Política tem feito parte do nosso cotidiano como a muito tempo não se via. Esquerda, direita, fascismo e ativismo são algumas palavras que vêm se destacando cada vez mais não só no noticiário, mas, pasmem, em conversas sobre reality shows. Conversas que sequer seriam destaque até pouco tempo atrás, agora tomam lugar de destaque nos programas de TV e nas redes sociais. Talvez o primeiro sinal disso no Brasil, foram as manifestações em junho de 2013 que trouxeram a política para a pauta do dia como a muito tempo não se via.
E isso não é um cenário apenas nacional. Recentemente, em pleno 2020 pandêmico, ouvimos os Estados Unidos gritarem que vidas negras importam (Black Lives Metters) após um negro ser morto sufocado por um policial branco no meio da rua. Todo esse contexto, faz com que filmes políticos, que sempre estiveram por aí, ganhem um destaque maior por tocar em temas parecidos, como é o caso de Judas e o Messias Negro (2021). O filme conta sobre o assassinato do então líder dos Panteras Negras, Fred Hampton (Daniel Kaluuya) em 1969.
Para além do assassinato, a produção fala sobre os movimentos que agitaram os Estados Unidos e o mundo na década de 1960, a luta por direitos civis focando especificamente no movimento dos negros se impondo contra o sistema vigente. A principal ameaça que Fred, o líder dos Panteras, representava para o governo dos EUA não era apenas ser um negro ou líder de um partido, mas sim o fato de ter um discurso carismático e simpático a ponto de conseguir atingir até grupos tradicionalmente rivais ao dele. É uma luta do governo contra um ideal do que propriamente contra uma pessoa.
Ao passo que vemos a construção dessa figura, de um Messias, vamos conhecendo também a imagem de quem se tornaria pouco tempo depois, o Judas. Bill O’Neal (LaKeith Stanfield), um espertinho que não tinha necessariamente um lado, é pego pela polícia e, como forma de escapar da cadeia, acaba concordando em se tornar um infiltrado no grupo dos Panteras Negras. O que aparentemente seria uma missão tranquila de conseguir parar o líder, vai se tornando cada vez mais difícil para Bill. Isso porque ele começa a entender os ideais do grupo e que ele, inevitavelmente, também faz parte dos que estão sendo oprimidos.
É interessante que vamos conhecendo o movimento, as razões dele existir e o quão podre e racista é o governo ao mesmo tempo que Bill também entende. Isso faz com que nos aproximemos dele, nos importamos com o que pode ocorrer mesmo sabendo o que ele está prestes a fazer. O filme nos deixa tão dividido quanto o próprio personagem. Dilemas como salvar a própria vida ou a causa, são temas que rondam todo o filme e mostram que até mesmo o líder do partido tinha alguns momentos de fraqueza ao refletir sobre os próximos passos do movimento.
O personagem Fred Hampton pode ser visto também no recém lançado Os Sete de Chicago (2021) junto com o grupo dos Panteras Negras durante o julgamento. Sua morte, inclusive, é relatada durante o tribunal.
Assim como os acontecimentos recentes têm nos mostrado, Judas e o Messias Negro, para além de um filme sobre traição, é um filme sobre política. Sobre busca por direitos e como é importante entender o que é a política e como utilizá-la a seu favor. Que, tão importante quanto ter armas, sejam elas literalmente ou figuradamente, é saber quando e como usá-las.
É incrível e até meio triste pensar que muitas das conversas e dos discursos proferidos pelos personagens podem se encaixar na sociedade dos dias de hoje. Como, por exemplo, ver alguém comparar um movimento que busca direitos iguais como os Panteras Negras, com um supremacista como o Ku Klux Klan. E pior, saber que até hoje, existem pessoas que não entendem a diferença entre os dois.
O grito de Power to The People dos anos 1960, por mais triste e ou esperançoso que isso possa parecer, não é muito diferente de Black Lives Matter de 2020. Mostra que a história se repete, mas que ainda temos pulmão e força para gritar e lutar por nossos direitos.