A cantora Billie Eilish foi indicada em seis categorias do Grammy 2020: Melhor Performance Solo, Melhor Novo Artista, Gravação do Ano, Álbum do Ano por When We All Fall Asleep, Where Do We Go?, Canção do Ano e Melhor Álbum Pop Vocal. Com os recém completados 18 anos, é a artista mais nova a conseguir indicações nas principais categorias do premio. Também é a mais jovem mulher do ano a ser escolhida pela Billboard. Billie vai fazer uma mini turnê pelo Brasil em 2020 tocando no Rio e em São Paulo.

Eilish também foi elogiada por importantes nomes da música como Dave Grohl, vocalista do Foo Fighters e ex-baterista do Nirvana, que comparou a artista com a banda que ele tinha com Kurt Cobain. Segundo ele, ela tem uma relação muito boa e direta com o público jovem, mesma coisa que o Nirvana tinha em seu auge em 1991. Além disso, mesmo não utilizando os mesmos instrumentos, Billie é autentica e bem rock’n roll. A artista também foi elogiada pelo vocalista do grupo Radiohead, Thom Yorke, que disse ser ela uma das poucas a estar fazendo algo de realmente interessante atualmente. Tá com moral a moça.

Bom, voltando ao Grammy, eu senti falta de indicação da artista na categoria melhor clipe. Para além da questão musical, Billie também traz um trabalho visual muito interessante. Seus vídeos são bastante plásticos e com uma identidade visual bem própria e é sobre isso que vamos falar aqui.

 

A agonia nos clipes de Billie Eilish

Bem, na maioria dos clipes temos algum incômodo visual que, mesmo estranho, não conseguimos parar de olhar. Sendo um nariz que sangra, olhos que escorrem um líquido negro ou pele sendo perfurada. Eu tentei encontrar uma palavra que definisse o sentimento que esse tipo de imagem passa. A primeira que pensei foi gore (um subgênero do cinema de terror com representação de violência e sangue), mas acho que não é para tanto. O mais próximo que encontrei foi: agonia. Segundo o dicionário, agonia é:

Sofrimentos morais intensos; aflição, angústia, estertor, inquietação;

Dor severa ou intensa;

Mal-estar físico; enjoo, náusea

As imagens dos vídeos de Billie Eilish e as sensações que elas causam, me lembraram bastante o filme Cisne Negro (2009). É impossível não sentir um frio na espinha quando Natalie Portman puxa a pelinha do dedo e quase fica sem ele ou quando começa a puxar penas que nascem pelo seu corpo. O filme usa esse recurso diversas vezes para realmente incomodar os espectadores e intensificar os sentimentos da protagonista em luta com seu próprio corpo.

Acredito que é por aí. Assistir aos vídeos da Billie nos faz experimentar coisas que são muito próprias do universo criado pela cantora. Ver essas coisas acontecendo provocam em nós sensações como se fosse nossa pele a ser ferida. Daí vem a tal da agonia. Ela insere essas coisas perturbadoras envolvendo sangue e objetos pontiagudos em um cenário quase hermético, muito claro, limpo e com cores vibrantes. Parece até um comercial de algum produto de limpeza. Aliás, esse ambiente clean vem sendo utilizado bastante ultimamente. Talvez o exemplo mais famoso tenha sido no vídeo do rapper Drake, Hotline Bling que, inclusive virou meme.

Fluidos corporais e outros líquidos

No clipe de bad guy (todas as músicas do disco são escritas em letras minúsculas)seu maior hit, Eilish aproveita da “música” que abre seu álbum chamada !!!!!! (sim, é esse nome mesmo), em que ela tira o aparelho ortodôntico da boca e diz “tirei meu aparelho e esse é o álbum”. Para abrir o clipe faz exatamente isso. Tira o aparelho da boca e entrega para um cara depois de sair de uma parede amarela. Aí já começa a estranheza. Quem em sã consciência iria fazer isso e ainda ter alguém aceitando segurar essa nojeira. Engraçado que o vocalista do Nirvana, Kurt Cobain, também gostava bastante de fazer referencias à fluidos corporais em suas criações, tanto nas músicas quanto em seus desenhos. Não sei se Dave Grohl pensou nessa comparação também.

Além disso, o vídeo ainda tem um nariz que não para de sangrar, um homem tendo leite derramado em sua boca cheia de cereal e cabeças em sacos cheios de água para completar o clima agonizante das imagens. Todo mundo que assistiu a esse clipe me contou que ficou bem incomodado. No meu caso, quando assisti pela primeira vez, fiquei desesperado com esse nariz que não parava de sangrar.

O clipe foi dirigido por Dave Meyers, que assinou outros como Thank You,da cantora Dido, My Sacrifice, da banda Creed, Firework da Katy Parry, Humble , do Kendrick Lamar, entre outros. Ele também foi responsável pela direção do longa A Morte Pede Carona (2007).

Frame de bad guy (que desespero esse nariz sangrando).

