Por Ana Carolina Diederichsen

Um professor de arte de meia idade apaixona-se por uma jovem e talentosa arquiteta. Estamos no dia em que ela vai se mudar para sua casa. Ele está animado e ansioso e compartilha toda essa expectativa com seu assistente. Nesse mesmo dia, uma jovem pesquisadora procura o professor para tirar dúvidas sobre uma antiga restauração que ele havia feito. Mas ele esta está muito ansioso com a mudança de sua namorada e decide não atender a pesquisadora. Em paralelo à trama do professor, temos seu assistente, cuja namorada, ao descobrir uma gravidez indesejada, opta por um aborto sem o seu consentimento. A partir desse ponto na história, entramos num ciclo de acontecimentos que confunde propositalmente o espectador.

A maneira como o roteiro foi estruturado faz com que a história se desenvolva envolta por um certo mistério, tornando-a instigante. O filme, com uma história forte e interessante, opta por uma narrativa consistente através da elaboração de um roteiro que foge da visão comum. À medida que a historia vai se revelando, ocorre uma inversão do ponto de vista. Até certo momento, o papel de quem assiste ao filme ainda não está definido: o espectador faz parte desse turbilhão de acontecimentos, ou é somente um observador externo?

Em um ponto de virada do roteiro, que acontece suavemente, esse papel é estabelecido. O espectador assume de vez seu papel e ganha distanciamento da história, podendo assim observá-la como quem está fora da ação.

O filme mostra como nossos sentidos, nos quais baseamos nossa relação com o mundo exterior e sobre os quais projetamos nosso entendimento, podem nos enganar. Ele evidencia como a mente humana enxerga aquilo que está predisposta a ver. E nos lembra, que nem sempre o que você vê é exatamente da maneira como aparece disposta à sua frente. Se a opção do roteiro fosse diferente, talvez essa curiosa percepção ficasse apagada.

Apesar do bom roteiro, o filme se perde. A falta de precisão na direção evidencia as atuações inseguras. Uma das maneiras mais eficazes de distinguir uma boa atuação de uma mediana é observar os momentos corriqueiros. Uma cena dramática e forte, muitas vezes pode ser mais fácil de se expressar do que uma simples conversa à mesa do café da manhã. Manter a naturalidade na tela, sem sair do personagem é um desafio. Os atores de Os Desconhecidos não conseguem sobrepor esse obstáculo. Quando estão em cena, mas não participam diretamente da ação, estão perdidos e não sabem o que fazer ou para onde olhar.

A fotografia também não convence, ainda que impulsionada pelas belas locações nos jardins da faculdade e do hospital. Os enquadramentos são pobres e alguns movimentos de câmera, que poderiam enriquecer o filme, ao revelar detalhes significativos, acabam passando despercebidos por serem mal executados. A impressão que se tem é que ele foi gravado com equipamentos de vídeo e não película. A gravação digital não é o problema. A última trilogia de Star Wars foi rodada inteira com câmeras digitais, que com o desenvolvimento da tecnologia, chegam a superar a película em definição de contornos e nitidez de cores. O problema, nesse caso, é que para que o resultado estético seja positivo, o cuidado com a iluminação e ajustes de vídeo deve ser redobrado. Cuidado que visivelmente não foi tomado. A textura, pobre, se aproxima muito da televisão (e aqui não me refiro aos bons exemplos de telenovelas ou séries brasileiras).

Ao conhecer os detalhes de produção, esses erros são amenizados. O diretor, Franco Brogi Taviani, tem mais experiência na direção de documentários do que de filmes de ficção e entretenimento, portanto, a direção de atores não é algo tão natural para ele. Além disso, ele tem grande experiência televisiva, fator que influencia na linguagem e técnica de seus trabalhos. Mas o detalhe mais significativo é que o filme inteiro foi feito por estudantes, inclusive os atores. Portanto, a equipe é repleta de pessoas inexperientes, testando novos formatos pare eles. Além disso, a produção teve custo zero, o que limita muito a equipe e é uma raridade para os padrões do cinema.

Ao levar esses detalhes e limitações em consideração, as falhas perdem parte de sua força e o resultado final se torna bastante positivo. Um fator de destaque é o roteiro, que muito bem estruturado, apresenta uma boa historia de maneira a torná-la ainda mais interessante. Mas ainda assim, tendo como parâmetro os filmes profissionais, Os Desconhecidos requer  um pouco de paciência do espectador.

Veja o trailer: