Por Daniel Couto
Pode-se dizer que a história da montagem se confunde com a própria história do cinema. Se no início da sétima arte a possibilidade de se contar uma história era limitada pela película de 50 segundos do cinematógrafo dos Irmãos Lumiére, com o passar do tempo realizadores foram percebendo no corte e na junção da película uma forma de criar filmes com duração e complexidade maiores.
Talvez um dos primeiros realizadores a perceber a importância da técnica foi o ilusionista Georges Méliès. Foi por meio da arte de cortar películas que Méliès descobriu a possibilidade de se fazer a transição de uma cena para outra, jump-cuts e também diversos efeitos visuais utilizando a manipulação química das películas cinematográficas.
Edwin Porter, por sua vez, deu os primeiros passos numa montagem mais rudimentar, que experimentava com o corte dentro do próprio plano e até mesmo a montagem de narrativas paralelas.
David W. Grifith aprimorou com maestria essas técnicas. Tanto que os russos estudaram a fundo sua obra e os efeitos psicológicos da montagem e o resto, como você já sabe, é história.
A montagem artesanal
É importante lembrar que nos primeiros anos do cinema, a montagem dos filmes era feita de forma artesanal. Cortava-se fisicamente os pedaços da cópia positiva do filme (revelado após sair da câmera) e montava-se as sequências colando os trechos com fita adesiva. Era necessário muita atenção por parte dos(as) montadores(as), visto que um corte errado ou mal colado gerava a necessidade de se revelar o filme novamente, custando mais dinheiro, tempo e mais trabalho.
Quanto ao aparato técnico da montagem, evoluções dos instrumentos de manipulação de películas geraram saltos e transformações no modo de se fazer cinema e também de se contar histórias. Esses avanços, além de tornarem a montagem mais produtiva, deram maior liberdade a realizadores(as) para pensar em novas linguagens e estéticas do processo.
Aparelhos de montagem: o splicer
Um dos primeiros aparatos que surgiram para auxiliar o ofício dos(as) montadores(as) foram os splicers. O aparelho consistia em uma espécie de plataforma de colagem e corte que auxiliava o processo de montagem ao possibilitar maiores precisão e agilidade, além de deixar os cortes mais “limpos”. Isso porque o aparelho fazia uma colagem mais precisa, diminuindo a possibilidade de que as imperfeições das emendas fossem projetadas na exibição dos filmes.
(Demonstração do corte de películas de 16mm com splicer)
Aparelhos de montagem: as moviolas (ou mesas de edição)
A próxima invenção foi a mesa de montagem, também conhecida como moviola. Além de contarem com a agilidade de corte e colagem dos splicers, as moviolas possibilitaram aos(às) montadores(as) a visualização do material bruto em monitores.
Isso permitia uma visualização mais detalhada do que a tradicional análise a olho nu, feita diretamente na película cinematográfica. Além da visualização, outras facilidades passaram a compor o arsenal das moviolas, como a aceleração e desaceleração das películas. Tal recurso permitia ao(à) montador(a) navegar até a cena desejada sem que para isso fosse necessário separar e organizar trechos e mais trechos de película.
Os processos eletrônicos também permitiram às moviolas a incorporação de outros recursos como a sincronização das pistas sonoras das películas, a visualização dos timecodes de cada rolo, etc.
Uma das mesas mais utilizadas foi a Steenbeck, que tinha capacidade de executar todos os processos em trabalhos rodados em diferentes bitolas (16mm, 35mm).
Paralelamente às películas, as produções audiovisuais captadas de forma eletrônica (VHS, S-VHS, BetaCam, etc) eram manipuladas por video-tapes. De uma forma simples, através de uma mesa controladora, eram ligados dois video-tapes (uma espécie de videocassete, desses que seus pais tinham em casa até tempos atrás).
No primeiro videotape o(a) editor(a) assistia ao material bruto e escolhia o trecho desejado. Após escolhido, este trecho era reproduzido e o segundo videotape gravava o trecho selecionado. Este tipo de edição predominou as emissoras de TV até boa parte dos anos 1990.
Evolução da montagem: os softwares de edição não-linear
Se os processos eletrônicos ajudaram a agilizar o trabalho dos(das) montadores(as) e editores(as), uma questão até então não havia sido contornada: a necessidade de se montar os takes de um filme na ordem exata que eles seriam exibidos.
Foi com o advento dos processos digitais, onde filmes e materiais audiovisuais passaram a ser captados em suporte digital – ou até mesmo gravados em películas, mas digitalizados posteriormente – que o processo de montagem se tornou mais “livre”. Uma vez que esses materiais poderiam ser manipulados dentro de um computador, era possível cortar, reorganizar, testar possibilidades independente da sequência.
Um dos primeiros sistemas de edição não-linear (Non-Linear Editing System) foi o Avid 1. Lançado no final da década de 1980, o software permitiu uma nova abordagem ao tratamento dado às imagens a nível de organização, possibilidade e efeitos. No entanto, esses arquivos digitais ainda careciam de uma grande capacidade de armazenamento e processamento dos computadores, além de esbarrarem em uma certa perda na qualidade do material gravado, devido a compressão dos arquivos de vídeos.
Fato é que o AVID 1 inaugurou toda uma era dos sistemas de edição não-linear. Com o tempo, o processamento das imagens digitais foi se tornando mais sofisticado e hoje o que não falta no mercado são softwares disponíveis para se realizar a montagem ou edição de uma peça audiovisual.
Softwares como o Final Cut, Edius, e o Adobe Premiere, dividem diferentes fatias do mercado, cada qual com sua particularidade, potencialidade ou limitação. A escolha por um ou outro pode variar dependendo do tipo de projeto ou localização do mercado em que o(a) profissional esteja atuando.
Porém, apesar de se diferenciarem em alguns aspectos, a lógica de funcionamento desses softwares é parecida. Basta observar as interfaces de cada um. No final das contas, o que vai determinar a qualidade da montagem de uma obra não será o software em que ela foi feita, mas sim o olhar do(a) profissional que a executou.
A evolução dos processos de montagem é abordada no curso Introdução à Montagem ministrado pelo professor Daniel Couto. Mais informações no link abaixo.
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