamismo à produção e economizar tempo na animação – em meu outro texto, explico que a pressa na produção era para atender uma demanda estipulada por Roy Disney em lançar um filme animado por ano –, a técnica da filmagem de referência foi trazida de volta, que por sua vez consistia em filmar os atores realizando a ação da personagem, com todas as nuances e poses, para depois ser reproduzida pelos animadores – quase como os animadores do século XXI fazem ao reproduzir as feições de Andy Serkis para o rosto do Sméagol; quase como rotoscopia, porém, os animadores usam apenas as poses principais e têm liberdade para exagerar nos movimentos – que depois de anos produzindo filmes com animais protagonistas, essa técnica fora deixada de lado. Para prestar consultoria sobre esta prática foi trazida Kathryn Beaumont, a atriz que deu voz e movimento à Alice na produção de 1951, o filme em questão aproveitara ao máximo a técnica da referência, e é graças a isso que tanto Ariel quanto Alice têm movimentos próximos da realidade.

Enquanto vivo, Walt Disney investia pesado nas filmagens que iriam ser repassadas aos animadores, ao passo em que em várias cenas, os atores atuavam diante de um cenário impecavelmente montado; já na produção de A Pequena Sereia, muita coisa precisou ser improvisada toscamente, cenários físicos nem pensar, o ideal era o famoso chroma key com fita crepe para fazer marcações. Havia outro pepino que os animadores precisariam descascar: numa animação normal é possível trapacear no cabelo da personagem, se essa não se mexe, o cabelo também não precisa se mexer, porém todo mundo que já entrou numa piscina sabe que não é assim que o cabelo se comporta debaixo d’água. Os animadores precisaram recorrer à astronauta Sally Ride para filmagens de referência em baixo d’água também.

Imagens para comparação: As imagens à esquerda mostram a filmagem de referência com a atriz Sherri Stoner; as imagens à direita mostram o plano reproduzido na animação.

O povo do mar

Diferente das tradicionais animações de contos de fadas da Disney, este filme não se inicia com um livro de história se abrindo e um prólogo narrado, A Pequena Sereia inicia de forma sutil e com cores sóbrias, quase em preto e branco, um navio surgindo no meio de uma neblina. Somos informados da existência do povo do mar e do Rei Tritão através das canções dos marinheiros, como seres lendários, embora um ou outro indivíduo acredite piamente neles.

A “câmera” acompanha um peixinho que escapara do navio, estamos no fundo do mar, e os diretores do filme nos ambientam ao mundo subaquático, plano após plano mostrando cardumes de peixes, águas vivas, baleias, antes de termos o primeiro vislumbre de um sereio, num primeiro momento até duvidamos dos nossos olhos, pois não o vemos com nitidez, mas a partir do momento em que outros indivíduos aparecem, e os mesmos se dirigem a um palácio subaquático, a lenda se torna real.

A origem da lenda das sereias remota da época medieval, possivelmente da mitologia antiga, alguns estudiosos acreditam que contos de sereia foram desenvolvidos a partir da imagem de Vênus, a deusa do amor que emergia do mar, outra possível fonte é o deus sumeriano Oannes do mar Chadean, existe também a hipótese de que avistamentos de mamíferos aquáticos, tais como o peixe-boi ou o manatim, que amamentavam seus filhotes acima da superfície da água, contribuíram para a criação da lenda. É comum entre os povos que dependem do mar ou rios, além do mais o ser ganha formas e características variadas de acordo com a região, na Grécia, por exemplo, as sereias eram dotadas de asas; o equivalente francês é conhecido como a Melusine (representada na logomarca do Starbucks); a variante irlandesa Selkie pode se transformar em humana para seduzir os homens; existe a variante de água doce da região da Germânia conhecida como Ondina; e até o Brasil possui a sua variante, a Iara, que em minhas pesquisas não foi introduzida pelos povos indígenas, mas sim pelo povo europeu, portanto não seria errado vê-la representada com características dos colonizadores. Para a análise deste filme vamos considerar a lenda das sereias que são humanas da cintura para cima, cauda de peixe, e cujo canto poderia seduzir os homens levando-os a se jogarem ao mar.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Vaso com ilustração da Odisséia de Homero, vemos Ulysses amarrado ao mastro de seu navio para não ser atraído pelo canto das sereias, nessa representação são seres alados; (Foto 2) Pintura de Guillebert de Mets representando uma Melusine numa banheira; (Foto 3) Estátua de uma Selkie na vila de Mikladalur, nas ilhas de Faroé na Dinamarca; (Foto 4) Ilustração de Arthur Rackham para o livro Ondina, que narra a história de uma ondina criada por um casal de pescadores, que se apaixona por um cavaleiro; (Foto 5) Ilustração da Iara por Cláudia Scatamacchia para o livro Lendas Brasileiras de Câmara Cascudo; (Foto 6) Foto que viralizou no Twitter mostrando uma Baleia Beluga por um ângulo que faz parecer que o ser tenha resquícios de pernas humanas.

