Por Joyce Pais
Entre os dias 16 e 28 de abril, a obra do cineasta americano David Lynch foi exibida em 33 sessões na CAIXA Cultural São Paulo. Sugestivamente intitulada de David Lynch – O lado sombrio da alma, a mostra idealizada pelo curador e jornalista Mário Abbade e patrocinada pela Caixa Econômica Federal foi inteiramente gratuita.
Filmes como O homem elefante, Duna, Veludo azul, Coração selvagem, Cidade dos sonhos,Império dos sonhos e o seriado Twin Peaks, entre curtas metragens, longas, filme para TV, vídeos raros com entrevista, videoclipes e comerciais feitos pelo cineasta foram exibidos. A compilação abrangente foi uma ótima oportunidade para quem ainda não conhecia o artista multifacetado e as diversas vertentes pelas quais ele transita.
Na quinta-feira (18/04) estivemos no debate com o curador e os convidados, o cineasta Marco Dutra e o jornalista Paulo Santos Lima, onde foram discutidos alguns tópicos bastante relevantes para quem deseja adentrar nas entranhas do polêmico diretor.
Dono de um cinema visualmente potente, David Lynch circula num universo único, mas apesar de suas características particulares, segundo Paulo Santos, “o diretor faz pontes com gêneros estabelecidos e populares como o policial, suspense, roadmovie, por exemplo, por isso o público tende a se identificar com o seu trabalho”, para o jornalista, “Lynch é mais artista do que cineasta” e em sua obra extremamente autoral “o conteúdo dita a forma”.
Em dado momento do debate o curador Mário Abbade sintetiza: “de modo geral os personagens nos filmes do Lynch sempre estão em busca do paraíso, mas para isso eles tem que passar pelo inferno, alguns conseguem, outros não”. O cineasta Marco Dutra ainda comenta os temas recorrentes no mundo lynchiano que muito tem a ver com as suas vivências na infância e juventude; sua obsessão por Hollywood é uma delas. Para lidar com questões concretas, o diretor se vale da técnica de colagem e da construção de uma iconografia própria para retratar aquilo que para ele pode ser a resultante do “sonho americano deformado”. Foi destacada também a presença de uma relação ambígua que Lynch mantém com o espetáculo, ora homenageando-o, ora desconstruindo-o (vide palco de apresentações em Eraserhead, o Club Silencio em Cidade dos Sonhos e etc.).
Um dos destaques de sua filmografia sem dúvidas é o seriado dos anos 90, Twin Peaks. Na época, a série revolucionou o fazer televisivo e serviu de parâmetro para muitas das produções que vemos atualmente, não é raro perceber a influência de Twin Peaks, seja na construção do roteiro ou nas referências imagéticas/visuais, o fato é que a série é um clássico cult atemporal. Paulo Santos afirma que Lynch “sacrifica o cinema dele” quando trabalha com televisão, mas o faz de maneira ímpar, visando um produto final que diz mais respeito ao estado de espírito dos personagens do que em suas falas propriamente ditas e, para isso, ele mescla a linguagem da TV (olhos arregalados, gritos, trejeitos, grandes angulares, cenografia, decupagem) com sua habilidades artísticas diversas, resultando em uma obra bastante peculiar.
Vale destacar seu último filme até então, Império dos Sonhos (2007). Considerado pelos fãs (e pela crítica especializada) como o mais perturbador e indecifrável de sua carreira, no longa, Lynch se rende ao digital (a discussão película vs. digital pode ser vista com maior profundidade no filme Lado a Lado) e, de certa forma, ironiza com essa nova realidade do cinema.
Outro ponto interessante da Mostra é o vídeo Lynch Conversation, no qual é contada uma história de bastidores relacionada a um dos filmes mais famosos do cinema, a saga Star Wars. O fato é que George Lucas chegou a sondar David Lynch para dirigir O Retorno de Jedi, mas este, quando descobriu que todos os detalhes da direção estava meticulosamente esquematizados e que, portanto, ele não estaria livre para inovar e criar recusou o convite.
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