Bianca Zasso
Digite “mulheres no Oscar” no Google e ele vai lhe oferecer, logo nos primeiros resultados, links com fotos de corpo inteiro das concorrentes a estatueta para você não perder nenhum detalhe do look que elas escolheram para a grande noite. Quem quiser mais informações sobre a presença feminina em categorias que não sejam ligadas a atuação, terá um pouco mais de trabalho. São mais de 80 anos de Oscar e 122 de cinema, mas um grande número de pessoas ainda se refere as mulheres destes campos com palavras curtas e relacionadas a imagem: divas, musas, damas. Ainda causa espanto a premiação de mulheres em categorias técnicas, como se fotografar ou editar um filme fosse algo que exigisse masculinidade ao invés de estudo e talento.
Falando em edição, a premiação deste ano terá pela primeira vez uma mulher negra indicada a melhor edição. Joi McMilion recebeu a honraria por seu trabalho em Moonlight, um dos mais belos filmes a integrar a lista de maiores indicados este ano. Uma vitória para o movimento negro e também para as mulheres, já que Joi foi manchete em várias publicações justamente por seu gênero e quase não houve quem apontasse seus trabalhos anteriores para justificar sua presença na lista.
Os números não mentem. Segundo um estudo realizado no ano passado pelo Women’s Media Center (WMC), do qual a atriz Jane Fonda é uma das fundadoras, as mulheres representaram, de 2006 a 2015, apenas 19% das indicações fora das categorias de atuação. Isso se deve muito a falta de contratações femininas pelas produtoras. Nunca uma mulher foi indicada a melhor fotografia, por exemplo. No outro lado da gangorra, oito mulheres já disputaram o prêmio de melhor trilha sonora.
Pode soar utópico, mas esta que vos escreve sonha com o dia em que não haverá mais olhares de espanto quando uma mulher for indicada para algum prêmio técnico ou mesmo que esteja presente em todas as categorias de algo de tamanha visibilidade como o Oscar. Aprendi cedo que, antes de homens ou mulheres, somos humanos e igualmente capazes de ir em busca dos nossos sonhos. Aliás, sonhos não têm gênero. Mas fora a minha humilde opinião (apesar de saber que compartilho com várias pessoas este pensamento), há quem fique muito impressionado quando uma mulher conquista algo fora dos limites do lar ou de tarefas delicadas. No Oscar, não seria diferente.
A indicação de Joi McMilion é surpreendente por vir de uma Academia que tem tradição de privilegiar homens brancos com mais de 30 anos. É o perfil de muitos que seguram a estatueta nas fotos oficiais. Mas e Thelma Shoonmaker? A eterna parceira de trabalho de Martin Scorsese já têm três homenzinhos dourados na estante, todos por melhor edição. É referência e, pode-se dizer até, a responsável pelo sucesso de muitos trabalhos de Scorsese, reconhecido por focar as tramas que dirige para o ‘universo masculino’. Thelma, como muitas mulheres, absorve a ideia e a transforma em arte. Muito da poesia visual do último trabalho do diretor, Silêncio, deve-se à sua habilidade na mesa de edição. Os filmes e os personagens são homens, mas são mãos femininas que os guiam.
E melhor diretor? Um dos troféus mais cobiçados da premiação é também um dos que mais “esquece” a presença feminina. Oito décadas e apenas quatro moças foram indicadas. A primeira, Lina Wertmüller, em 1975, Jane Campion, em 1993, Sofia Coppola, em 2003, e Kathryn Bigelow, em 2010. Esta última, como se sabe, entrou para a história por ter sido a primeira mulher a levar a estatueta para casa. O “problema” é que Bigelow é ex-mulher do diretor James Cameron, que concorreu com ela ao prêmio naquele ano. A notícia no dia seguinte tinha mais a ver com a disputa entre o casal do que com a primeira vitória feminina da categoria. Casais devem vender mais jornal que mulheres que fazem cinema. Questões financeiras à parte, foi o primeiro passo “Girl Power” no Oscar. Na sequência veio o incrível discurso de Patricia Arquette, em 2015, pedindo igualdade de salários na indústria cinematográfica e, mais recentemente, Meryl Streep, uma das recordistas em indicações e premiações, aproveitou o palco do Globo de Ouro, onde recebeu o troféu Cecil B. DeMille pelo conjunto da obra, para criticar o senhor loiro que assumiu a presidência dos Estados Unidos e exaltar a comunidade de imigrantes do país. Apenas uma prévia do que pode acontecer no palco do Kodak Theather no próximo dia 26 de fevereiro.
Mulheres sempre souberam que podiam chegar onde quisessem e ser o que bem entendessem. Agora é hora de gritar para o mundo essa verdade. Tio Oscar que nos aguarde.
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