O povo do mar se dirige até o castelo do Rei Tritão, eis um indicativo de que estamos inseridos num conto de fadas, afinal este elemento está presente em todos os filmes desta tradição produzidos anteriormente pelo estúdio. Lá dentro a variedade de cores contrasta com o mundo na superfície apresentado na primeira cena, uma escolha bem acertada da direção, indicando que o mundo submarino é mais alegre do que o mundo dos humanos, semelhante à transição que Dorothy faz do mundo real (com cores sépia, sem graça) para Oz (totalmente colorido). A música animada tocada por animais aquáticos ajuda a criar essa atmosfera, neste momento somos apresentados ao Rei Tritão e suas sete filhas, representando os sete mares. Outra curiosidade é que a cor da cauda das princesas consiste nas sete cores do arco-íris: Vermelho (Arista), Laranja (Attina), Amarelo (Adella), Verde (Ariel), Azul (Aquata), Anil (Andrina), e Violeta (Alana). Na apresentação elas saem de dentro de conchas, o que me faz lembrar da pintura O Nascimento De Vênus de Botticelli, a Vênus na obra renascentista é a deusa do amor e da beleza, a concha na qual ela nasce representa o sexo feminino, mais precisamente o órgão sexual feminino que por sinal Ariel não tem (por ser uma sereia), mas acaba ganhando ao se transformar em humana.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Cena inicial com uma fotografia bem sóbria, coberta por uma névoa; (Foto 2) Cena no palácio do Rei Tritão, a variedade de cores contrasta com a cena anterior; (Foto 3) Castelo do Rei Tritão, um elemento obrigatório nos filmes de contos de fadas da Disney; (Foto 4) Princesas surgindo de conchas; (Foto 5) Pintura O Nascimento De Vênus, de Sandro Botticelli que, como mencionei anteriormente, Vênus pode ter sido uma das fontes da origem da lenda da sereia.

Cabe uma curiosidade: Na mitologia grega, Tritão é filho de Poseidon com Anfitrite (também uma deusa da água); Poseidon é irmão de Zeus, que por sua vez é pai de Hércules, protagonista da animação que viria a ser lançada anos mais tarde (1997), portanto Hércules e Ariel são primos de segundo grau. (:o) Nada a ver! Essa é apenas uma teoria da conspiração imbecil, já que ambos estão em universos distintos, enquanto o fortão foi inspirado na mitologia grega, a mocinha foi inspirada num conto literário de um autor dinamarquês.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Tritão; (Foto 2) Zeus; (Foto 3) Ariel, filha de Tritão; (Foto 4) Hércules, filho de Zeus.

Ariel

Enquanto Jodi Bensen emprestava sua voz para Ariel, Sherri Stoner fornecia a referência aos movimentos, Sally Ride os estudos para a movimentação do cabelo, o animador Glen Keane deu alma à personagem, que segundo o próprio, usou a atriz Alyssa Milano como referência para a aparência da sereia, a moça era um modelo a ser seguido pelas adolescentes da época. Durante muito tempo na produção, Ariel seria loira, mas após muita discussão decidiu-se que ela seria ruiva, uma escolha bem acertada já que o vermelho cria um contraste com o azul do fundo do mar, dava um ar mais “ardente” à personagem, e a diferenciaria da sereia interpretada por Daryl Hannah. Se cada uma das sereiazinhas representa um dos sete mares, sou capaz de apostar que Ariel representa o Mar Vermelho. O vermelho do cabelo e o verde da cauda formam cores complementares. Ao contrário das demais princesas Disney anteriores, limitadas a trabalhos domésticos e dançar na floresta, a sereia é motivada pela curiosidade e sai para explorar um navio naufragado para buscar objetos para sua coleção. Ariel também se destaca das suas irmãs, não só pelo cabelo vermelho sempre solto, mas por ter um top de cor diferente de sua cauda, e seu nome não termina com a letra “A” como as outras.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Comparação entre a personagem fictícia Ariel, e a atriz Alyssa Milano na época em que esta serviu de inspiração para a primeira; (Foto 2) Alteração feita por mim, para demonstrar como Ariel seria se fosse loira; (Foto 3) Ariel em sua versão final, ruiva.

Úrsula: A bruxa do mar

Logo após a apresentação de Ariel, somos apresentados à antagonista da história, Úrsula, a bruxa do mar, mantida nas sombras inicialmente; um close de sua boca ao comer um camarãozinho, tudo isso “filmado” de forma assustadora que quase deixamos passar uma informação importante: ela diz que vivia no palácio. Inicialmente, a canção dos marinheiros no início do filme iria nos revelar da proximidade entre o Rei Tritão e Úrsula, porém, esta cena foi aparada, e a informação só nos é dada neste momento, o que causa um maior impacto no espectador.

Alguns estágios da evolução da personagem Úrsula até a versão final.

A bruxa então sai do seu buraco e revela sua parte inferior, não uma cauda de peixe, mas tentáculos de polvo ao cair sobre e engolir a “câmera”. Assim como Ariel tinha outra aparência nos primeiros estágios da produção, Úrsula também passou por várias transformações. Como o conto de Andersen não nos fornece muitas informações sobre a sua aparência, os ilustradores deram a sua visão de como ela seria para as reedições do livro, os artistas da Disney tentaram seguir alguns desses modelos, fizeram-na como peixe-leão, ou um peixe-escorpião com espinhos, mas quando a desenharam como um polvo perceberam que aquele visual combinava com ela. O rosto da personagem foi baseado na personagem Divine, do filme Pink Flamingos (1972) de John Waters, o formato da sobrancelha, o cabelo penteado pra cima, a pinta no canto da boca, o biótipo são características da travesti aproveitadas na bruxa do mar.