A coisa fica mais séria ainda em when the party’s over. Aqui vemos a cantora digerir um líquido escuro e denso e em seguida ele ser expelido pelos seus olhos. O ambiente mais uma vez claro e suas roupas brancas dão um contraste grande e intensificam ainda mais a agonia que é alguém expelir esse líquido pelos olhos.

A ideia veio depois que Billie Eilish recebeu de um fã uma ilustração em que ela chorava um líquido preto. O primeiro teste foi filmado pela moça usando sua mãe como modelo no jardim da sua casa. Na gravação oficial do vídeo foram usados efeitos práticos com tubos sendo ligados a sua testa e olhos para jorrar o líquido. Os tubos foram escondidos na pós-produção.

O clipe é dirigido por Carlos López Estrada, que já dirigiu outros como Kangaroo Cour, da dupla Capital Cities, além de alguns episódios de séries de TV como Legião (2017 – 2019).

Billie Eilish e as estranhezas intensificadas

Sério, vê se não dá desespero uma imagem dessas.

Outro que segue a mesma linha é you should see me in a crown, que teve a direção da própria Billie EilishA primeira estranheza é que ele foi filmado na vertical. Na verdade nem é tanta estranheza assim, visto que a maioria das pessoas, principalmente o público jovem que é o que mais consome as produções da cantora, assiste a esses vídeos no celular. Mas, a principal é que a cantora contracena com aranhas de verdade e o mais bizarro é que uma delas sai de dentro de sua boca. Olha a agonia voltando aí de novo.

Na sua coleção de bizarrices, ela tem dois clipes que são continuações um do outro: bury a friend e all the good girls go to hell. No primeiro, além de umas coisas meio O Exorcista (1973), Billie é fincada por diversas agulhas em suas costas numa mistura de ficção-científica com Invocação do Mal (2013). No segundo, depois desse “ritual”, ela ganha um par de asas e acaba caindo num poço de petróleo. Então, suas asas são incendiadas, fazendo-a se aproximar mais de um demônio que um anjo. O que casa certinho com a tradução da música que fala sobre um Lúcifer sozinho por aí.

bury a friend foi dirigido por Michael Chaves, diretor de A Maldição da Chorona (2019) e do ainda inédito Invocação do Mal 3 (2020)all the good girls go to hell tem direção de Rich Lee, que também dirigiu outros  clipes como Hush Hush; Hush Hush do The Pussycat Dolls e o recente Doin’ Time, da Lana Del Rey, que até virou meme com uma Lana gigante caminhando pela cidade.

 

A segunda aventura da cantora na direção de um videoclipe foi em xanny. Mais uma vez com aquela pitada de agonia, o clipe começa com a moça sendo feita de cinzeiro humano. Enquanto ela canta, mais uma vez em um universo clean, mãos surgem de fora do quadro e apagam cigarros acesos em seu rosto.

Esse plano lembra bastante as mãos que surgem em bury a friend a pegando pelos corredores de uma casa escura e injetando líquidos estranhos que a transformam em um mutante. Seria esse o mesmo líquido que ela bebe e se tornam lágrimas em when the party’s over?

Billie Eilish

Frame do clipe de xanny.

O que esperar de Billie Eilish

Sempre que dava uma passada pelo Youtube, aparecia como sugestão de música um clipe de uma garota de cabelo azul. Nunca dei muita bola e segui a vida (as vezes eu até achava que era a funkeira Tati Zaqui). Até que um dia, ouvi uma galera teen falando sobre a música da moça . Para meu espanto, era a moça de cabelo azul que tinha visto e já tinha ouvido o toque do seu grande Hit Bad Guy tocar por aí e não tinha noção de que eram a mesma pessoa.

No meio de tanta coisa parecida que vem fazendo sucesso ultimamente, Billie Eilish parece ser um respiro de criatividade. Primeiro pela sua música que é bem “econômica”. A sua originalidade vem de utilizar poucos elementos de eletrônica e que tem sido muito presentes atualmente nas músicas que vem fazendo sucesso com o público jovem, principalmente com a forte presença do rap e do trap, mas de forma simples. É tão simples que é até difícil de explicar. Vale a pena assistir a uma apresentação ao vivo da cantora, como essa aqui, no Reading Festival em 2019 para você entender mais claramente o que eu estou dizendo. Repare a quantidade de pessoas presentes no palco. O rapaz que toca baixo é Finneas O’Connell, irmão da cantora, e que a ajuda em seus trabalhos. Isso, aliado à forte construção imagética que falei aqui, faz com que a gente queira não só ouvir, mas também ver o trabalho dela. Esse é apenas o primeiro album da moça, vamos ver o que ela ainda vai aprontar nos seus próximos lançamentos.

Como bônus, vou deixar um vídeo que descobri no meio da pesquisa para fazer esse texto: um padre reagindo aos clipes da cantora. Ele fala umas coisas bem interessantes que a gente não espera ouvir de algum religioso. Tem também uma versão aqui, que ele comenta somente all the good girls go to hell.

 

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