Notre Dame, dirigido, escrito e interpretado por Valérie Donzelli é uma comédia francesa com toques de fantasia e aventura, que já recebeu indicações ao Prix du Public UBS e Variety Piazza Grande Award.

O filme relata a vida de Maud Crayon, uma arquiteta francesa que mora no centro de Paris com os seus dois filhos. Ela vive uma vida conturbada, atravessada pelas visitas íntimas e encontros esporádicos com seu ex-marido: é um retrato de um relacionamento falido, mas que nunca efetivamente acabou.

A trama começa a se desenrolar no escritório de arquitetura, no qual Crayon é uma colaboradora. Os seus companheiros do escritório estão animados, pois a prefeitura de Paris lançou um concurso destinado aos arquitetos franceses com o objetivo de reformar a esplanada da catedral de Notre Dame.

Aqui, o filme retrata uma comunidade de artistas e arquitetos que trabalham para se sustentar, mas ambicionam realizar projetos em que a sua criatividade possa ser explorada.

A partir de um corte bruto e inusitado com a verossimilhança e representação do real, o filme avança para um lado fantasioso, adquirindo contornos mágicos, repleto de metáforas e críticas à situação da arte, do artista, da cidade, da opinião pública, do conservadorismo etc.

De outro modo, o filme também toca em questões pertinentes às múltiplas jornadas da mulher, uma vez que acompanhamos a protagonista se desdobrar completamente para manter o trabalho, a casa, os filhos e uma vida sexual ativa. Tudo isso intensifica-se ainda mais quando Crayon descobre que ganhou o concurso da prefeitura e que está grávida de seu ex-marido. Para completar a trama de conflitos e peripécias, a protagonista reencontra um antigo amor da faculdade que ainda continua apaixonado por ela.

Numa relação híbrida com outras linguagens da arte, Valérie Donzelli apresenta cenas em que o cinema flerta com o teatro e a música. Essas relações dão complexidade à história e produzem novas camadas de sentido na relação com o tempo da narrativa, a consciência da protagonista e o próprio universo diegético.

Envolto em questões afetivas e de relacionamentos interpessoais, Notre Dame constrói uma comédia interessante e instigante, com grandes reviravoltas e cenas inesperadas que remontam uma espécie de alegoria. Ao mesmo tempo, o filme abraça e realiza críticas divertidas ao conservadorismo e ao machismo presente em nossas sociedades. É uma trama com cenas e diálogos engraçados e inteligentes que promovem uma reflexão leve, mas comprometida, nunca renunciando ao humor.