Imagens para comparação: À esquerda a personagem Úrsula; À direita a personagem Divine.

Part of your world

Durante a pré-produção, quando o filme está sendo montado e as músicas estão sendo compostas (OBS: nas produções musicais da Disney, as canções são criadas antes mesmo da animação, já que elas fazem parte da narrativa; numa animação que não há números musicais, essa ordem pode ser alterada), era comum alguém da equipe passar por um corredor e ouvir os compositores trabalhando na trilha. Numa dessas ocasiões, o animador Glen Keane ouviu uma sessão de Jodi Bensen cantar Part of your world com tanta paixão que lhe deu um estalo, ele sentiu uma conexão com a personagem: “Eu preciso animá-la, eu preciso animar esta cena!” pensou ele consigo mesmo.

Keane voltou para seu posto de trabalho e começou a montar um animatic (versão prévia da montagem, com uma animação menos elaborada, apenas para referência). Algum tempo depois, o filme foi exibido para um grupo de crianças que visitava o estúdio, como uma sessão de teste, porém, ainda estava num estágio primário, as animações estavam sem cor e sem o traço final, durante a exibição uma criança sentada à frente de Jeffrey Katzenberg derrubou acidentalmente seu saco de pipocas e logo começou a catá-las, isto aconteceu enquanto este número musical acontecia. O executivo, que até então não tinha experiência com animação e não conseguia visualizar o filme pelo animatic, achou a cena era chata e se uma criança ficou dispersa durante uma cena, seria o suficiente para cortá-la do filme.

Sessão de gravação com Jodi Bensen.

John Musker, Ron Clements, e Howard Ashman que trabalhou arduamente nesta canção, tentou em vão dissuadi-lo, por fim, o animador Glen Keane foi quem o convenceu a lhe dar uma segunda chance para concluí-la com o argumento de que aquela cena era o coração do filme, seria o equivalente a cortar Over The Rainbow de O Mágico De Oz (The Wizard Of Oz, 1939) (OBS: isso realmente quase aconteceu).

Versão em animatic de Part of  your world

Quando Keane aprimorou a animação nesta sequência, ela foi exibida novamente numa sessão de teste, dessa vez com adultos, alguns deles se derramaram em lágrimas, e isso bastou para provar a Katzenberg o quão errado ele estava, esta canção abriu um precedente para futuras animações Disney, o momento “eu quero!”: Bela, Aladdin, Simba, Pocahontas, Quasimodo, Hércules, Mulan, Tarzan, Tiana, Rapunzel, Ana e Elsa, Moana, todas essas personagens cantam sobre o que eles almejam no início dos seus respectivos filmes. Imagino se Katzenberg tivesse o mesmo critério com os filmes que ele produz na Dreamworks hoje em dia, e uma criança ou um adulto tirasse a atenção do filme para checar a tela do celular, não sobraria um minuto de filme sequer.

Versão mais bem trabalhada de Part of your world

Há dois detalhes sobre esta cena que gostaria de apresentar:

1 – Num trecho em que Ariel canta “O que é o fogo e por que ele (qual é a palavra?) queima?”, a pintura que ela toca se chama A Penitente Madalena E A Chama do pintor barroco Georges de la Tour. Glen Keane trouxe a ideia de incluir esta pintura na cena, segundo o mesmo, esta seria a única forma de uma sereia saber da existência do fogo.

2 – Há uma frase da música que diz “O que eu daria se eu pudesse viver fora dessas águas?” já denuncia que a garota estaria disposta a sacrificar algo precioso para se tornar humana, algo precioso como a sua voz.

Pintura A Penitente Madalena E A Chama do pintor barroco Georges de la Tour, a mesma pintura que Ariel tem em sua coleção.

Se você não se cansou dessa música, aqui vai mais uma vez, agora a versão finalizada:

Príncipe Eric

A cena Part of your world termina com uma sombra cobrindo a “claraboia” da gruta, poderia ser uma baleia passando, mas é um navio, ao que nos leva à próxima cena em que Ariel conhece o Príncipe Eric, que merece destaque dos demais príncipes dos filmes anteriores do estúdio, finalmente deram uma personalidade ao príncipe – o príncipe em Branca De Neve E Os Sete Anões (Snow Whithe And The Seven Dwarfs, 1937) apenas canta e beija garotas mortas; o príncipe em Cinderela (Cinderella, 1950) apenas boceja e dança, nem vai pessoalmente procurar a dona do sapatinho; o Príncipe Philip em A Bela Adormecida (Sleeping Beauty, 1959) aborda garotas desconhecidas no meio da floresta para dançar, e luta contra um dragão… Pelo menos essa última é uma atitude bad ass, mas o Príncipe Eric não fica atrás, como vemos no clímax desse filme. Apesar de ser da realeza, ele gosta da vida no mar, acompanhar os marinheiros e até os ajuda nos trabalhos braçais, sabe governar o navio, pescar com um arpão, nadar grandes profundidades com apenas seu fôlego, ama os animais, toca flauta, e também sabe dançar. Uma das características do príncipe no conto original foi mantida neste filme, em ambas as obras, ele é obcecado por encontrar a moça que o salvou do naufrágio, não aceita outra para ser sua esposa senão ela, porém, durante um breve momento no filme, Eric se convence de que seria melhor deixar de lado essa “fantasia” de encontrar a mulher misteriosa que o salvou, e arriscar ser feliz com a moça muda que ele encontrou na praia e cuidou.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Eric ajudando os marujos; (Foto 2) Eric tocando flauta para Max; (Foto 3) Eric governando o navio; (Foto 4) Eric sacrificando sua própria vida para salvar o cachorro; (Foto 5) Eric pés de valsa; (Foto 6) Mergulhando grandes profundidades, pouco antes ele ainda atirara um arpão contra Úrsula.

Efeitos especiais

Além de ter uma história comovente,  A Pequena Sereia também impressiona pelos efeitos especiais. Para uma animação tradicional é um grande desafio mostrar elementos como fumaça, fogo, água, e torna-los convincentes. É preciso saber o que está fazendo, caso contrário estes elementos ganhariam um aspecto falso, e quebrariam a mágica do cinema. A cena do naufrágio merece destaque neste ponto, sentimos o vento; a chuva que começa com pingos grossos esporádicos; o calor das chamas; explosões, e até mesmo os fogos de artifício nos convencem de que são verdadeiros. Outros exemplos de efeitos aplicados ao filme que nos criam a ilusão de realidade são a neblina no início do filme, o efeito da luz sobre a água (como vemos no fundo de uma piscina), reflexo da luz na água, e além de tudo isso, temos uma das primeiras composições de um personagem 2D num cenário 3D – As Peripécias Do Ratinho Detetive (The Great Mouse Detective, 1986) utilizou esta técnica anteriormente.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Navio surgindo entre a neblina; (Foto 2) Faíscas iluminam o salão subaquático; (Foto 3) Ariel nada sob um cardume de peixes que brilham com a luz do sol. Há um defeito minúsculo no canto inferior da tela, o efeito do reflexo da água parece recortado; (Foto 4) Fogos de artifício e reflexo do brilho na água são muito convincentes; (Foto 5) Chuva forte inicia com pingos grossos; (Foto 6) Efeitos especiais de relâmpagos; (Foto 7) Momento em que um relâmpago atinge uma das velas e provoca um incêndio; (Foto 8) Ariel resgata Eric em baixo d’água, uma cena muito bem iluminada; (Foto 9) Um dos muitos exemplos do efeito “fundo da piscina”; (Foto 10) O tridente do Rei Tritão possui um brilho próprio e solta raios; (Foto 11) Raio vindo de dentro do tridente implode a estátua de mármore; (Foto 12) Efeitos enquanto Úrsula prepara a poção; (Foto 13) Efeitos enquanto Úrsula prepara a poção, note que o brilho no rosto e cabelo de Ariel acompanham a animação; (Foto 14) Brilho da “voz” de Ariel parece vir da mão fechada de Úrsula, e reflete em seu rosto; (Foto 15) Transformação de Ariel, acompanhada de um brilho; (Foto 16) Jogada de cabelo de Ariel, este plano não estaria completo sem o brilho nas gotículas; (Foto 17) Efeito do brilho nas facas de cozinha; (Foto 18) Em alguns planos no fundo do mar, notamos uma leve distorção, cria a ilusão de quando abrimos os olhos embaixo d’água; (Foto 19) Ariel desce as escadas e a “câmera” desce junto, como se estivesse sobre um steadycam, um dos primeiros exemplos de composição 3D com 2D. Neste caso, o cenário parece ter sido animado e finalizado por cima da referência tridimensional; (Foto 20) Ponto de vista de Úrsula enquanto esta fica gigante, novamente o efeito parece ter sido o mesmo mostrado na Foto 19; (Foto 21) Relâmpagos, brilho sobre a água animada, e brilho no tridente; (Foto 22) Raios surgem de dentro de Úrsula; (Foto 23) Brilho sobre a água animada; (Foto 24) Navio vai em direção ao sol, foi aplicado um efeito em que as extremidades parecem ser “engolidas” pela luz do sol, e ao mesmo tempo há o reflexo deste na água.

Sebastian

Depois que Ariel salva o Príncipe Eric do naufrágio, passamos do primeiro ponto de virada, o cenário está armado: temos uma sereia em conflito com o pai, um amor proibido e secreto, ao qual ela fará de tudo para ter. Para dissuadir Ariel, Sebastian canta uma canção, reparem na naturalidade com que o siri faz a transição entre simplesmente falar, para quando começa a cantar. Vemos esse mesmo artifício pouco antes de Ariel começar a cantar Part of your world, é exatamente por isso que os números musicais funcionam nesta e na maioria das obras da Disney, as personagens não cantam apenas por cantar, lhe faltam palavras, e precisam se expressar através da música, é dessa forma que o compositor Howard Ashman tratava as músicas nos filmes em que trabalhou, da mesma forma que trabalhava as músicas nas peças off-broadway.

