Por Sttela Vasco

Quantas vezes você se deparou com o pôster de um filme e pensou “já vi isso em algum lugar”? Às vezes a semelhança é tanta que chegamos a confundir um com o outro e fica a impressão de que alguém copiou alguém na história. Porém, nem sempre se trata somente da falta de criatividade ou da dificuldade de criar algo inteiramente novo em um universo mais do que explorado. Encontrar o cartaz de um filme repetindo o padrão de outro no seu próprio se deve principalmente ao fato de que longas com propostas e gêneros semelhantes tendem a usar as mesmas cores e disposições de imagens para criar o pôster. Por exemplo, caso a intenção seja  transmitir mistério, um bom método é colocar um fundo escuro com a silhueta de alguém de costas. Ficções científicas, por sua vez, adoram colocar apenas um olho enorme dominando o espaço, isso instiga o espectador e faz com que ele queira descobrir o que há de tão interessante nessa criatura para que ela seja colocada em destaque.

Há alguns anos atrás (2011, mais precisamente), o designer francês Christophe Courtois* decidiu reunir tais padrões e organizá-los. Courtois percebeu, por exemplo, que filmes sobre natureza tendem a usar mais o azul e que longas sobre paixões ou com foco em mulheres são adeptos ao vermelho. Casais em camas, pernas abertas e o contraste entre azul e laranja (que representam quente e frio ao mesmo tempo) também são bastante utilizados na hora de criar a arte da obra. Isso tudo para mostrar que o cartaz de um filme não é escolhido aleatoriamente (avá!). Estudo de cores, tons, efeitos e imagens são feitos para que a mensagem do longa seja transmitida logo no primeiro contato que o espectador tem com o mesmo, ou seja, é preciso capturar a atenção já no pôster.

Pensando nisso, e me inspirando no estudo de Courtois (e também em uma matéria que há tempos li em um especial sobre os bastidores do cinema), resolvi reunir alguns dos cartazes que acredito terem similaridades. Em um universo tão vasto como o do cinema, a minha seleção é bastante ínfima, porém, vale para exercer essa percepção semiótica em cima dos pôsteres. Caso você lembre de algum que eu esqueci ou não percebi, conte nos comentários!

O Retrato de Dorian Gray e Perfume – A História de um Assassino 

filmes com cartazes parecidos

Foi procurando filmes no Netflix que eu percebi a semelhança entre os cartazes de O Retrato de Dorian Gray (Dorian Gray), de Oliver Parker, e de Perfume – A História de um Assassino (Perfume: The Story of a Murderer), de Tom Tykwer. O efeito da imagem se decompondo e sumindo ao se transformar em outra coisa (chamas em um, flores em outro) é a primeira coisa em comum entre ambos. O ar sombrio e a presença de cores escuras sendo quebradas por tons fortes em lugares específicos também fazem com que um logo se remeta ao outro.

O Dia Depois de Amanhã e Cloverfield – Monstro

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O cenário é apocalíptico. O que melhor, então, para representá-lo do que usar uma das estátuas mais famosas do mundo toda destruída como chamariz? Essa foi a ideia usada em O Dia Depois de amanhã (The Day After Tomorrow), de Roland Emmerich, e de Cloverfield – Monstro (Cloverfield), de Matt Reeves. A frase de efeito no alto da imagem, a tipografia similar entre os títulos e a presença quase exclusiva de uma cor (azul em um, verde em outro), quebradas somente por uma mancha irregular no céu e a cidade de Nova York bem distante ao fundo fazem com que os cartazes se tornem praticamente idênticos.

Street Theif e Nos Bastidores da Fama

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Rosto em destaque com óculos, quantos filmes você lembra que já usaram essa tática nos pôsteres? O primeiro que me vem à cabeça é Quase Famosos (Almost Famous), de Cameron Crowe, com aquele cartaz em que a Kate Hudson está em destaque usando óculos roxos. Quase usei ele para compará-lo ao Nos Bastidores da Fama (Beyond the Lights), da Gina Prince-Bythewood, mas mudei de ideia ao me deparar com o de Street Thief, do Malik Bader, (que também se parece absurdamente com o da nova série da HBO produzida pelo Scorsese com o Mick Jagger, Vinyl). Além dos óculos, ambos concentraram cores fortes nas lentes e deixaram todo o resto em preto e branco ou sépia. Outro ponto em comum é que tais lentes, além de coloridas, estão refletindo claramente outra imagem. O roxo e o amarelo gritantes colaboram na hora de chamar (mais) a atenção.

