Por Sttela Vasco

Um rigoroso e cético crítico de cinema que acaba vivendo exatamente as mesmas situações as quais mais recrimina nos filmes em que crítica. Essa é a história de Victor Tellez, personagem principal do longa El Crítico, do argentino Hernán Guerschuny. Forte concorrente ao Kikito, El Crítico sabe misturar humor, romance e drama na medida certa. Com acidez, ironia e inteligência, conseguiu cativar até os mais duros críticos de Gramado.

O longa retrata a vida bastante monótona de Victor Tellez (Rafael Spregelburd). Um tanto deprimido por conta de um divórcio recente, ele é um crítico de cinema renomado e respeitado, mas que não vê muita graça na vida, além de rejeitar todo e qualquer tipo de filme que envolva o gênero romance. Tudo muda quando ele conhece Sofía (Dolores Fonzi) e passa a vivenciar todas as situações que tanto recriminou e atacou em suas críticas.

A primeira grande façanha dessa obra de Guerschuny é, sem dúvidas, o humor. Por retratar com tanta fidelidade o mundo de tantas pessoas que dedicam a sua vida a resenhar obras cinematográficas – como essa que vos fala – ele acaba por trazer situações extremamente reais para a narrativa, fazendo com que as piadas sejam naturais, quase como se contadas em uma roda de amigos e, o mais interessante: são tiradas que pessoas “do meio” compreendem mais do que ninguém (um exemplo é a “esse sotaque só para justificar uma co-produção”).

Ao parodiar de forma inteligente obras conhecidas pelo público, El Crítico consegue atrair até mesmo aqueles que se sentiriam incomodados por ver seus filmes prediletos sendo tratados com tanto desprezo por esse curioso protagonista. Digo curioso porque, por mais ranzinza que seja, Victor conquista a nossa empatia e nos faz quase sentir certa compaixão por ele.

O velho embate entre crítico e cineasta (figura aqui representada pelo apaixonado, porém, imaturo Arce) também está presente e evolui junto com a trama até se tornar ponto-chave desta. O roteiro, aliás, é muito bem amarrado nesta questão. Não há pontas soltas, a história tem um desfecho belo e congruente e consegue ensinar algumas boas lições ao espectador – inclusive, sobre esse mundo tão desconhecido e julgado dos críticos.

A presença de Dolores Fonzi coroa a obra. Expressiva e extremamente bela, a atriz rouba a cena com seu carisma e com o jeito eufórico e apaixonado de sua personagem. A beleza dela, aliás, me lembrou um pouco a da também grande atriz Marion Cotillard. Vale a pena ficar de olho neste talento argentino.

Não me surpreenderia se El Crítico levasse o Kikito deste ano. Inteligente e divertido, o filme agrada ao público (e posso dizer isto com segurança uma vez que a minha avó, uma senhora de 69 anos, assistiu e o adorou) e à crítica (o vi cercada “deles” e posso dizer: nunca nos vi nos divertindo tanto com um filme que nos retrata tão bem). Na quarta noite de festival, é seguro dizer que a Argentina foi quem brilhou e brilhou de forma contagiante.

Surpreende a obra, aliás, por ser a primeira do diretor. Pouco antes de rodar na mostra, Guerschuny subiu ao palco, agradeceu e afirmou “é meu primeiro filme, estou muito feliz de poder estar aqui”. Merecido, Guerschuny, muito merecido.

*Crítica publicada originalmente como parte da cobertura do 42° Festival de Cinema de Gramado.

 

Cinemascope - O Crítico posterEl Crítico

Ano: 2014

Direção: Hernán Guerschuny

Roteiro: Hernán Guerschuny

Elenco Principal: Rafael Spregelburd; Dolores Fonzi; Blanca Lewin.

Gênero: Comédia. Romance, Drama

Nacionalidade: Argentina

 

 

 

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