Para Ashman, um número musical deve levar a história adiante ou expressar algum sentimento da personagem. Part of your world e Under the sea ambas expressam respectivamente o desejo de fazer parte do mundo humano, e a alegria do mundo submarino, caso cortassem essas duas cenas, teríamos dificuldade em entender as motivações de ambas as personagens.

Under the sea é performada pelo siri Sebastian, o compositor real, e só percebi seu sotaque jamaicano carregado ao ver o filme com o áudio em inglês. Originalmente ele teria um sotaque britânico, mas para trazer ritmos contemporâneos à produção, um toque caribenho às músicas, Howard Ashman sugeriu mudarem as origens do personagem. Essa não é a única alteração que ele propôs para o personagem, ele também leva crédito pela transição entre “não ajudar” e “ajudar” Ariel a conquistar o príncipe, este momento soa tão natural quando o próprio Sebastian sente a dor da sereia, que em suas palavras “será miserável para o resto da sua vida” se não for atrás de seu sonho. Novamente, uma cena que se fosse cortada, mostrada off camera, ou feita de outra forma, poderia arruinar o filme.

Devo retificar meu argumento anterior, nem todas as músicas do filme expressam um sentimento ou levam a história adiante, Le Poisson, a canção que o chefe Louis canta enquanto prepara o jantar, é um contra exemplo, serve apenas para inserir gags visuais e piadinhas que normalmente veríamos nos curtas da Disney. Se cortasse essa cena do filme, não faria falta.

De cima para baixo: (Foto 1) Sebastian furioso com Ariel; (Foto 2) Ariel faz uma expressão melancólica capaz de convencer qualquer pessoa (ou siri); (Foto 3) Sebastian cede às súplicas de Ariel, sem que esta precise dizer uma palavra.

Ariel muda

Um dos princípios da animação consiste em transmitir o máximo da emoção da personagem através de gestos e expressões, neste sentido é melhor que ela não precise dizer uma palavra. Se pararmos para relembrar os filmes clássicos da Disney, veremos que o estúdio nunca fez concessão a personagens que não se comunicam através de palavras, mesmo no papel de protagonista como foi o caso de Dumbo (1941), porém, na “atualidade” dos anos 80, o fato de a protagonista passar a segunda metade do filme sem falar poderia causar uma estranheza no espectador. Os próprios executivos do estúdio ao ler o roteiro ficavam com a sensação de que a personagem estava ausente, mas como A Pequena Sereia dispunha de uma equipe talentosa, este desafio foi vencido, como disse antes, com o auxílio das filmagens de referência.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) Ariel assopra o cabelo da testa, aborrecida; (Foto 2) Num jantar com uma família nobre, ela penteia os cabelos com um garfo, como se fosse a coisa mais natural do mundo; (Foto 3) Ariel penteia os cabelos com um garfo, como uma garota adolescente o faz antes de dormir; (Foto 4) Ariel aponta para aquilo que ela acha interessante, para aquilo que ela quer, como uma criança; (Foto 5) Ariel faz “cara feia” quando o príncipe tenta adivinhar seu nome e não acerta, uma expressão infantil; (Foto 6) Segunda noite, e a moça penteia os cabelos com o garfo; (Foto 7) Ao descobrir que o príncipe Eric se casará com outra mulher, ela mexe as mãos num tique nervoso; (Foto 8) Pela sua expressão, Ariel parece mais chateada por ter perdido o amor da sua vida, do que preocupada com o fato de que em poucos minutos pertencerá à Bruxa do Mar.
Note que muitas das imagens aqui mostradas apontam para atitudes infantis da moça.

A versão dos anos 1940

Chegamos ao terceiro ato, Ariel e seus amigos devem impedir que o Príncipe Eric se case com a outra mulher, porque esta é a Bruxa do Mar disfarçada, porém este não é o clímax do conto de Hans Christian Andersen. Como disse anteriormente, Ron Clements fez algumas alterações à obra original, somente após a sua versão da história ser aprovada, ele encontrou esboços de uma tentativa de Walt Disney de adaptar o conto clássico ainda nos anos 1940. O pai do Mickey pretendia contar a história da Pequena Sereia como uma das Silly Symphonies no final dos anos 1930, nesta ocasião o ilustrador dinamarquês Kay Nielsen preparou uma série de ilustrações em carvão e aquarela como concept art, além de A Pequena Sereia, outras obras de Andersen também seriam adaptadas, como uma antologia de contos, porém, o período durante a Segunda Guerra Mundial foi extremamente conturbado para o estúdio (para todo mundo, na verdade), resultando em greves, caça aos “comunistas”, e por final, Disney abortou este projeto oficialmente em 1943 para focar em propaganda para a guerra – é neste contexto que temos aquele infame desenho do Pato Donald trabalhando para o exército nazista.

Ron Clements estudou os esboços e um roteiro encontrados, e viu que algumas das alterações que ele próprio fizera, também foram feitas por Disney há quase 45 anos antes, mas ainda assim seria mais próxima da versão de Andersen, ou seja, melancólica e sem um final feliz.