Os Meus, Os Seus e Os Nossos e Doze é Demais

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Uma família muito, muito grande. Como fazer 12 (ou mais) pessoas caberem em um cartaz e ainda deixá-lo interessante e levemente cômico? Simples, coloque os pais segurando a porta enquanto os filhos ”vazam” pelas laterais.  Com temas e cartazes parecidos, é quase difícil separar Os Seus, Os Meus e Os Nossos (Yours, Mine and Ours), de Raja Gosnell, de Doze é Demais (Cheaper by the Dozen), de Shawn Levy. Ambos trabalham com o número de membros na família e tentam, ao mesmo tempo que tirar sarro disso, deixar a imagem afetuosa e com uma pegada de ”isso é um caos, mas estamos felizes”. O uso do azul e do vermelho no título dos dois também ajuda a torná-los mais parecidos.

Intocáveis e Os Descendentes

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Pessoas em foco na frente, uma paisagem ao fundo e a presença de uma cor mais forte como destaque. À primeira vista, os cartazes de Intocáveis (Intouchables), de Eric Toledano e Olivier Nakache, e Os Descendentes (The Descendants), de Alexander Payne, nem são tão parecidos assim, mas, ao prestar atenção, você percebe que existem semelhanças entre ambos, principalmente nos detalhes que compõem a arte. O vermelho sempre é uma opção quando o objetivo é chamar a atenção, principalmente se a ideia é usá-lo em contraste com tons mais frios. Intocáveis e Os Descendentes fazem isso de maneira inteligente: para não ficar cansativo, a cor é colocada pontualmente e em detalhes, no caso, nos títulos (e no guarda-sol, no caso de Descendentes). Outro destaque é a luz solar, em ambas as imagens ela vem em raios da parte superior direita da imagem e ilumina a fronte dos objetos em destaque, no caso, as pessoas.

O Mordomo da Casa Branca e Munique

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Imagens contra a luz tendem a transmitir um aspecto etéreo e de contemplação, além de causar certo mistério. Não à toa, muitos filmes usam esse recurso em seus cartazes, como é o caso de O Mordomo da Casa Branca (The Butler), de Lee Daniels, e Munique (Munich), de Steven Spielberg. Apesar da luz (amarela em um, branca em outro) e das cores serem diferentes, a ideia principal permanece a mesma: um homem, no centro de uma sala, contra os raios de sol que irradiam por uma cortina, seus rostos são pouco visíveis e ambos estão de perfil. A tipografia do título também é bastante similar.

Amor e Inocência e Orgulho e Preconceito

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Aqui a similaridade já começa pela história: tanto Amor e Inocência (Becoming Jane), de Julian Jarrold, quanto Orgulho e Preconceito (Pride and Prejudice), de Joe Wright, têm conexão com a escritora inglesa Jane Austen. Enquanto um narra a vida e como a jovem Austen escreveu suas obras, o outro retrata um de seus mais célebres romances. A conexão entre eles não podia ser mais explícita: os casais estão em foco na parte superior da imagem em um fundo verde, o título corta o cartaz na metade e sua parte inferior retrata uma bela paisagem com pessoas (ou uma pessoa, no caso de Orgulho e Preconceito) caminhando por ela. A escolha das cores, principalmente às referentes ao texto, também são parecidas tornando os dois quase uma referência imediata à Jane.

A Rede Social e Perdido em Marte

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Um rosto no centro da imagem com uma frase ou texto de efeito em cima: você certamente já viu isso em algum lugar. Isso porque essa é uma das fórmulas mais usadas em pôsteres para chamar a atenção, pois, o cérebro humano simplesmente não consegue evitar ler algo – vide camisetas com frases ou legendas que, mesmo em outro idioma, você não consegue ignorar. A Rede Social (The Social Network), de David Fincher, e Perdido em Marte (The Martian), de Ridley Scott, souberam bem usar tal recurso. Afinal, difícil ignorar quando Matt Damon ou Jesse Eisenberg (ou qualquer rosto, na verdade) ficam te encarando tão fixamente e ainda com algumas letrinhas por cima. Alguns filmes optam por usar o ator de corpo inteiro ou até o busto, o nosso exemplo focou no rosto. Apesar da variação de cores, a tipografia é bastante similar, o que ajuda a fazer com que relacionemos um ao outro.

 *Além de designer, Courtois é cinéfilo e sempre está fazendo breves estudos e análises sobre o cinema. Você pode conferir mais do material dele no seu blog pessoal.