Morte. A questão que move religiões e questões filosóficas sobre o que há depois dela. Obviamente, a Arte já retratou das mais diversas formas, fazendo com que mais nenhuma representação do pós-vida soe totalmente original. Por isso foi com um sentimento de grande familiaridade que fui percebendo esse holandês Afterlife.

Sam é uma garota de 14 anos que perde sua mãe em um acidente. Mais de um ano se passa e a garota continua sentida com a morte de sua progenitora, até o momento em que ela morre também. Encontrando sua mãe num mundo onde todos os mortos parecem viver numa cidade comum, ela burla as regras. Cooptando com um anjo, ela consegue voltar a mesma vida de antes. Porém, quando uma pessoa volta à vida, ela ainda lembra da existência pregressa e vai esquecendo conforme cresce. Assim, Sam tenta manter o lembrete de salvar a mãe do acidente antes que esqueça.

Se parece que entreguei muito da história, não se preocupe: tudo isso acontece em pouco mais de 30 minutos, o que já denota problemas no roteiro de Willem Bosch (que também dirige) de não conseguir desenvolver muito bem seu universo. Se alguns elementos são absurdos apenas pelo humor, como a máquina de lavar que é o transporte para retornar à vida (um tipo de piada que veria na excelente série The Good Place), a lógica do mundo pós-vida é muito mal explorada.

Aliás, poucas vezes vi tal universo representado de forma tão burocrática e sem vida (perdão pelo trocadilho). Até mesmo a comédia É o Fim(2013) que reecena da forma mais óbvia possível esse mundo é mais imaginativa do que aqui. Comparando novamente com a série The Good Place, não dá para não reparar nas semelhanças na forma como os mortos são recebidos por algum encarregado atrás de uma mesa, que precisa explicar a situação para o recém falecido.

Sem aprofundar em como funciona esse mundo, o que aparenta é que o roteirista inventou qualquer coisa para dar a desculpa de Sam poder voltar à vida e assim contar a história que quer, que é sua tentativa de lembrar e salvar sua mãe.

Sem saber acertar na comédia, já que o visual quase sempre acinzentado e monótono (tanto no mundo dos vivos quanto dos mortos) não consegue salientar o humor das sequências, Afterlife apela para uma trilha sonora insuportável, que parece gritar para o espectador o que ele precisa sentir naquele momento. Como drama, soa bastante piegas muitas vezes, apelando para um final terrível de óbvio. Tão óbvio que o diretor acha necessidade em mostrar duas vezes o mesmo elemento para fazer com o que público compreenda a metáfora que tentou fazer.

O que evita essa obra de ser um desastre completo é a simpatia do seu elenco. Sanaa Giwa inspira doçura com uma certa melancolia que a torna uma adorável protagonista e que conquista a empatia de quem vê. Já Romana Vrede faz da mãe de Sam uma mulher carismática, espontânea e que, mesmo sofrendo de vários problemas, sempre pensa no bem-estar de sua família. Aliás, todo o elenco que compõe a família de Sam transparece uma união e afetividade como poucos.

Às vezes acertando nas suas simbologias (embora evidente, o uso constante do roxo da mãe de Sam é inteligente), Afterlife pode até ter um meado de história intrigante, mas quase vai ao desastre se não fosse pelo forte elenco que o integra, assim tornando-o um filme medíocre.

*Essa crítica faz parte da cobertura da 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

Afterlife

Ano: 2019
Direção: Willem Bosch
Roteiro: Willem Bosch
Elenco principal: Sanaa Giwa, Romana Vrede, Gijs Scholten van Aschat, Jan-Paul Bujis, Ria Eimers
Gênero: ​Drama
Nacionalidade: Holanda

Avaliação Geral: 2,5