Exemplos das artes conceituais de Kay Nielsen, e minha melhor tentativa de organizá-las em ordem cronológica.

Exemplo de como a arte de Kay Nielsen (à esquerda) serviu de inspiração para o filme de 1989 (à direita).

O conto original de Hans Christian Andersen

Depois do clímax, Ariel repousa sobre uma pedra para ver de longe o Príncipe Eric se recuperar na praia, neste momento ela se senta numa posição semelhante à da estátua da Pequena Sereia no porto de Copenhagen, que está lá para homenagear não o filme (como alguns podem pensar), mas o autor do conto que o inspirou, Hans Christian Andersen. Quero dedicar os próximos parágrafos para apontar certas semelhanças e diferenças entre a obra de Andersen e o filme da Disney.

A história original inicia da mesma forma, nos situando no fundo do mar e nos apresentando às pequenas sereias. A protagonista no conto não recebe um nome como no filme, ela simplesmente é conhecida como a pequena sereia (vou chama-la de PS), pois é a filha mais nova de seis, no filme o Rei Tritão tem sete filhas. Enquanto a personagem do filme tem 16 anos, a sereia no conto tem apenas 15, essa é a idade na qual as sereias recebem permissão para subir até a superfície. Em ambas as versões a protagonista é curiosa sobre o mundo dos humanos, contudo, o hobby de colecionar artefatos humanos é atribuído às suas irmãs, enquanto a PS tem uma personalidade mais reservada, ela dedica seu tempo a cultivar um jardim com uma estátua de mármore (a estátua de mármore aparece mais tarde no filme). A paixão que a protagonista nutre nas duas versões vem de histórias e relatos que ela ouve de terceiros, no filme as informações são passadas por uma gaivota, no conto são as irmãs mais velhas que relatam seus passeios na superfície ano após ano (PS tem 10 anos no início da história, portanto há um tempo de espera até que ela atinja a idade permitida), mas as informações mais precisas são dadas pela sua avó. Em ambas as mídias a protagonista tem uma voz encantadora.

PS completa 15 anos, e sua primeira visita à superfície foi bem recriada no filme quando a personagem vê o Príncipe Eric pela primeira vez, em ambas as versões há uma festa no navio com música e fogos de artifício para comemorar o aniversário do príncipe (eles fazem aniversário no mesmo dia, coincidência ou destino?). As festividades são interrompidas por uma tempestade que afunda o navio, a sereia salva o príncipe e leva seu corpo para a praia, lá ele é amparado por um grupo de mulheres que vive num convento próximo. Ao voltar para o seu castelo, PS pergunta para sua avó se os humanos morrerem como as sereias, aqui está uma diferença significante entre o filme e o conto: a avó explica que os humanos não vivem por 300 anos como as sereias, mas quando morrem, sua alma imortal ascende para um mundo acima das estrelas; ao morrer, as sereias se transformam em espuma e simplesmente se dissolvem da existência, mas se a sereia conseguir fazer com que um humano a ame e despose-a, ela ganha uma alma imortal.

Nas duas versões a protagonista vai até a bruxa do mar para que esta a transforme em humana e o príncipe possa se apaixonar por ela, uma vez que é dito no conto que os humanos não acham cauda de peixe atraente. No filme, o ambiente onde a bruxa mora e o encontro seguem bem de perto ao que é narrado no conto, a diferença é que a obra escrita é mais visceral, PS tem sua língua cortada ao invés de sua voz ser retirada por magia. A bruxa ainda a avisa que a transformação será extremamente dolorosa e cada passo que ela der será como pisar em navalhas e seus pés sangrarão, outro alerta que ela faz é que não poderá ser sereia novamente e morrerá na manhã seguinte se o príncipe por quem ela se apaixonou casar-se com outra pessoa.

A protagonista sobe até a superfície, toma a poção e se transforma em humana, o príncipe a encontra e passa a cuidar dela. No filme o rapaz é atencioso e surge uma química entre eles, mas não cede aos desejos por conta da sua devoção em encontrar a moça que o salvou. No conto isso também está presente, inúmeras vezes ele diz o quanto ela é bonita, lhe beija a testa, e numa ocasião chega a beijar sua boca (lembrando o que a avó da PS dissera: eles precisam se casar), porém o amor que ele sente por ela se assemelha ao amor que uma pessoa sente por uma criança ou pelo seu pet, ela até dorme numa almofada do lado de fora do seu quarto. O tempo passa e o príncipe é arranjado para se casar com a princesa de outro país, ele não deseja se casar com alguém que não é a moça do convento que o salvou, muito menos com alguém que ele não conhece, mas ao encontra-la, ele se dá conta de que essa princesa é a mesma moça que ele acha que o salvara. Na noite após o casamento (última noite de vida de acordo com a bruxa do mar), PS se aproxima do oceano e suas irmãs lhe trazem uma potencial solução, uma faca dada pela bruxa do mar para que ela apunhale o coração do príncipe e possa voltar a ser sereia. Ela se recusa a fazer isso por amor ao príncipe, se joga ao mar e aceita sua própria morte, mas ao invés de dissolver no vazio ela é recebida pelas irmãs do ar (graças às suas boas ações, principalmente por não matar o príncipe quando isto poderia beneficiá-la), cuja descrição se assemelha a de anjos, e lhe é dada a missão de fazer boas ações, guardar crianças por 300 anos – a ironia é que a sereia viveria naturalmente por cerca de 300 anos, e agora terá de passar o mesmo período sendo um desses seres etéreos.

