Retratar momentos de conflitos históricos pelo olhar de uma criança não é novidade para o cinema. Recentemente, por exemplo, Jojo Rabbit (2019) procurou balancear a inocência de um menino que acredita estar lutando pelos mocinhos com a Juventude Hitlerista e a realidade do Holoscauto ao conhecer a garota judia que sua mãe está escondendo.

Temos outros exemplos que seguem essa mesma linha. 

Alguns mais focados em mostrar a destruição e a perda da inocência como A Infância de Ivan (1962) e Vá e Veja (1985) – coincidentemente ambos os filmes foram feitos sob o regime comunista da antiga União Soviética. Outros, como Império do Sol (1987), se concentram nas experiências vividas pelo jovem protagonista sem deixar de lado os horrores da guerra e tudo que ela tira da humanidade.

E eis que surge Belfast (2021), autobiografia do diretor e roteirista Kenneth Branagh. O filme conta a história de Buddy, muito bem interpretado por Jude Hill, e sua família no final dos anos 60 durante os conflitos políticos e sociais na Irlanda do Norte – conhecidos em inglês como The Troubles.

O passeio pelas lembranças de Branagh, com uma fotografia em preto e branco e uma trilha sonora intrusiva na maioria das vezes, não parece querer fazer parte daqueles conflitos que fatalmente moldaram o cineasta e a sua visão de mundo e sociedade. Enquanto nos outros filmes citados a guerra é sempre presente, sempre colocada lado a lado aos personagens principais – até mesmo em Jojo Rabbit – em Belfast ela se mostra presente num primeiro momento, mas vai perdendo espaço no decorrer do filme.

Buddy vive com seus pais e avós, e aos poucos a fragilidade da situação política e social do país vai contaminando o que parecia ser uma família feliz – pelo menos é o que podemos imaginar uma vez que a ideia da guerra e dos conflitos são deixados como plano de fundo no noticiário ou na movimentação na rua onde Buddy e sua família moram. 

Com um roteiro fraco que se garante em parábolas e lições de vida sendo passadas à Buddy, o elenco tenta manter seu alto padrão com performances inspiradas (Caitriona Balfe foi indicada a todos os grandes prêmios como atriz coadjuvante mas quando as indicações ao Oscar saíram a indicada do filme foi Lady Judi Dench – mas ambas estão belíssimas no filme).

O maior problema de Belfast é a sua falta de vontade de se comprometer. Branagh fala da sua experiência, ele cresceu na Irlanda do Norte como protestante, e não se preocupa em se aprofundar nisso, e nem em mostrar a diferença em relação aos católicos; ele não se preocupa em mostrar os efeitos – bons ou ruins – sobre a sociedade em que vive, eles viram uma simples nota de rodapé e perdem espaço para um conflito familiar que não cativa, que não vai a fundo, nem de um lado e nem do outro.

Para os fãs do diretor, Belfast mostra momentos interessantes de descoberta do mesmo, que o moldaram como artista, mas que não superam a impressão que Branagh contar a sua história não pelo poder da sua narrativa, mas pelo seu ego.

Belfast recebeu 7 indicações ao Oscar de 2022, incluindo Melhor Filme, Diretor, Roteiro Original, Atriz Coadjuvante (Dench), Ator Coadjuvante (Hinds), Canção e Som.

Belfast

 

Ano: 2021
Direção: Kenneth Branagh
Roteiro: Kenneth Branagh
Elenco principal: Jude Hill, Judi Dench, Caitriona Balfe, Ciaran Hinds, Jamie Dornan
Gênero: ​Drama, Biografia
Nacionalidade: Reino Unido

Avaliação Geral: 2,5