A pequena sereia no conto possui uma motivação dupla, ela queria fazer parte do mundo dos humanos e ganhar uma alma imortal, o casamento com o príncipe era apenas um meio pelo qual ela realizaria seus desejos. No filme o amor se tornou a prioridade, em ambos os casos há o tema de abnegação, ou seja, a personagem sacrifica algo (sua família e seu mundo) pelo seu amor, a pequena sereia do conto embora temendo a morte e o vazio existencial que esta acompanha, deixa que o amor pelo príncipe prevaleça, é por este motivo que ela não o mata e acolhe a própria morte. Como conhecemos a tradição do estúdio Disney, o filme precisa terminar com um final feliz, mas aqui é acompanhado de um sacrifício: o Rei Tritão decide deixar sua filha seguir seu próprio caminho.

Cena do filme (à esquerda); Estátua da Pequena Sereia em Copenhagen (à direita).

Mensagens subliminares e easter eggs

Esta análise de um filme da Disney não estaria completa sem os easter eggs. Durante o final dos anos 90 (quando a internet era mato) sites sobre mensagens subliminares tinham extrema relevância, foi através desses sites que se tornou público a palavra “SEX” formada pelas folhinhas em O Rei Leão, a mulher pelada na janela de Bernardo E Bianca (The Rescuers, 1977), e o nome Lúcifer dado ao gato da madrasta de Cinderela, A Pequena Sereia parecia ser o maior alvo, e o idiota que vos escreve corria até a locadora para conferir uma por uma.

– Torre com formato de pênis no pôster do cinema e na capa da fita: segundo os sites – que reproduziam sempre o mesmo texto e a mesma imagem – o artista contratado para ilustrar o pôster e materiais de divulgação, Bill Morrison, era gay e após ser demitido fez uma última sacanagem ao inserir um formato fálico ao castelo do Rei Tritão. Em entrevistas posteriores, o artista declarou que não foi intencional, a torre já possui um formato cilíndrico, e ele teve pouco tempo para trabalhar na arte. Não passa de pareidolia, uma mente pervertida verá pênis em qualquer objeto cilíndrico. Contudo, a capa foi alterada para o lançamento em DVD.

Exatamente as mesmas imagens que eu encontrava na Internet no final dos anos 90.

– Padre tarado: reza a lenda que o disfarce humano da bruxa do mar era tão linda que deixou o padre excitado. Essa é uma meia verdade, sim, ela é muito atraente, mas o que moralistas viam como sendo o a ereção do padre é na verdade os seus joelhos, isso é comprovável quando vemos a cena por um outro ângulo. Mas isso não impediu grupos conservadores de protestarem e até moverem uma ação contra a Disney. Por pressão desses grupos, tanto a versão do DVD quanto do Blu-ray o padre não possui o suposto “volume” entre as pernas, mas ainda é possível ver a cena inalterada nos extras, e aquela famosa versão Divix que era pirateada no início do século.

De cima para baixo: (Foto 1) Uma imagem viralizada do final dos anos 90, o zoom mostra o padre com uma suposta ereção; (Foto 2) Cena restaurada para as versões mais recentes; (Foto 3) Mesma cena, mostrada por outro ângulo, prova de que os joelhos do padre estão dobrados.

Curiosamente a internet do final dos anos 90 encontrava pelo em ovo, mas não encontrava verdadeiros easter eggs nesses filmes, aqui vai alguns: 1) Mickey, Pateta, Donald, e o sapo Caco (ou Kermit) aparecem na cerimônia de apresentação das filhas do rei; 2) Em sua coleção, Ariel possui um busto de Abraham Lincoln, ele foi presidente entre 1861-65 (e caçador de vampiros), e A Pequena Sereia foi publicado em 1837, é preciso forçar um pouco para encaixar os dois na mesma história; 3) Ao final de Under the sea, quando os peixes apontam para onde deveria estar Ariel, um dos peixes é o Sr. Limpet, do filme O Incrível Sr. Limpet (The Incredible Mr. Limpet, 1964); 4) O contrato que Ariel assina possui não passa de um monte de baboseira ininteligível, as únicas partes legíveis são o início e o final, justamente quando a “câmera” pausa. Tomei a liberdade de monta-lo, observem que no meio do texto há um desenho do Mickey; 5) Carlota usa uma roupa parecida com a que Cinderela vestia enquanto trabalhava; 6) O quadro na sala de jantar que mostra uma mulher semelhante à Princesa Aurora e o Príncipe Philip; 7) Enquanto visita o reino com o Príncipe Eric, há um patinho (provavelmente um brinquedo) que se assemelha muito com O Patinho feio do curta da Disney de 1939, O Patinho Feio também é uma história de Hans Christian Andersen; 8) Um dos ingredientes que Úrsula usa para se transformar em humana é uma borboleta numa bolha. Mais tarde, no casamento, é revelado que o nome que ela utiliza é Vanessa, o mesmo nome de um gênero de borboletas; 9) Enquanto os animais estão tentando impedir o casamento, podemos ver o Rei e o Grão-Duque do filme Cinderela; 10) Os diretores Ron Clements e John Musker fazem seus cameos (como Hitchcock fazia) durante a cena do casamento.

Da esquerda para a direita, de cima para baixo: (Foto 1) O círculo mostra onde o sapo Kermit está sentado; (Foto 2) O círculo mostra onde Mickey, Donald e Pateta estão sentados; (Foto 3) Com um pouco mais de zoom, podemos ver claramente a imagem do sapo Kermit; (Foto 4) Com um pouco mais de zoom, podemos ver com clareza os icônicos personagens da Disney; (Foto 5) O círculo mostra onde está o busto de Abraham Lincoln na gruta de Ariel; (Foto 6) Exemplo de um busto de Abraham Lincoln; (Foto 7) O círculo mostra onde está o Sr. Limpet; (Foto 8) Imagem do filme O Incrível Sr. Limpet; (Foto 9) Montagem do contrato que Ariel assina; (Foto 10) Carlota dá banho em Ariel; (Foto 11) Cinderela esfrega o chão, note as semelhanças de sua roupa com as de Carlota; (Foto 12) O quadro em destaque parece ser uma pintura da Princesa Aurora e o Príncipe Philip, ao lado está uma imagem do casal no filme A Bela Adormecida; (Foto 13) Ariel e Eric passeiam pelo reino, o círculo destaca um patinho; (Foto 14) O patinho destacado anteriormente parece ser o mesmo de O Patinho Feio; (Foto 15) Úrsula segura uma borboleta dentro de uma bolha; (Foto 16) Uma borboleta do gênero Vanessa, essa espécie é a Vanessa Braziliensis; (Foto 17) Destacado dentro do círculo estão o Rei e o Grão-Duque do filme Cinderela, ao lado está uma foto deles no filme referido; (Foto 18) Em destaque dois personagens que se assemelham muito aos diretores de A Pequena Sereia.

Repercussão

Antes de sua estreia nos cinemas, Katzenberg e os outros executivos do estúdio não sabiam como realizar o marketing do filme, e não acreditavam em seu potencial, sua mentalidade machista acreditava que filmes voltados ao público feminino gerava menos lucro do que os filmes feitos para garotos – esse argumento se provou falso com Titanic (1997) e Frozen (2013) – e antes de lança-lo o estúdio realizou uma sessão prévia apenas com adultos, neste momento constataram a pérola que tinham em suas mãos.

A Pequena Sereia levou o Oscar de Melhor Trilha Sonora Original e Melhor Canção Original para Under The Sea, este foi o primeiro de muitos filmes que ganharam nestas mesmas categorias – os outros filmes são A Bela E A Fera (Beauty And The Beast, 1991), Aladdin (1992), O Rei Leão (The Lion King, 1994), e Pocahontas (1995) –. Mais do que isto, o sucesso de A Pequena Sereia garantiu com que o departamento de animação do estúdio não fechasse, ao contrário, ele abriu as portas para todas as animações que a sucederam. O filme influenciou uma geração de crianças que se apaixonaram por animação e quando adultas foram trabalhar no estúdio Disney, e até mesmo a deusa do Heavy Metal, Simone Simons, declarou em entrevistas e no site oficial que suas personagens favoritas são Ariel e Úrsula – segundo ela, há uma dualidade em si.

Foram lançados posteriormente dois filmes diretamente em vídeo, A Pequena Sereia II: O Retorno Para O Mar (The Little Mermaid II: Return To The Sea, 2000) e A Pequena Sereia: A História de Ariel (The Little Mermaid: Ariel’s Beginning, 2008) que pessoalmente eu não assisti e não tenho interesse devido à má reputação destes lançamentos; uma série de TV também acompanhou o sucesso do filme, que durou 3 temporadas entre 1992-94, no Brasil foi exibida pelo SBT no Bom Dia e Cia entre 1999 até 2001, embora alguns dos meus amigos na época assistissem à série, esta nunca me chamou a atenção.

Como é de se esperar, a Disney irá fazer uma refilmagem em live action deste clássico, programado para lança-lo em 2022, porém a pandemia de Corona vírus pode atrasar todo o cronograma do estúdio. Na primeira semana de julho de 2019 foi anunciado que o remake trará Hallie Bailey como protagonista, uma atriz afro-americana, e isso gerou enorme polêmica entre os internautas. Quem não vive no fundo do mar sabe que o racismo vem sendo escancarado por instituições e pessoas, e estas acabam fazendo maior barulho graças às redes sociais, porém o mundo não está sendo o mesmo após a morte de George Floyd, e com certeza não será mais o mesmo após a pandemia pela qual estamos passando, torço para que da mesma forma que A Pequena Sereia de 1989 tenha quebrado paradigmas, A Pequena Sereia de 2022 possa quebrar preconceitos.